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quinta-feira, 9 de abril de 2020

Na atualidade do Coronavírus -- a Pneumónica de 1918 na região de Felgueiras... e na História de Portugal (Artigo no Semanário de Felgueiras)


Surgido este ano em Portugal o Coronavírus, que tanto está a alterar a vida das pessoas, apareceu este malfadado vírus passados perto de 102 anos depois dum anterior surto com rasto deixado na vida antepassada, como foi a Pneumónica, popularmente chamada de gripe espanhola, dizimadora de número assinalável da população portuguesa nos ínícios do século XX, entre 1918 e 1919. Algo nefasto, a pontos de ter alterado o panorama e mesmo a história, como pode voltar a suceder com o inesperado assaltante da saúde. O que leva a que este tema venha à ideia, por associação, servindo de mote à crónica que desta vez foi escrita para publicação no espaço da colaboração habitual do autor no jornal Semanário de Felgueiras. 


Desse artigo, publicado na edição do SF de 10 de abril (que por ser feriado de sexta-feira santa, chegou mais cedo ao público, de véspera), junta-se aqui o texto e imagens da respetiva coluna:

Pneumónica de 1918/1919 na História

Não no sentido dos ciclos em que a história parece repetir-se, mas pelo que casos da atualidade podem fazer lembrar acontecimentos de outrora, o atual surto do Coronavírus que se abate pelo mundo, começado na China em 2019 e alastrado a todo o globo por 2020 dentro, traz à ideia alguma associação do COVID-19 com a memória da chamada Pneumónica, então popularmente conhecida por gripe espanhola, que se abateu sobre Portugal em 1918. Uma das grandes epidemias da História, com muitas vidas ceifadas.

Tal autêntica pandemia do século XX «chegou a Portugal em maio de 1918. A primeira zona afetada foi o Alentejo aquando do regresso de trabalhadores sazonais vindos de Espanha. Foi o primeiro surto no país…» Depois em Gaia rebentou um novo surto, rapidamente espalhado pela cidade do Porto e pelo norte do país. Perante a proximidade a estas regiões, a epidemia chegou também aos concelhos do Vale do Sousa e no Outono estava a fazer-se sentir já com casos de infeção no concelho de Felgueiras.

As condições existentes à época eram diferentes de agora. Tendo uma das medidas levadas a cabo nessa época tido repercussões na paisagem regional, visto as casas, que eram maioritariamente erguidas em pedra rústica, terem sido caiadas de branco. Pois, olhando à contaminação, as autoridades civis da região, seguindo exemplos de uns lados para outros, foram aprovando um conjunto de medidas para conter o avanço da pandemia. Entre cujas decisões foi estabelecido mandar proceder à desinfeção e ao branqueamento dos edifícios municipais, devendo obrigar-se os particulares a procederem de igual modo, assim como foi estabelecido que se desinfetasse amiudadas vezes as cadeias, bem como as retretes públicas. Apesar dessas e outras medidas, a epidemia grassou com bastante intensidade, embora sem demasiados casos terminais nos concelhos da região sousã. Tendo tido maior repercussão por exemplo no concelho de Amarante (sobressaído aí o desaparecimento do pintor Amadeu Sousa Cardoso, entre acontecimentos que levaram a famosa enfermeira Ana Guedes a criar na área de Vila Meã um sanatório, como refúgio de assistência em sua casa de família, onde instalou doentes). Pois então tudo isso levou a que o Presidente da República, à época, viesse inteirar-se da situação presencialmente. E, como agora não se sabe as repercussões que acabará por haver, na ocasião houve algumas…

Ora o Presidente, Sidónio Pais, nomeara o então capitão João Sarmento Pimentel para comandante do esquadrão de Cavalaria da Guarda Republicana do Porto, de modo a ter alguém de confiança na tão importante unidade militar do Carmo, perante a instabilidade político-social que o país passava. Tendo surgido pouco depois a gripe pneumónica. Conta o protagonista, que como é sabido era da família da Casa da Torre, de Rande (como ficou narrado no livro de Norberto Lopes “Sarmento Pimentel ou uma geração traída”): 
«Quando alastrou a epidemia, ele (o Presidente) foi a Amarante. Eu estava em Felgueiras, porque ia com frequência à Torre. E o presidente da Câmara Municipal pediu-me que o acompanhasse na recepção que desejavam dispensar ao Presidente da República. O homem andava a visitar os hospitais para tomar conhecimento da extensão do desastre e de algum modo confortar os doentes…Foi lá (em Amarante) que se deram os (maiores) casos da broncopneumonia.» Em virtude desses contactos, o próprio capitão foi vítima da doença, ficando então acamado. Nesse interregno deu-se no Porto o levantamento de Paiva Couceiro que restaurou o anterior regime, instaurando a chamada Monarquia do Norte. Sendo presos os republicanos mais temidos pelo novo sistema, ficou a salvo o comandante do Carmo por estar internado no Hospital Militar. E (resumindo), informado por seu irmão Francisco e mais oficiais do que se passava, logo que pôde o capitão dirigiu-se ao quartel, apoiado pelo mano felgueirense, e de surpresa, a 13 de Fevereiro de 1919, pôs fim a esse reino da Traulitânia. E assim, a pneumónica, além de tudo o mais, também teve influência na vida e na história do país.

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A propósito, como enquadramento, relembre-se algo do que pelo autor foi escrito aquando da homenagem que a Associação 25 de Abril prestou ao “Capitão-General” João Sarmento Pimentel, quanto ao 13 de Fevereiro de 1919:


A 13 de Fevereiro, a Monarquia acabou como começara: por um golpe militar no Porto. O seu chefe foi o Capitão João Sarmento Pimentel. Apesar de doente com gripe, a pneumónica que nesse tempo grassou pelo país (sendo entretanto informado pelo irmão de toda a situação e idealizado entretanto o que havia a fazer, com seu irmão Francisco Sarmento Pimentel a comandar uma das alas das forças armadas apoiantes), aproveitou a saída da cidade de Paiva Couceiro e da maioria das tropas, para invadir o Quartel do Carmo e restaurar a República, à frente da Guarda Real, que voltou a ser a Guarda Republicana. Estava então restabelecida a ordem republicana, derrotada que foi a Monarquia do Norte. No Porto correu entretanto em mãos dos ardinas um desenho com imagem do Capitão João Sarmento Pimentel, estampa que foi vendida publicamente a tostão (moeda da época) entre a população, enquanto a cidade portucalense, por iniciativa de cidadãos e ação das entidades representativas, ofereceu a espada de honra da cidade do Porto ao Capitão Sarmento Pimentel.

Esteve assim Felgueiras em mais um momento histórico da grei, sendo o mais novo dos Pimenteis, Francisco Sarmento Pimentel,  natural do concelho de Felgueiras. Bem como o mais velho em Felgueiras passou praticamente sua mocidade, oriundo da família da Casa da Torre de Rande, tendo até sido aluno do antigo Colégio de Santa Quitéria

= À esquerda o Capitão João Sarmento Pimentel. À direita seu irmão, o felgueirense Francisco Sarmento Pimentel, então Tenente que fora nomeado pelo presidente Sidónio Pais para o aquartelamento do Porto... (e passados anos, já como Piloto-Aviador, foi autor da 1ª Travessia Aérea de Portugal à Índia).

= Estampa com que os cidadãos do Porto homenagearam o seu herói, Sarmento Pimentel, após o derrube da Monarquia do Quarteirão, como também se chamou o regime monárquico reimplantado em 1919, por só ter durado 25 dias. A estampa foi vendida com os jornais, anunciada aos quatro ventos através de pregões dos ardinas ("O Capitão Sarmento Pimentel a tostão, para acabar"!).  Ao lado a bandeira portuguesa que foi de Sarmento Pimentel, usada na ocasião da vitória das forças republicanas no Porto, e que mais tarde esteve “presa” na PIDE durante o seu exílio político durante o Estado Novo (bandeira que faz parte do património da Associação 25 de Abril, guardada em Lisboa na respetiva sede. Onde esteve na Exposição de homenagem ali prestada a Sarmento Pimentel de 18 a 28 de abril de 2017) 


Armando Pinto
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