Espaço de atividade literária pública e memória cronista

sábado, 13 de setembro de 2014

Artigo no SF, em torno de Ícones, como a pérgula afetiva e os fetos da origem do nome Felgueiras…


A vida é um sopro humano, que nos faz viver, através de motivos existenciais interessantes a cada qual, segundo os interesses que despertam a cada um. E como em tudo, na vida, há razões referenciais, enquanto no dia a dia existem referências. Tanto como na nossa ligação mundana, em aspeto telúrico, nos afetos ao meio ambiente que nos rodeia.

Assim, sem necessitar de muitas mais explicações, referimos o tema das referências locais, no âmbito regional, em mais um artigo da colaboração habitual no periódico Semanário de Felgueiras, através de antigos ícones concelhios, capazes de referenciar o ego felgueirense.

Desse artigo, publicado no jornal Semanário de Felgueiras, à página 10 da sua edição de sexta-feira, dia 12 de Setembro, colocamos imagem da respetiva coluna e, de seguida o texto original, aqui, como de costume. Ilustrando mais esta colaboração publicista também com imagens de antiga fisionomia da vila de Felgueiras de outrora, aquando da existência da antiga pérgula do jardim central de Felgueiras, ao correr do texto.

Ícones telúricos

Ocasiões há em que a cultura ganha vida perante determinados motivos marcantes. Tal o que sucede, entre diversos outros, com fundamentos ligados à identificação e identidade duma região.

Lembramo-nos, a propósito, que há décadas atrás, por exemplo, havia algum atrativo social em se mostrar alguns conhecimentos de cultura geral, sendo quase moda, de certa forma, não se dar parte de fraco em questões de saber, ainda que nas nuvens, quanto a casos de instrução local. Recordamo-nos, desse modo, de quando, como em tradicional caça aos gambozinos, entre amigos, havia quem questionasse alguns incautos se já tinham ido ao Porto, sem ver o Porto; ou seja, se sabiam onde estava o Porto, na cidade do Porto… a puxar por quem não atingia saber que havia uma estátua dum guerreiro chamado Porto. 

Ora, essa peça de estatuária fizera parte do frontão cimeiro do antigo edifício da Câmara do Porto. E, mais tarde, com a demolição do velho prédio, andou por outros locais, até repousar durante muitos anos nos terrenos ligados a lendas e narrativas dos tempos de Pedro Cem. Onde de permeio existiu o célebre palácio que veio a ser derrubado, por obra e graça de iluminados como os que, muitos anos depois, também na Invicta capital do Norte, transformaram a Praça da Liberdade numa extensa eira central à Avenida dos Aliados. De permeio, essa imagem ao tempo implantada na ajardinada cascata beirando a casa do roseiral do Palácio, foi depois, volvidos largos anos, ainda posta de costas para a Sé, junto à Casa dos Vinte e Quatro; e, por fim, tem passado dias mais recentes num dos empedrados passeios laterais da Avenida dos Aliados, até melhor sorte. Representando um Presor, como normalmente reza a história numa das possíveis origens de nomes oriundos da estada dos Godos em terras da Galácia, da proveniência germânica à base colonizadora do noroeste peninsular, por terras de Entre Douro e Minho nas eras da Reconquista e proximidades históricas. Tanto quanto, por assim dizer, embora remontando a outras épocas, em Cabeceiras de Basto há o guerreiro Basto, em Murça a Porca de Murça, e se ligam a Citânias como as de Briteiros e de Sanfins estatuetas de guerreiros Lusitanos, etc. e tal.

Felgueiras, pode dizer-se, em termos oficiais, não está identificada por algum ícone do género, pese terem sido descobertas pelo concelho, em tempos remotos, algumas estatuetas que ficaram na Sociedade Martins Sarmento, ao que diziam velhos manuais. E teve, descontando distância física e diferença em dimensão histórica, uma romântica pérgula no jardim fronteiro ao edifício ainda atual da Câmara Municipal, cuja destruição representou enorme perda para o sentimento coletivo do povo desse tempo, a quem conheceu a parte antiga do terreiro da ancestral Corredoura, de Margaride. Ali onde essa pequena mas esbelta galeria de colunas, encimada por ramada de folhagem cobrindo área de meio círculo, dava encanto e calma em aroma e sombra ao tom de glicínias e espessura de outras plantas trepadeiras, a pontos de popularmente ser conhecida por pérola, em simplificação e apreço.

Assim sendo, à falta de uma imagem simbólica, tão emblemática, poderia ao menos, ainda, na cidade de Felgueiras ser recriado em espaço central, por exemplo, um feto escultórico, relacionando essas plantas, os fetos botânicos presentes em sítios originais, como uma das origens semânticas da denominação da Felgarias Rubeas que evoluiu à Felgerias de tempos imemoriais, até à nossa Felgueiras de hoje. Mas, enquanto isso, porque não haver colocação duma estrutura que recrie a antiga pérgula do jardim central de Felgueiras? Àquilo que, até meados dos anos sessentas, dando guarida com sua sombra a enlaces de amores e ardores, foi um ícone Felgariano. A tal pérola, do dote da nossa Felgueiras de sempre.

= Aspeto da antiga pérgula,já em seus finais, quando começava a ser alterado o jardim central (como se vê junto ao edifício da Câmara), em meados dos anos sessentas, do século XX...

Armando Pinto