Espaço de atividade literária pública e memória cronista

quarta-feira, 17 de abril de 2024

Memórias de há 50 anos do 25 de Abril em Felgueiras

 

O dia 25 de Abril em 1974 nasceu de sol aberto no concelho de Felgueiras, assim como pelo interior nortenho do País (tal qual por toda a Nação, conforme a visão das imagens televisivas). Estava uma manhã de sol radioso quando me comecei a aperceber que alguma coisa se passava por Lisboa, lá ao longe então, pelas notícias entretanto chegadas. Mas cá na região de Felgueiras, por quanto me apercebi e lembro, nada de especial se passava, além de ser um dia normal. Daí que só dias depois tenha havido algo diferente, com uma manifestação pública, espontânea e com grande afluência, de apoio ao Movimento das Forças Armadas que havia derrubado o regime da ditadura de Salazar e Caetano. A primeira manifestação pública e livre de que há memória em Felgueiras.

Quando se deu o 25 de abril, a meio dessa semana de tempo primaveril, mesmo, fui apanhado de surpresa quando, ao chegar ao café (aqui da Longra) pela manhã, ouvi falar que em Lisboa havia uma revolução. Eu nesse tempo estava à espera de ir para a tropa. Havia em janeiro anterior ido à inspeção e tendo ficado apurado para o serviço militar, fiquei em espera de incorporação para o exército, ou seja de ser chamado para ir para a tropa, como se dizia. E, por via disso, com o curso dos liceus mas em idade militar, estava sem conseguir emprego, pensando que mais mês, menos mês, lá iria para um quartel e depois para a guerra. Mas, afinal, com o 25 de abril já não fui… e após oficialização de passagem à reserva, arranjei logo emprego.

Ora, voltando atrás, no dia, propriamente, no 25 de abril de 1974, como nos emissores de rádio e televisão só davam músicas de marchas militares, ao início da tarde fui até Felgueiras, à então vila de Felgueiras-sede do concelho, para no Café Albano (Jardim) ouvir quem saberia melhor qualquer coisa, pois ali se costumavam juntar alguns senhores em tertúlias que até metiam assuntos políticos. Alguns dos quais entretanto, como também não sabiam ainda grande coisa, foram até ao monte de Santa Quitéria para lá no alto ouvir em melhor captação qualquer coisa de emissoras estrangeiras. Depois disso tudo, ao chegar a casa mais para o final da tarde, já ouvi alguns comunicados radiofónicos do MFA e pela noite dentro chegou a ocasião de ver na televisão a comissão visível da Junta de Salvação Nacional. No dia seguinte os jornais esgotaram e por isso apenas pude ler no café o diário que lá estava, na sexta-feira; e no sábado seguinte devorei as páginas do jornal nas reportagens sobre o 25 de abril, mais a mais porque já eram referidos os irmãos João e Francisco Sarmento Pimentel, da casa da Torre, como exilados políticos que em breve regresaariam a Portugal. Dias depois ainda dei uma vista de olhos por um dos jornais de Felgueiras, mas sem conseguir ficar com ele. O resto é História.

Nesse sábado seguinte ao 25 de abril, ou seja no dia 27, fui até Felgueiras com a minha namorada, sendo que ao tempo as manhãs dos sábados eram ocasiões de muita gente ir passear à vila, como se dizia, depois da semana de trabalho (pois ela trabalhava, tendo emprego obviamente), aproveitando para fazer compras e conviver. E então, pelas conversas com quem nos deparamos, apercebi-me que pouca gente ainda estava ciente do que tinha verdadeiramente acontecido, fruto de ninguém até então saber nada de política, por assim dizer. Daí que, entretanto e seguidamente, valeu  o resultado de conversas entre algumas tertúlias de gente sociável e estudantes, sobretudo, para depois ter havido uma crescente ideia da manifestação que acabou por ir para a rua, dias depois.

Ora, tendo o dia 25 de Abril de 1974 sido na última quinta-feira do mês, depois na terça-feira seguinte, dia 30, houve então a histórica manifestação em Felgueiras, na véspera do então já proclanamado oficialmente feriado nacional do Dia do Trabalhador, que veio a ser o efusivo 1.º de Maio em Portugal.

Não havendo, assim, grande material relacionado que tenha sido publicado, quanto ao 25 de Abril em Felgueiras, e como só dias depois houve uma manifestação na sede concelhia, percorrendo as ruas principais da então vila de Felgueiras, cuja arruada culminou com a manifestação por fim concentrada em frente ao quartel dos Bombeiros Voluntários, é dessa ocorrência a memória que perdura mais. Como foi mais tarde registado («20 anos depois…») na revista “Felgueiras Cidade” do Pelouro da Cultura da Câmara Municipal de Felgueiras – de cujas páginas se retira a recordação da reportagem de tal acontecimento local. 


Tempos depois, já em Maio, houve em Felgueiras uma outra manifestação, de homenagem, essa de boas-vindas ao regresso de um antifascista que viveu em Felgueiras antes de ter saído para o exílio forçado no Brasil, por motivos políticos do regime deposto com o 25 de abril - como foi com João Sarmento Pimentel. Então regressado à Pátria após o 25 de abril, tendo sido recebido em Felgueiras na Câmara Municipal, ao tempo da presidência do Dr Machado de Matos à frente da ainda Comissão Administrativa nomeada depois da mudança de regime político nacional. Homenageado então que foi o ainda Capitão João Sarmento Pimentel com efusiva manifestação pública. tendo tido receção à chegada, com autêntico banho de multidão, subindo depois ao salão nobre, onde desde a varanda proclamou um vibrante discurso. 

= Instantâneo fotográfico da chegada do então ainda Capitão João Sarmento Pimentel à receção oficial que lhe foi prestada no Município de Felgueiras, na Primavera de 1974, no seu regresso vitorioso à Pátria em liberdade depois de 47 anos de exílio político, após o 25 de abril em 1974. Na foto: Ao subir as escadas nobres de entrada nos Paços do Concelho, recebido e acompanhado pelo então Presidente da Comissão Administrativa Municipal, Dr. Machado de Matos, mais por seu sobrinho Engenheiro António Pimentel, ao tempo proprietário da Casa da Torre, e por um político amigo. (De notar uma visão saudosista desse antigo escadario nobre da entrada interior no edifício dos Paços do Concelho, com o seu característico gradeamento de corrimão em ferro forjado clássico, destruído e desaparecido com obras de transformação operadas nos inícios do século XXI, ao tempo da presidência municipal da Drª Fátima Felgueiras)…  = Foto de arquivo do sr. Mário Pereira. =


Entretanto tinha havido transferência de poderes na Câmara com a nomeação duma Comissão Administrativa Municipal. Que tomou posse ainda mais tarde, como se pode ver pela reportagem referida. 

Memórias de há 50 anos do 25 de Abril em Felgueiras e tempos seguintes, do que resta ainda na lembrança e perdura, além de escassas referências na imprensa concelhia da época.

Armando Pinto

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