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sexta-feira, 15 de abril de 2016

“Coisas” da região nortenha – em artigo no Semanário de Felgueiras


Em mais um artigo do habitual teor regional e nacional que vai saindo da pena do autor destas linhas, também, no decurso da colaboração que se tem mantido nas páginas da imprensa concelhia, tem desta vez lugar no jornal Semanário de Felgueiras o desenvolvimento dum tema dentro de características felgueirenses e mais horizontes. Como se pode ler na edição impressa do SF desta semana. De cujo espaço respigamos imagem da respetiva coluna, para registo neste local de partilha, extensivamente com o original texto correspondente.

Coisas Nossas

Camões, o épico nacional, cantou em verso a língua portuguesa como pátria ditosa. João de Araújo Correia, grande escritor duriense, referiu-se ao sentimento de nação circunscrito à sua “pátria pequena”, quanto a retalhos regionais. Porque não repararmos também em nossa pátria pequenina, a nossa terra, afinal, dentro da região em que mais nos revemos? E assim, então, observarmos à luz da apreciação algo que nos caracteriza e identifica como naturais deste torrão do Douro Litoral, na abrangência de Entre Douro e Minho, como “coisas” nossas?!

A língua pátria é efetivamente um elo de ligação entre as diversas parcelas portuguesas e até países que oficialmente ficaram com o mesmo idioma. Mas dentro da própria linguagem de origem lusíada, derivada do latim entretanto, há diversas variantes na fala, ou pelo menos em formas de expressão. Sabendo-se, como é o caso mais mediático, que o português falado no Brasil tem um sotaque muito acentuado e o de países africanos algo diferente. Bem como no próprio país de origem, em Portugal se conhecem alguns dialetos e dentro da língua normal existem falares regionais, de pronúncias sui generis. Sendo uma característica de cada qual a pronunciação de sua região, sem haver um protótipo melhor ou pior, mas todos com suas propriedades. Inclusive tendo seus expressionismos, como no Brasil (conforme dizem) tem disso. E tem Lisboa seu riu, sem rir, ao mesmo tempo que noutras zonas há um rio. Tanto como, em sentido figurado, Fernando Pessoa quis descrever como há um rio de cada terra, através de seu heterónimo Alberto Caeiro, ao poetar que do rio de sua aldeia se vai para o mundo todo.

Assim sendo, não há que ter qualquer sentimento menor perante as características de uma região, seja qual for. Pelo contrário será de identificação genuína tudo que faz ligação telúrica, relativamente à terra, na corrente de energia que corre nessa junção. Havendo sempre qualquer coisa a explicar ou defender a maneira mais expressiva. Tal a forma nortenha de trocar os vês pelos bês, com afinidade da ligação histórico-ambiental da ampla região do antigo Condado Portucalense até à Galiza, nos vínculos ainda existentes com o falar do “pobo galego”. Desde cá abaixo do Douro até lá arriba do Minho. Tal como outras espécies de corruptelas derivam de aspetos relacionados com permanência de expressões latinas, tal o facto de nesta região sousã, e em mais diversas áreas do norte do país, ser ainda dito, no falar popular, cum em vez de com, por exemplo. O que explica alguns casos. Não sendo assim muito de modo rústico, como se possa pensar, alguns arcaísmos, na fixação de formações antigas.

Ora, sendo que os costumes tradicionais têm alguma relação com características da região de tais usos, e lembrando a quadra pascal recente e sempre viva na sensibilidade regional, pelo menos, vem a propósito lembrar um exemplo relacionado: O Compasso, a Visita Pascal que como representação da comunidade paroquial vai saudar as famílias às próprias casas pela Páscoa, levando a cruz a presidir a esse rito cristão, é precisamente assim denominado, não por andar em ritmo de compasso, embora devendo naturalmente manter a regularidade, mas por se tratar duma andança com destino de visita, da cruz como símbolo (a com-passo de Visita Pascal), sendo isso uma forma abreviada da expressão latina “Crux cum passo Domine” (significando A Cruz em que o Senhor padeceu) – conforme refere o beneditino Frei Geraldo num seu estudo. Aparecendo aí a forma latina "cum passo", remetendo à maneira antiga popular.

Como lembra Carlos Tê num dos poemas que deram canções, falar o dialeto da terra é conhecer o corpo pelos sinais, ou seja, ser íntimamente familiar duma região. E não há como ser duma terra, ter uma região que seja nossa. Sentindo-nos assim felizes, diante de quem não tenha raízes.

ARMANDO PINTO


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