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quinta-feira, 16 de março de 2023

A propósito de próximas Bodas de Diamante dum café histórico de Felgueiras: - Lembranças de Cafés e Lojas mistas entre marcas ambientais felgueirenses no século XX.

 

Perfaz este mês a linda idade de 75 anos de existência um dos "Cafés" mais históricos de Felgueiras. Tema que merecerá proximamente aqui um vislumbre, mais para a ocasião dessa efeméride. Proporcionando tal caso e acaso um bom mote para se fazer um périplo de memória, ao jeito de  rememoração, sobre o que lembra dos estabelecimentos desse setor tão popular.
 
Assim como há sinais que refletem indicações relacionadas com a evolução de determinada época e marcas que delimitam e distinguem alguma relação derivada, houve certos estabelecimentos de convívio público que assinalaram um tempo e modo na sua marca existencial. Como foi com os chamados cafés, que por estes lados do território felgueirense se associam a tempos de transformação social, revezando hábitos que provinham de antigas tascas e lojas de comes e bebes, ao jeito de lojas mistas. 

= Exemplo de ancestrais valências em Felgueiras: - Um aspeto do hospital Agostinho Ribeiro, do lado de trás duma das enfermarias... (Foto do livro “Memorial Histórico de Rande e Alfozes de Felgueiras”, publicado em 1997)

Recuando no tempo, sabe-se pela transmissão oral de antigos hotéis e lojas de vinhos e petiscos. Até que chegou a era dos "Cafés" já pelos idos tempos dos anos 40, do século XX. Numa evolução que foi sendo mais nítida pelo tempo adiante, até aos anos 60 e 70, de transformações mais vincadas.

Para quem nasceu e viveu, pelo menos, por volta dos anos médios do século XX, esses foram tempos de modo destacado na vivência comunitária. Sendo temporadas de marcas musicais, alastramento da rádio, expansão da televisão e consciencialização de situações políticas e morais, quase que num abrir de olhos ao mundo que rodeava o meio ambiente. Como também foi surgindo por Felgueiras, no horizonte da pacata região cuja população se juntava mais na anual Feira de Maio, ia monte acima à festividade do São Pedro e na Peregrinação de Agosto, já que a feira semanal apenas em meio dia das segundas-feiras dava melhor para gente madrugadora ou pessoas sem obrigações de trabalho normal.

Ora esses tempos tiveram realmente um timbre deveras marcante na evolução regional, sendo épocas em que se começou a ouvir falar de características locais antes pouco abonadas, de lado a apologias dos antigos pronunciamentos de sovelas e outros apodos, quais apelidos popularizados por certas zonas do concelho. Desaparecida imagem da pérgula central e restando o cruzeiro da independência, na sede do concelho. Até à existência de algumas modas eventualmente passageiras que deixaram memórias, como foi a realidade do Staminé que fez história, na evolução de anteriores épocas em que o Café Jardim e anexo espaço da Pensão Albano, mais o Belém e ainda o Popular, faziam parte quase emblemática do carisma felgueirense, mais tarde juntando outras salas de convívio popularizado, em tempo de mulheres ainda não irem ao café nem ao futebol e entre homens se falar mais de bola, na era de Sabú, Barnabé, Mamede, Pimenta, Paulino, Zé Carlos, Estebainha, Mário, Rodas, Caiçara e outros que povoaram os encantamentos da criançada nos recreios das escolas. Enquanto na feira se podiam comprar panfletos com letras rimadas a cantar os ases da bola do Felgueiras, mais romances heroicos de soldados que andavam na guerra da África (colonial) e até aviadores com rotas assinaladas no ar que ia além dos nossos horizontes.

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Ora, num tempo como o atual, em que também a recente época do confinamento provocado pela pandemia do Coronavírus/Covid-19 marcou diferenças de hábitos e feições, tendo-se feito sentir a diferença de convivência e comunicação no episódico encerramento dos cafés… e agora que se sente já natural desconfinamento com a retoma que reabriu esses e outros locais públicos… vem a talhe uma rememoração evocativa também sobre esses mesmos estabelecimentos de cafetaria. Alguns dos quais ficaram na memória histórica como elementos de progresso social, quais substitutos das antigas lojas de serviços diversificados.

= Imagem do exterior do café Jardim, já em inícios do século XXI e antes da última remodelação (de fotos que circulam na Internet).

Recuando aos anos de transição dos anos sessenta para setenta, quando mais se fez sentir uma rápida evolução em muitos setores sociais, e naturalmente incidindo no que o autor conheceu e se recorda (o que não invalida outros casos, dos quais quem se lembrar e conheça pode também narrar por sua vez e autoria), havia na então vila de Felgueiras o Café Albano como principal referência (existente já desde uns bons anos antes), quase a par com o Café Belém, em cada caso com clientela especial; e depois apareceu o Café Popular, que como o nome indicava passou a ser frequentado pelo pessoal mais diverso. Assim como depois ainda o café Cari, com o nome do prédio em que se inseria. Ainda os cafés eram sítios de homens apenas, não sendo habitual e muito menos normal ver mulheres casadas e raparigas solteiras a acompanharem maridos e namorados. Algo que mudou depois com o surgimento da Moderna, como era chamado o café da Pastelaria Moderna, na rua de entrada (e mais tarde conhecida por rua velha, após o rasgamento da avenida nova…). E especialmente houve um café mais especial, para a rapaziada nova e juventude estudantil, como depois ficou também a ser frequentado por gente mais alargada, por assim dizer, que foi o Staminé, do Doutor Hermínio.

= Aspeto interior do Staminé. Foto de postal da época (em cujo verso constava a legenda anexa).

Era a então vila de Felgueiras um ponto de passagem nos itinerários do interior do Douro Litoral, mas sem nada de especial a fazer paragem aos viajantes. Num limbo de simplicidade e ainda antiguidade, como se notava em edifícios com marcas temporais, por exemplo.

= Um aspeto de algo característico da vila de Felgueiras de inícios dos anos 70: Quartel antigo da GNR, em frente aos Bombeiros, ao tempo de chefia do sr. Cabo Pinto.

Enquanto isso, na Longra abria também o Café Longra, junto ao Largo da Longra. Obra do sr. “Manuel das Mobílias”, como era localmente conhecido o amigo sr. Manuel Marinho Silva. Sendo de notar que nesse tempo na estrada nacional de ligação de Lousada para Felgueiras, por exemplo, dentro do espaço concelhio de Felgueiras apenas havia algumas tabernas a beirar a estrada, bem como lojas de mercearia com serviço também de tasquinhas, as populares “vendas” de vinhos e petiscos. Havendo na Longra, já na estrada para Caíde mas logo a seguir ao Largo, a Casa do Povo desde 1939 com seu bar (mais sala de espetáculos e cinema, além do Posto Médico), funcionando ali de noite e em horas de espetáculos um centro de convívio ao jeito de café, que até ao final dos anos da década de 60 era único sítio do género nas redondezas. 

= Imagens duma loja de venda diversificada na Longra, que em tempos também serviu de taberna, mas por fim, com o último “vendeiro”, o sr. Fernando Machado, se dedicou à especialidade de mercearia (Fotos do livro “Memorial Histórico de Rande e Alfozes de Felgueiras”, publicado em 1997).

Deparando-se então em inícios de 1970 a mudança com a abertura do café da Longra (inicialmente aberto em finais de 1969, e definitivamente ao início de 1970).

= Imagem de tempo inicial do Café Longra, com aspeto clássico de seu interior à época da fundação, em 1969/1970. (Foto do livro “Memorial Histórico de Rande e Alfozes de Felgueiras”, publicado em 1997).

Pois também em 1970 abriu o Sataminé em Felgueiras. De nome oficial Staminé Relax-Bar, era então uma espécie de salão de chá, com serviço de restaurante “snack-bar”, funcionando também como discoteca. Uma casa que orgulhava Felgueiras, ao tempo uma pacata vila quase desconhecida do Norte, na fronteira do Distrito do Porto com as províncias vizinhas, que com aquela porta aberta passou a ser visitada por pessoas de vilas e cidades das redondezas, à vista da iniciativa do Dr. Hermínio Martins (farmacêutico e também professor do Ciclo Preparatório em Felgueiras, bem como tido por pessoa muito culta, como alguém avançado para a época no ambiente felgueirense, além de desportista concorrente a provas automobilísticas, etc. e tal).

= Imagem com o “Spot” publicitário da casa, constante das bases de copos (colocadas nas mesas para proteção e embelezamento), à época.

Entretanto pelo concelho depressa foram alastrando novos cafés, que entretanto ganharam estatuto e ainda fazem parte da memória de muitas localidades e suas gentes.

 = Panorâmica do Largo da Longra nos últimos tempos da “Loja da Ramadinha” (Foto do livro “Memorial Histórico de Rande e Alfozes de Felgueiras”, publicado em 1997).

Claro que continuava e bem o Café Albano, nome popular do Café Jardim, mais a Pensão Albano com serviço de restaurante e cave com tradicionais petiscos, a marcar sua presença na sede concelhia. Sendo aliás o Café Jardim o mais emblemático da cabeça do concelho, desde que foi criado em 1948 pelo famoso senhor Albano, Albano Costa e Sousa (ao qual o autor destas linhas dedicou um artigo no Semanário de Felgueiras, há alguns anos já). Tudo em ambiente social de permeio reforçado com os restantes cafés. Como depois foi aumentando a chamada concorrência, na expansão que ao longo dos anos foi ampliando os locais de convívio.

= Sequência de imagens com o Café Longra em tempos diferentes (Fotos do livro “Memorial Histórico de Rande e Alfozes de Felgueiras”, publicado em 1997).

Passado já mais de meio século, são muitas as diferenças daqueles tempos de transição social e ambiental. Algo a merecer atenção, nas marcas do tempo.

Armando Pinto
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