Há muito que tenho por lema dar valor ao que tem valor. Em
cujo sentido a vida é para ser vivida sem ser só por ver outros por aqui
andarem. De modo que quando se faz alguma coisa de jeito é sempre melhor, não
para outros verem, mas para nós próprios nos sentirmos bem.
Ora, na linha de não ser por ver os outros, mas por nós
mesmos, todos já devemos ter feito alguma coisa que nos fez sentir bem. Havendo
dias assim, a terça-feira dia 15 de outubro foi um dia que, não pela data em
si, mas pelo modo como o dia correu, para o autor destas linhas, foi algo
especial.
Pois então, nesse dia tive a feliz oportunidade de assistir
à oferta duma cópia fac-similada da Regra de São Bento a Felgueiras. Facto
acontecido no dia em que ocorria a passagem de mais um aniversário da outorga
do Foral Manuelino. Então o município de Felgueiras foi presenteado com um
documento histórico da lavra de um ilustre felgueirense – o volume das
iluminuras da Regra de São Bento, da lavra do célebre artista Lucas Teixeira.
Tendo-se deslocado a Felgueiras, desde o Brasil, a filha desse felgueirense
importante como iluminurista e poeta falecido entretanto, sobre o qual ainda no
ano passado teve lugar na Biblioteca de Felgueiras uma exposição comemorativa
de seu centenário. Oferta aquela concretizada num gesto bonito de D. Maria Margarida Teixeira Moreira
Lima, filha do felgueirense senhor Armando Teixeira, como era o nome de batismo
de Lucas Teixeira, nome este de profissão e artista.
À entrega referida estiveram presentes as Dr.ª Dulce Freitas
e Dr.ª Manuela Melo, que receberam em mãos o documento, respetivamente em nome
da Biblioteca e do Arquivo Municipal, além de haver assistido atentamente o
autor desta anotação, na presença também do marido da senhora engenheira Maria
Margarida.
É o notável documento um conjunto de iluminuras em fac-simile das muitas páginas de pergaminho elaboradas com minucia entre 1944 a 1954 (mais duas posteriores), num trabalho de mestre, cujo original, muito valioso, está na nação brasileira à guarda dum colecionador particular, depois de leiloado, havendo de permeio estado à guarda do Jockey Clube de São Paulo. Ficando agora na Biblioteca e Arquivo Municipal de Felgueiras uma cópia fac-similada de tão importante acervo.
Como intermediário do conhecimento sobre esse que foi o tão
apreciado Frei Lucas Teixeira, esteve presente o autor destas linhas e também colaborador
do jornal Semanário de Felgueiras, normalmente autor de artigos sobre a memória
felgueirense, tendo enviado para publicação no mesmo Semanário de Felgueiras uma
notícia do facto, a dar conhecimento público desse importante ato.
(imagem da coluna do SF )
Isto na parte de privilégio comunitário, de interesse
felgueirense, no caso.
Quanto a uma outra parte, deveras sensibilizante, foi muito
bom e bonito, como se pode dizer da oportunidade da convivência havida com a
filha e o genro do ilustre Felgueirense sr. Armando (Lucas) Teixeira, falecido
(em 2013) mas praticamente bem presente em tudo e em todos nós que depois
percorremos alguns dos sítios e afinidades de sua naturalidade local, como tive
a possibilidade de procurar ser um género de cicerone de D. Maria Margarida e
marido.
Assim, tal como quando se faz algo de jeito nos sentimos
bem, o que foi possível fazer nos fez sentir melhor. De modo que as coisas não
acontecem sem qualquer razão, e o facto de um dia ter começado a interessar-me
pelo personagem Frei Lucas Teixeira, como felgueirense notável, deu razão à
razão…
Isso porque, nas andanças de pesquisas sobre temas
felgueirenses, há já muitos anos descobri (exprimindo na primeira pessoa) que,
entre os bons felgueirenses dignos de merecerem lembrança, havia um felgueirense
de nascimento, Frei Lucas Teixeira, que era exímio artista na arte clássica de
iluminuras. E então, começando a estudar esse personagem, já em inícios do
século XXI escrevi um artigo jornalístico sobre ele, que foi publicado no
Semanário de Felgueiras em fevereiro de 2002, com o que até aí já tinha
descoberto, procurando enaltecer sua aura de artista, para honra do sentimento felgueirense, quer como autor de iluminuras feitas com paciente mão de mestre, quer como poeta, autor de diversos livros com poesias de terna recordação.
Após isso, pensando que ele devia tomar conhecimento do facto,
mas também com ideia de aprofundar mais as informações sobre tal artífice dessa
arte rara, lembrei-me de o contactar, para lhe remeter cópia do artigo. Então, sabendo
que ele estava no Brasil e havendo lido num blogue da internet algo sobre a sua
vivência em terras brasileiras, tentei contactá-lo e consegui, depois de
diversas tentativas. Passando a manter com ele uma correspondência interessante
que redundou em maior admiração ainda e boa amizade. Sucedendo-se mais alguns
artigos, mais completos ou com novos dados e mesmo crónicas também já em
blogues. Juntando diversa documentação até, respeitante ao sr. Armando Teixeira,
o admirado Lucas Teixeira. Com o desejo de quando possível verter todo esse
material em livro, para o qual ao longo dos anos e até agora ainda não houve viabilidade,
à falta de patrocínios. Mas continuou o interesse e admiração. A partir daí
rolou a bola da vida, até que a filha, D. Maria Margarida, me conseguiu também
contactar depois da morte do pai. De permeio lembrei publicamente que seu
centenário se aproximava e depois houve felizmente na Biblioteca Municipal de Felgueiras
uma exposição comemorativa. Tendo agora, por estes dias do outono do norte
português, havido o que se regista aqui: a vinda da filha de Lucas Teixeira,
passados anos, quando foi possível, em viagem desde o outro lado do Atlântico
até ao concelho natal de seu pai. Sendo com emoção (como me contou, tocando-me
profundamente) que entrou na cidade de Felgueiras, pelo acesso desde a
autoestrada, sob indicação do GPS a ouvir para sair da rotunda pela segunda
saída e… seguir pela Rua Frei Lucas Teixeira!
E o resto estará por certo, mais que certo, na memória das
pessoas que estiveram envolvidas nos diversos momentos desse dia muito
agradável e sentido. Com o sentimento que a honra de enobrecer Felgueiras nos
contemplou bem então. Pois cumpriu-se o que estava subjacente.
Como poetou Fernando Pessoa, «tudo vale a pena, se a alma não é pequena»!
Armando Pinto
((( Clicar sobre as imagens )))