Espaço de atividade literária pública e memória cronista

sexta-feira, 7 de setembro de 2018

Artigo no Semanário de Felgueiras sobre "Uma prestável senhora"


Crónica escrita como singela homenagem particular, embora de substância coletiva, em artigo publicado no já habitual espaço de opinião com lugar no jornal concelhio Semanário de Felgueiras, em sua edição de sexta-feira 7 de setembro:

Uma prestável senhora: A “Quininha das injeções”

Houve e há pessoas que admiramos só de ler, ouvir e ver algo relacionado, como grandes individualidades, ou nem tanto, que nos chegam pela transmissão da história, como através de televisão e outros meios da comunicação social, quer de simpatia mais vasta ou de empatias particulares. Enquanto, quantas vezes, pessoas haverá que tenham estado à nossa beira, quase sem se dar por elas, mas de grande valia, com préstimo comunitário.

Efetivamente, na parte do cérebro reservada a memorizar bons aspetos, fica sempre a lembrança de pessoas e coisas marcantes, com maior distância física ou proximidade afetiva e ambiental. Permanecendo em bom lugar das memórias determinadas figuras que foram públicas no meio ambiente da convivência normal. Quais, por exemplo, além de pessoas de laços familiares e roda de conhecidos dos mesmos denominadores comuns, também grandes senhores e senhoras de atividade assinalável, sem esquecer párocos ternamente retidos nos arcanos das recordações, mesmo funcionários e agentes da vida comunitária, mais antigos colegas de brincadeiras desenvoltas e professoras distintas do que ficou no ouvido desde os bancos da escola. Mas também, e sobretudo, pessoas prestáveis, como vem à lembrança uma boa senhora, que desta feita agora apraz referir, como remembrança de valência comunitária.

Obviamente, também no caso, como diz o rifão popular, cada cabeça sua sentença. Havendo naturalmente muitos e bons exemplos, quer no aspeto particular, como de âmbito mais vasto. Devendo pois quem de outra forma pensar igualmente se manifestar, por suas ideias e ações. Enquanto, exprimindo aqui simples lembranças pessoais, se coloca mais um lembrete relacionado à ideia de perpetuação merecida. Porque apologia histórica também contempla pequenas coisas, por vezes grandes em significado. Vindo ao caso um exemplo de gente com história, mesmo entre a multidão normal de pessoas conterrâneas, porém com saliência por suas obras valorosas em prol da sociedade anónima popular.

Eis assim o tema: Uma boa senhora, simples, bondosa, que em tempos idos estava sempre pronta a acorrer a casa de alguém que precisava de uma injeção urgente, fosse a que hora fosse. Como lembra de então, era o autor destas linhas ainda criança e depois até adulto, e a via ir onde houvesse pedidos para dar injeções, quer uma pica em petizes ou medicinal seringadela em gente crescida.

Perante sua caixa metálica de guardar a seringa, aberta de modo tradicional tal apetrecho antigo, cujo aço andava amolgado já pelo uso, os olhos da miudagem e dos graúdos, enquanto aguardavam, arregalavam-se de curiosidade a vê-la na praxe costumeira de desinfetar seringa e agulha através de chama acesa em banho de álcool etílico. E era atrativo até reparar como tinha jeito, no seu mister de habilidosa, a introduzir o remédio pele abaixo quase sem se notar, na ternura da sabedoria de vocação ancestral. Era assim e foi a “Quininha das injeções”, como popularmente ficou conhecida em seu tempo e nos dias que se seguem pela memória alongada às recordações perenes. Uma senhora que vivia no lugar do Monte da Costa, vizinho à Longra, passando seus dias nas cercanias de sua residência por Rande, Sernande, Varziela, Unhão, Lordelo e naturalmente Pedreira, freguesia onde dormia, andando durante o dia, até sol posto em horas a fio, a satisfazer pedidos de pessoas necessitadas de seus cuidados, por gosto de fazer bem. Chamada Joaquina Afonso Pacheco, tal era seu nome de batismo, mas na boca do povo simplesmente “Quininha das injeções”. Que Deus haja e a tenha consigo em melhor lugar, ainda, que bem merece!

ARMANDO PINTO
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