Na senda moral que uma terra vale muito pelo seu património e
dotação humana, sobretudo no aspeto de seus naturais, Felgueiras tem
tido filhos que muito honram essa ligação, embora nem sempre com o devido
reconhecimento institucional e mesmo da memória coletiva. Estamos a lembrar-nos
de um ilustre estudioso do passado local, o sr. Manuel Sampaio. A propósito dum
escrito de um felgueirense que sobre o mesmo personagem teceu algumas linhas
memoriais, na rede social do facebook; e aí pelos comentários surgidos, além de algum silêncio da maioria dos leitores, se nota que esse felgueirense de tempos idos
não é do conhecimento geral conterrâneo na atualidade.
Ora, escreveu o Dr. Mendes Gomes, felgueirense radicado em
Berlim, o seguinte – sob título SR. SAMPAIO
DA MILINHA “HORA”…
Vivia com a mãe, no lugar da Forca.
Teria mais de sessenta anos.
Aquela figura alta. Serena.
Sempre com um guarda-sol
que era também guarda-chuva.
Via-o ir e voltar da Vila.
A pé.
Diziam que fazia o jornal de Felgueiras.
Das poucas vezes que entrei na casa dele,
Vi que havia muitos livros.
A senhora Emilinha deu-me um, à socapa.
Que pena o ter perdido.
Usava sempre uma gabardine clara.
E também uns óculos.
Rosto arredondado e simpático.
Nunca falou comigo.
Eu era um miúdo de tantos que por ali andavam na
brincadeira.
Meus pais gostavam dele
como toda a gente...
== Joaquim Luís Mendes Gomes
A propósito, recordamos uma crónica que em tempos foi
escrita e publicada no jornal Semanário de Felgueiras (em seu nº de 23 de
Dezembro de 2005), dedicada à memória de tal felgueirense digno de apreço, como autor
de alguns estudos monográficos de história local antiga.
(Clicar sobre a iamgem para aumentar)
Manuel Sampaio – Herculano da História Felgueirense
… Ao virar do meio da primeira década do século XXI, não se pode deixar de refletir
mais um lembrete, nestas anotações, a propósito de efeméride que passou oficialmente despercebida – a
comemoração de cinquenta anos (nota do
autor: quando foi escrito este artigo, em 2005) sobre o desaparecimento de um grande
historiador de génese felgueirense, que foi Manuel Sampaio.
Estando-se em maré de evocações, elege-se desta feita como
tema um vulto da historiografia concelhia, que foi Manuel Sampaio. Porque o
nome em apreço merece efectivamente não permanecer em olvido, nem cair no
esquecimento, devendo-se ao personagem referido pelo menos uma alusão
gratificante, algo da mais elementar justiça – à falta de reconhecimento que se
verificou na sua terra e concelho, nas sucessivas efemérides em que houve
oportunidade de o lembrar, a última das quais na passagem de cinquenta anos da sua
morte, em 2005 (conforme escrevemos, à época, no “Semanário de Felgueiras”, recorde-se).
Foi a 19 de Setembro de 1955 que Manuel Sampaio faleceu, em
Varziela, Felgueiras, onde nascera 64 anos antes. Passaram assim todos estes
anos, já decorridos, desde o seu desaparecimento físico, que não da memória que
fez perdurável, atenta a sua obra aos olhos e sentidos capazes de valorizar
quem da lei da morte se soube libertar.
Nascido a 14 de Agosto de 1891, em Varziela-Felgueiras,
Manuel Leite Coelho de Sampaio tornou-se um estudioso do passado histórico de
Felgueiras, ao correr de seu percurso de homem de letras, havendo desempenhado
importante papel no jornalismo Felgueirense. Interessado pelo conhecimento das
raízes locais e preservação da memória colectiva, este antigo publicista,
Manuel Sampaio, faz parte da História que subsidiou. Passou, desde o nascimento
à sua vivência, pelos séculos XIX e XX, recordando os ancestrais, até que
perdura ainda no preito possível deste século XXI. Pode parecer exagero, mas
pela época em que desenvolveu sua lavra historiográfica, Manuel Sampaio foi um
pioneiro na fixação cronológica Felgueirense. Houvera anteriormente quem se
interessasse pela matéria, como o Dr. Ribeiro de Magalhães que, no primeiro
jornal concelhio de que há notícia, “O Felgueirense”, deixou em finais do séc.
XIX já alguns apontamentos, numa linha de afinidade cultural seguida com o Dr.
Eduardo Freitas, da Lixa (autor de “Felgerias Rubeas”, a primeira monografia
escrita de Felgueiras, no entanto só publicada postumamente, muitos anos
depois). Contudo foi Sampaio quem desenvolveu o estudo do passado local com
relativa amplitude, possível ao tempo, chegando a abarcar uma maior variedade,
embora incidindo naturalmente mais no que conhecia melhor. Assim sendo, tal
como Alexandre Herculano se pode considerar Impulsionador da História de
Portugal, porque não vislumbrar figurativamente, por analogia, M. Sampaio qual
Herculano de Felgueiras?!
Manuel Sampaio foi durante muitos anos director d’ O Jornal
de Felgueiras e colaborou noutros órgãos da imprensa regional, além de
publicações temáticas. Por entre essas funções, dedicou-se com entusiasmo a
recolhas documentais sobre História, Heráldica e Etnografia, sob cujos ramos
publicou diversos trabalhos, ao longo de séries de artigos com esses temas.
Ficaram então impressos, sobretudo no Jornal de Felgueiras, também de saudosa
memória, interessantes ensaios jornalísticos de Manuel Sampaio, como «O
Românico no concelho de Felgueiras», «O Senhorio de Felgueiras e Vieira», a
«Heráldica no concelho de Felgueiras», «Homens Ilustres de Felgueiras», «O
Mosteiro de Pombeiro», «O Pelourinho do Concelho de Felgueiras», «Brasão de
Armas», «Notas Históricas e Genealógicas», «Solares de Portugal», etc. Embora
estes estudos hajam saído por fases, primeiro na imprensa local e só depois
tenham alguns desses títulos sido editados em livros, não foram contudo muito
divulgados aquando da compilação e ficaram como manuais deveras desconhecidos
do público interessado, devido à sua reduzida tiragem e inerente distribuição.
Por consequência, resultou disso que tais exemplares são hoje autênticas
raridades. Desenvolveu ainda Manuel Sampaio os tratos de sua afeição, sobre
assuntos de realce da região do Douro e particularmente de Felgueiras, de entre
os diferentes órgãos de informação escrita em que colaborou, também na revista
da Junta da Província do Douro-Litoral, de cuja Comissão de História e
Etnografia foi membro auxiliar.
Apesar de tal folha de serviço comunitário, parece estar
esquecido... Quando escrevemos esta lembrança, aludimos que, já que não houve
de quem de direito qualquer iniciativa ou realização de acto alusivo, na
ocasião propícia ou à posteriori, dentro do ano da passagem de 50 anos do seu
passamento, e deixada passar então tal oportunidade de o evocar publicamente,
algo ainda podia e deve ser feito. Olhando ao seu contributo para a elevação da
Mística Felgariana, se ainda houver gratidão e apreço pelo que é dignificante,
por parte das representações que se deveriam orgulhar da sua naturalidade, Manuel
Leite Coelho de Sampaio bem merece ser homenageado na Toponímia local e
concelhia donde nasceu e viveu.
Armando Pinto
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