Um tal Covid na história
familiar – no sorriso de vida do Vasco
Armando Pinto
= Livro dedicado ao Vasco
Pinto Matos, meu quarto neto – menino que vejo crescer e completa a nossa
família. Escrito numa mistura de crónica e evocação, a pensar nele, o meu neto
Vasco.
Edição do autor, em
tiragem restrita de 15 exemplares numerados manualmente e autenticados com
rubrica autógrafa do próprio autor.
N.º ......
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Em 2020 chegou o Vasco à
nossa vida, ainda naquele mesmo ano em que o mundo foi surpreendido pela
pandemia do vírus Covid, algo que assolou também Portugal de modo inesperado e
fica de memória do século, por assim dizer.
Contudo, tudo o que o
Covid fez à sociedade, restringindo a vida das pessoas e tirando mesmo muitas
vidas, foi bem amenizado pela chegada ao mundo do Vasco. De modo que, afinal, a
minha felicidade está satisfeita nos olhos da paixão, muitos anos antes. Afirmando
à vista da memória ter valido a pena a razão do namoro inicial, em 1973, do
qual resultou o casamento em 1977 da origem de toda a família. Tal se pode
buscar aos confins do pensamento essa manhã leda e bela em que primeiro nos
falamos, nós na formação do casal originário, em busca da madrugada que daria
frutos vindouros. Falando baixinho na retina das lembranças, neste acordar
feliz pleno de beijos de amor paternal e avoengo, abraçando a vida na
descendência que deu vidas sucessoras. Agora numa vida mais completa com o
Vasco.
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Como a estrela de Natal
incidiu seus raios sobre o presépio do nascimento do Menino Jesus, recaem
reluzentes radiações na junção de mais um membro de nosso presépio familiar, a
completar o que sentimos e somos. Pois estamos agora mais completos, todos nós
na família Pinto, com o Vasco. O meu quarto neto, que se junta ao seu mano
Gonçalo e aos primos Tiago e Diogo, todos Pintos como eu, os meus quatro netos,
herdeiros do meu apelido familiar e descendentes de meu sangue, como seus pais,
os meus filhos.
Diz-se e é verdade: Um
neto é um dos maiores tesouros da vida! Frágil como uma porcelana e mais
valioso que um diamante
Ao Vasco, meu quarto
neto, no conjunto de meus membros sucessivos, como no corpo há duas pernas e
dois braços. Na sequência de livros dedicados aos netos, mas não por isso pois
cada um tem sua história particular, este é para o Vasco. Ficando também dentro
destas páginas um beijo eterno e um daqueles abraços que me fazem agarrar à
vida.
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Na transição do verão
para o outono de 2020 chegou o Vasco à nossa vida, entrando na vida da nossa
família. Nascido a 15 de outubro, ao início do dia, logo aos 7 minutos depois
da meia-noite dessa madrugada, no Hospital S. Francisco Xavier, freguesia de
Belém (onde nascera o irmão também). Longe fisicamente daqui dos avós da
Longra, mas bem perto por ficar dentro de nossos corações, desde cá até Lisboa.
Vi-o obviamente logo mas por fotografias, enviadas pelos telemóveis dos pais.
Esperando então, logo que fosse possível, depois poder ir a Carnaxide visitá-lo
a ele e aos pais e irmão, naturalmente. Mas com a situação pandémica da época,
que ficará também para a história, isso teve de ir sendo adiado. E continuou
tal adiamento por mais tempo que o esperado.
Ora, mas mesmo assim,
sabia que já gostava muito dele, todos gostávamos dele. Do meu neto que antes
de o conhecer pessoalmente senti que realmente já gostava muito dele.
Ora o ano 2020 foi tempo
de ambiente público caracterizado pela visão geral das pessoas andarem de máscara
protetora, normalmente de pano ou material cirúrgico, presa às orelhas e a não
deixar ver a cara entre o nariz e a boca, para evitar a propagação. Com todo o
mundo metido em casa, evitando-se contacto com outras pessoas no exterior,
limitando a vivência e convivência. Tendo esse período de pandemia se estendido
por 2021 e em parte a 2022, embora com o aparecimento de vacinas protetoras,
tendo a população sido vacinada em massa sucessiva, o ambiente foi melhorando
enquanto era aliviado tudo das anteriores restrições.
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Ao longo dos tempos tem
havido diversas vagas de pestes, desde remotos séculos, cuja evolução das
antigas mezinhas da medicina tradicional e mais tarde da ciência médica, bem
como os próprios hábitos de vida social, foram combatendo dentro das
possibilidades. Havendo notícias de pestes nos séculos XIV e XV, por exemplo, a
que a religiosidade popular levou à invocação de santos, que depois passaram a
oragos de algumas terras (como no caso de S. Roque e S. Sebastião, tidos como
protetores ante enfermidades infeciosas e pestes, respetivamente). Surgindo
entretanto, de tempos a tempos, algumas pandemias históricas pela sua
expressão, tais como a lepra, a peste negra, a cólera, a tuberculose, febre tifoide,
a cólera-mórbus, a febre-amarela, mais gripes diversificadas – e destas umas
passageiras e outras não, além de uma duradoura de cerca de dois anos como foi
a Pneumónica, mais conhecida por Gripe Espanhola, que grassou em 1918 e 1919.
Até que passado sensivelmente um século desde
essa epidemia internacional que em Portugal dizimou muita gente, apareceu na
China pelo final de 2019 e depressa alastrando ao mundo o Coronavírus,
tecnicamente chamado Covid-19 (embora no feminino, mas referido vulgarmente em
modo masculino), mais popularmente conhecido por Corona.
Esse nome foi dado pela
Organização Mundial da Saúde, atribuindo tal denominação de COVID-19, por ser o
nome da doença que resulta das palavras “Corona”, “Vírus” e “Doença” com
indicação 19 do ano em que surgiu (2019).
COVID-19/Coronavírus é
uma epidemia originária de uma grande família de vírus comuns em muitas
espécies diferentes. Tendo em dezembro de 2019 havido a transmissão de um novo
coronavírus (SARS-CoV-2), o qual foi identificado em Wuhan na China e causou a
COVID-19, sendo em seguida disseminada e transmitida pessoa a pessoa. Algo que
com a globalidade mundial, pelos transportes de uns lados para outros,
facilmente correu mundo. Sendo então a COVID-19 uma doença causada pelo
Coronavírus denominado SARS-CoV-2, com um espectro clínico variado de infeções
assintomáticas a quadros graves. De acordo com a Organização Mundial de Saúde,
podendo a maioria (cerca de 80%) dos pacientes com COVID-19 terem poucos
sintomas (serem assim assintomáticos), e aproximadamente 20% dos casos detetados
requererem atendimento hospitalar por provocarem dificuldade respiratória, dos
quais aproximadamente 5% podem necessitar de assistência através de
ventiladores (suporte ventilatório).
Esse vírus pode advir de
transmissão decorrente de uma pessoa doente para outra ou por contacto próximo
por meio de aproximações diretas, tais como toque corporal do aperto de mãos
contaminadas, gotículas de saliva; espirro; tosse; catarro; objetos ou
superfícies contaminadas, como telemóveis, mesas, talheres, maçanetas de portas,
brinquedos, teclados de computador e telemóvel, etc. Resultando depois a
possibilidade da doença, principalmente, em pessoas com febre, tosse, dor de
garganta, dores musculares, distúrbios de diarreia, náuseas, vômitos, perda ou
diminuição do olfato e paladar, sem outras causas atribuíveis. Como foi vulgar
então, em 2020 e tempo imediato.
Após testes, para
diagnóstico laboratorial, em caso positivo de sintomas, seguiu-se período de confinamento
e tratamento, quando necessário.
Por isso houve grande
campanha pública a alertar para a necessidade de se lavar com frequência as
mãos até a altura dos punhos, com água e sabão, ou então higiene pessoal com
álcool em gel 70%. Em frequência ampliada quando em ambiente público, como
ainda ao utilizar estruturas de transportes públicos ou tocar superfícies e
objetos de uso compartilhado. Assim como ao tossir ou espirrar, cobrindo nariz
e boca com lenço ou com a parte interna do cotovelo. Assim como mantendo distância
mínima de cerca de 1 (um) metro entre pessoas em lugares públicos e evitar de haver
convívio social. Evitando abraços, beijos e apertos de mãos. Adotando
comportamento sem contato físico.
Isso e tudo o mais que
passou a ser usual, alterando comportamentos e o ambiente, por assim dizer. Tendo
em conta a evolução da situação pandémica, primeiro após o aparecimento na
primavera dessa calamidade que andou em altas percentagens até ao verão, e
depois novamente no outono e inverno em segunda vaga, com crescentes restrições
aos movimentos e atividades, o ano tornou-se atípico, fora do normal.
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Isso apanhou toda a gente
de surpresa. Ninguém contava com aquilo.
Antes ouvia-se falar e
conhecia-se por leituras ter havido uma pandemia há muito, como foi a
Broncopneumónica, popularmente conhecida por gripe espanhola, nos inícios do
século XX, mais precisamente em 1918, e que durou largo tempo ainda de 1919. De
cuja extensão se ouvira dizer a pessoas antigas que fora de caixão à cova, tal
a gravidade de ter morrido muita gente. Inclusive, porque as condições desse
tempo eram muito diferentes de agora, havendo sobretudo ainda pouco
conhecimento medicinal. Naquela época aquilo fez o povo andar tão amedrontado
que quando havia enterros, de enfermos infetados, nem eram tocados os sinos das
igrejas (a defunto, como era normal nas ocasiões de toque de notícia e depois
durante os funerais) para não afligir mais as pessoas.
Mas como uma coisa é
ouvir e outra saber mesmo de fonte limpa, nada melhor que ir ver pelos jornais
da época, para averiguar e confirmar.
Assim, O Jornal de
Felgueiras, em sua edição de 28 de setembro de 1918, registava:
«Gripe bronco-pneumónica
Parece que é assim que
chamam a essa epidemia que, tendo andado pelos concelhos vizinhos do lado sul e
nascente, veio também visitar-nos.
É na Lixa onde se tem
dado mais casos e onde tem havido mais victimas.
Os boletins obituários
acuzam mais de 30 cazos nas freguesias de Borba e Vilacova.
Em quasi todas as
freguesias teem havidos casos mas óbitos, poucos, relativamente, e sendo a
doença um pouco mais atenuada, se bem que alguns falecimentos teem havido para
o sul do concelho, onde a moléstia tem sido violenta e a doença demorada.
A higiene é tudo para a
afugentar.
É aos sinapismos,
fricções de mostarda no corpo e panos de vinagre na testa, que se deve recorrer
logo que se pressinta estar-se afectado, e imediatamente se deve chamar o
medico.»
Assim, com a grafia da
época e ainda na confusão da mudança de escrita, umas vezes redigindo com z e
outras s a mesma palavra, ficou contado à posteridade a situação.
Ora, por estudo pessoal,
do que se foi descortinando de umas coisas com outras, durante as pesquisas
para a elaboração de livros sobre história da região, algo mais é de
acrescentar, podendo-se discorrer em narrativa própria um quadro descritivo
sobre o tema.
Pneumónica
de 1918/1919 na História
Não no sentido dos ciclos
em que a história parece repetir-se, mas pelo que casos da atualidade podem
fazer lembrar acontecimentos de outrora, o surto do Coronavírus que se abateu
pelo mundo, começado na China em 2019 e alastrado a todo o globo por 2020
dentro, traz à ideia alguma associação do COVID-19 com a memória da chamada
Pneumónica, então popularmente conhecida por gripe espanhola, que se abateu
sobre Portugal em 1918. Uma das grandes epidemias da História, com muitas vidas
ceifadas.
Tal autêntica pandemia do
século XX «chegou a Portugal em maio de 1918. A primeira zona afetada foi o
Alentejo aquando do regresso de trabalhadores sazonais vindos de Espanha. Foi o
primeiro surto no país…» Depois em Gaia rebentou um novo surto, rapidamente
espalhado pela cidade do Porto e pelo norte do país. Perante a proximidade a
estas regiões, a epidemia chegou também aos concelhos do Vale do Sousa e no início
do Outono, à volta de setembro, estava a fazer-se sentir já com casos de
infeção no concelho de Felgueiras.
Porém nessa primeira fase
os casos foram ainda dispersos, mas numa segunda vaga a situação piorou.
Então, de permeio, em
finais de 1918 e na transição para 1919, a situação da pandemia agravara-se,
passando no concelho de Felgueiras a haver casos por todo o lado, sendo
atingidas todas as freguesias também. A ponto de em pouco tempo terem sucumbido
dezenas de pessoas. Então n’ O Jornal de Felgueiras (de 26 de outubro de 1918)
era referido que havia «casas onde no mesmo leito está um morto e dormem
doentes e não doentes. Há cadáveres que não têm sido sepultados imediatamente
porque não há quem cuide do serviço e quem faça as despesas do caixão… Há muita
miséria e fome…»
Quanto a números não há
certezas, mesmo porque à época a transmissão de dados não era muito usual, sendo
ainda por alto que se faziam contas, como se dizia popularmente de
contabilidade ditada apenas por cálculos feitos “de cabeça”. Mas que houve
gravidade sabe-se porque chegou a ser construído um hospital episódico destinado
a epidémicos no alto de Santa Quitéria, para acolher os enfermos da crise
pandémica. Dizendo-se até que no final do ano em poucas semanas terão morrido
cerca de quatrocentas pessoas.
As condições existentes à
época eram diferentes de agora. Tendo uma das medidas levadas a cabo nessa
época tido repercussões na paisagem regional, visto as casas, que eram
maioritariamente erguidas em pedra rústica, terem sido caiadas de branco. Pois,
olhando à contaminação, as autoridades civis da região, seguindo exemplos de uns
lados para outros, foram aprovando um conjunto de medidas para conter o avanço
da pandemia. Entre cujas decisões foi estabelecido mandar proceder à desinfeção
e ao branqueamento dos edifícios municipais, devendo obrigar-se os particulares
a procederem de igual modo, assim como foi estabelecido que se desinfetasse
amiudadas vezes as cadeias, bem como as retretes públicas. Apesar dessas e
outras medidas, a epidemia grassou com bastante intensidade. Tendo tido maior
repercussão por exemplo no concelho de Amarante (sobressaído aí o
desaparecimento do pintor Amadeu Sousa Cardoso, entre acontecimentos que
levaram a famosa enfermeira Ana Guedes a criar na área de Vila Meã um
sanatório, como refúgio de assistência em sua casa de família, onde instalou
doentes). Pois então tudo isso levou a que o Presidente da República, à época,
viesse inteirar-se da situação presencialmente.
(E, como em 2020 com o
Covid-19 não se sabia ainda as repercussões que acabará por haver, na ocasião em
1918 houve algumas…)
Ora o Presidente, Sidónio
Pais, nomeara o então capitão João Sarmento Pimentel para comandante do
esquadrão de Cavalaria da Guarda Republicana do Porto, de modo a ter alguém de
confiança na tão importante unidade militar do Carmo, perante a instabilidade
político-social que o país passava. Tendo surgido pouco depois a gripe
pneumónica. Conta o protagonista, que como é sabido era da família da Casa da
Torre, de Rande (como ficou narrado no livro de Norberto Lopes “Sarmento
Pimentel ou uma geração traída”):
«Quando alastrou a
epidemia, ele (o Presidente) foi a Amarante. Eu estava em Felgueiras, porque ia
com frequência à Torre. E o presidente da Câmara Municipal pediu-me que o
acompanhasse na recepção que desejavam dispensar ao Presidente da República. O
homem andava a visitar os hospitais para tomar conhecimento da extensão do
desastre e de algum modo confortar os doentes…Foi lá (em Amarante) que se deram
os (maiores) casos da broncopneumonia.» Em virtude desses contactos, o próprio
capitão foi vítima da doença, ficando então acamado. Nesse interregno deu-se no
Porto o levantamento de Paiva Couceiro que restaurou o anterior regime,
instaurando a chamada Monarquia do Norte. Sendo presos os republicanos mais
temidos pelo novo sistema, ficou a salvo o comandante do Carmo por estar
internado no Hospital Militar. E (resumindo), informado por seu irmão Francisco
e mais oficiais do que se passava, logo que pôde o capitão dirigiu-se ao
quartel, apoiado pelo mano felgueirense, e de surpresa, a 13 de Fevereiro de
1919, pôs fim a esse reino da Traulitânia. E assim, a pneumónica, além de tudo
o mais, também teve influência na vida e na história do país.
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A propósito, como
enquadramento, relembre-se algo do que escrevi também aquando da homenagem que
a Associação 25 de Abril prestou em Lisboa ao “Capitão-General” João Sarmento
Pimentel, quanto ao 13 de Fevereiro de 1919:
A 13 de Fevereiro, a
Monarquia acabou como começara: por um golpe militar no Porto. O seu chefe foi
o Capitão João Sarmento Pimentel. Apesar de doente com gripe, a pneumónica que
nesse tempo grassou pelo país (sendo entretanto informado pelo irmão de toda a
situação e idealizado entretanto o que havia a fazer, com seu irmão Francisco
Sarmento Pimentel a comandar uma das alas das forças armadas apoiantes),
aproveitou a saída da cidade do Porto de Paiva Couceiro e da maioria das
tropas, para invadir o Quartel do Carmo e restaurar a República, à frente da
Guarda Real, que voltou a ser a Guarda Republicana. Estava então restabelecida
a ordem republicana, derrotada que foi a Monarquia do Norte. No Porto correu
entretanto em mãos dos ardinas um desenho com imagem do Capitão João Sarmento
Pimentel, estampa que foi vendida publicamente a tostão (moeda da época) entre
a população, enquanto a cidade portucalense, por iniciativa de cidadãos e ação
das entidades representativas, ofereceu a espada de honra da cidade do Porto ao
Capitão Sarmento Pimentel.
Esteve assim Felgueiras
em mais um momento histórico da grei, sendo o mais novo dos Pimenteis,
Francisco Sarmento Pimentel, natural do concelho de Felgueiras. Bem como o mais
velho em Felgueiras passou praticamente sua mocidade, oriundo da família da
Casa da Torre de Rande, tendo até sido aluno do antigo Colégio de Santa
Quitéria. E com eles foi salva e mantida em 1919 a República em Portugal, como
havia sido implantada em 1910. Com a Broncopneumónica pelo meio.
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Pois também o Coronavírus
se meteu entre a vida de 2020. Não se conhecendo se com alguma influência
imediata sobre casos de políticas, mas pelo menos nas vivências pessoais.
Com efeito, a história
por vezes repete-se e, volvido um século, sensivelmente, apareceu por cá nova
moléstia, a alterar a vida das pessoas.
Foi à chegada da
Primavera de 2020. No começo de março, tendo-se ouvido primeiras notícias na proximidade
do fim-de-semana primeiro do mês. Chegadas notícias que havia umas duas pessoas
infetadas em Barrosas, freguesia de Idães, no concelho de Felgueiras, e na
vizinha localidade de Santo Estevão de Barrosas, do concelho de Lousada. Isso
porque um industrial de calçado de Barrosas tinha ido a uma feira de produtos
de calçado a Itália, onde o Coronavírus estava já alojado. Tendo assim havido
essa transmissão entre familiares, na chegada a Portugal. Contudo ainda se não
temia muito a sua propagação, pois nem as autoridades de saúde a nível nacional
davam muita importância ao assunto. Mas depressa se propagou. Tendo então
acontecido que ainda no sábado 7 de março houve na Biblioteca Municipal de
Felgueiras a apresentação pública do meu livro “Ciclistas de Felgueiras” (no
dia dos anos da Clara, por isso escolhido por mim para ter a minha gente toda
comigo na ocasião… em que também o Vasco já estava em gestação, dentro da mãe)
e esse foi o último acontecimento público em Felgueiras, no ano, pois logo de
seguida tudo fechou.
Com efeito foi então anunciado
oficialmente, ao início da semana seguinte, um conjunto de medidas
extraordinárias e de caráter urgente, decididas em Conselho de Ministros do
Governo de Portugal, para resposta à situação epidemiológica do novo
Coronavírus-COVID 19, em modo de acautelar, estrategicamente, a previsão de
normas de contingência para a epidemia SARS-CoV-2, e assegurar o tratamento da
doença no Serviço Nacional de Saúde (SNS), através de um regime legal adequado
à realidade excecional.
E num ápice o país teve
de entrar em confinamento, na tentativa de impedir maior propagação que a tão
rapidamente atingida. Sucederam-se sintomas e como doença forte adveio a morte
para muita gente. Também por cá tudo ficou no silêncio interior de cada qual. Tanto
que nem houve cerimónias tradicionais de Páscoa sequer e pelo ano adiante
deixou se se poder circular para fora de cada concelho durante muito tempo.
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Foi nesse ambiente que
chegou a vez do Vasco vir ao mundo, passados meses, a meio de outubro.
Acontecendo que no seu nascimento só o Hugo pôde estar presente, junto à Clara;
amparando pai e mãe a chegada do seu segundo filho. Seguindo nós cá longe tudo
pelas comunicações via telemóveis e internet, por notícias pessoais e fotos
enviadas e cá chegadas. Até que depois com a alta hospital o Vasco foi para
casa e então também o Guga ficou a conhecer o irmão e a tê-lo consigo. Enquanto
nós, cá longe, o imaginávamos e íamos gostando da sua existência. Tal qual na
continuidade do tempo de restrições sociais, incluindo uma doença súbita
acontecida com o Vasco, que nos fez ver como sem ainda o conhecermos
pessoalmente já gostávamos muito dele… Felizmente à chegada do Natal houve uma
espécie de amnistia oficial, que proporcionou que as famílias se juntassem,
ainda que em número reduzido. E então, pude estreitar a mim o meu novo neto.
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Enquanto isso o Covid
estava e continuava em força. Foi mesmo como um desconhecido invisível que nos
apareceu do nada, no início de março de 2020. Em cuja fase inicial fomos
bombardeados por muitas informações contraditórias, imensa desinformação, mais
por pessoas com responsabilidades, como no caso dos governantes nacionais.
Primeiramente houve um deixar passar e ficar à espera, para depois terem conduzido
a um confinamento social. Enquanto se não sabia bem o que era, foi tempo para a
indústria se reorganizar e produzir máscaras e desinfetantes. Bem como
oportunidade de apelos às boas práticas e ensino à população sobre algumas
medidas de proteção visando algum controlo da pandemia. Seguiu-se um verão
sereno, mas marcado por calor amedrontado, embora não generalizado. Até que,
passado o tempo quente, voltou tudo atrás com uma segunda vaga. Para,
felizmente, volvidos meses tudo começar a voltar à normalidade com a vacinação
efetuada, que atualmente, ao findar o ano de 2022, vai já na quarta dose tomada.
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Pois então, o Covid
intrometeu-se na vida das pessoas e foi autenticamente um intruso na nossa vida
familiar. Fazendo com que nós, cá os avós, tios e primos da Longra, só vimos o
nosso Vasco passado muito tempo, com a chegada do Natal desse ano de 2020,
quando finalmente nos reunimos cá em casa. Vendo sua linda cara coberta de seu
sorriso atraente, mas no colo dos que ele estava habituado a ter com ele, até
aí, naturalmente. Sendo assim esse Natal um natal ainda mais atrativo e
reluzente. Pudendo eu passar a senti-lo, também. Como com o decorrer dos meses,
e já nestes dois anos entretanto ultrapassados, foi melhorando a convivência
possível e o Vasco, após mementos de estranheza à chegada, depois se afeiçoa
depressa connosco. E dá gosto ver como a vida se renova e fortalece.
Nesse Natal, na viagem de
Lisboa para a Longra, enquanto esperávamos por ficar a conhecer o novo rebento,
telefonei à Clara para comprar, numa das áreas de serviço da auto-estrada, um
jornal que tinha junto também uma revista… E assim, enquanto isso e depois, a
família teve a surpresa de ver que na revista Evasões, especial da quadra
natalícia acompanhante do Jornal de Notícias, vinha algo de interesse familiar,
ao verem-me lá no interior das páginas, vindo ali uma entrevista comigo sobre
as tradições pessoais de Natal.
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Esse foi, pois, um Natal
mais aconchegante, como festa de família por excelência, com todos nós juntos.
Estão cá gravados na
retina da memória todos os momentos entretanto já passados, quer aqui na
Longra, como das vezes que fomos a Carnaxide. Como as imagens fotográficas
espalhadas por este livrinho ficam a testemunhar. Porque há imagens que falam
por muitas palavras que se possam escrever. E nada consegue narrar quão melhor
que tudo diz o coração.
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E cá temos o Vasco. A
juntar aos Gonçalo, Tiago e Diogo, formando um quarteto de luxo. Tanto como
algo especial é isto do sentimento avoengo, de avós e netos. Como eu via a
minha avó. E posso relembrar, no afago da memória, como um dia os meus netos
podem lembrar os avós.
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Calha assim bem evocar os
meus. Dos quais lembro de modo especial minha avozinha Júlia, com quem passei
minha infância, junto à sua cama, sentado junto ao leito em que estava
paralisada santificadamente, após ter sofrido um “ataque” quando estava comigo
ao colo, tinha eu coisa duns 4 meses, segundo me contava minha mãe. A
“Vózinha”, com a qual me habituei a gostar de histórias, ao ouvi-la contar-me
enternecedoras peripécias de outros tempos e loas de antigamente… A minha
avozinha que tenho sempre comigo, em todos os meus pensamentos, como está
registado num dos contos do meu livro “Sorrisos de Pensamento”!
A minha avó materna não
conheci, pois faleceu ainda antes de eu nascer, mas tenho dela linda ideia pelo
que minha mãe dela contava. Já de meu avô materno lembro-me bem, apesar de ser
ainda criança quando faleceu, tendo ainda uns poucos de alguns dos livros que
ele gostava de ler e ter, numa característica que sei bem de onde me vem…
também.
Assim sendo… Tenho nas
memórias mais antigas, das primeiras imagens da vida, a minha avozinha, minha avó
paterna. A minha avó Júlia. Deitada na sua cama, onde estava há anos
paralisada, mas sempre bem-disposta, com cara sorridente, dum modo
santificadamente marcante. Ficara assim desde que sofreu algo que deve ter sido
um AVC, que popularmente diziam ter sido um “ataque”, estando comigo ao colo,
era eu bebé. Ficando paralisada apenas na parte das pernas, mas lúcida e de bom
cérebro. A partir dali fui crescendo a querer estar junto a ela e ela a gostar
de me ter à sua beira. Ouvindo-a contar-me histórias de fazer sonhar.
Lembrando-me bem de suas mãos branquinhas e enrugadas, de pele muito macia, de
palavras ternas como réstia duma vida cheia de histórias. Quão me vem à memória
que me embalava, com um cordel preso ao berço, conforme soube mais tarde como
depois fazia ao meu irmão mais novo, Fernando. E nós os dois, os rapa-caçoilas
da família, ali andávamos junto à sua cama, a querer ouvi-la, entre umas vezes
ou outras das vezes em que rezava ou ouvia o terço e as missas no rádio que o
meu pai lhe colocara na mesinha de cabeceira. Sempre com muita calma a gerir
dentro do possível as brincadeiras dos netos. Era como se no seu regaço eu
descansasse desses tempos de infância, dum modo que pela vida adiante sei que
me acompanha. Como naquela noite dum conto que conto no meu livro Sorrisos de
Pensamento. E tenho bem presente como fazendo parte de minha alma, como sinto
num fechar de olhos de pensamentos.
A minha avozinha, nascida
em 1884, faleceu em 1969. Em cujos 85 anos seus eu ainda a pude ter comigo
alguns anos da minha vida, que então ia em 14 primaveras. Embora na época de
seu falecimento eu estivesse deveras longe, por via do percurso estudantil, estando
episodicamente ausente em período formativo num estabelecimento interno nos
arredores do Porto (no Seminário dos Capuchinhos, em Gondomar). Como também
anotei na narrativa do conto daquele livro de descritivas histórias
particulares. Lembrando coisas e loisas que me apeteceu contar. Embora pudesse
ter contado mais, que não calhou. Como mais tarde calhou, mas aí de viva voz,
na confirmação da casa onde nasceu o célebre mestre de música sacra Padre Luís
Rodrigues, porque foi na mesma casa onde anos antes ela também nascera, como
contava – na Casa da Fonte, do alto da freguesia de Rande, onde sua mãe fora
empregada nesses tempos que se perdem na penumbra das memórias (antes de também
ela ter depois trabalhado na casa de Rande, como acontecia nesses tempos de
fidalgos de casas solarengas). E está registado, quanto à localização, conforme
consta na narrativa oficial do seu registo de nascimento, do qual tenho prova
na Certidão de Nascimento que guardo, como várias outras recordações físicas de
coisas que ela guardava, também.
Assim, como no calor duma
vela acesa da lembrança que me vem à ideia, lembro a minha avozinha, ao calhar
desta oportunidade. Como que sentindo tê-la à minha beira, a proteger-me, na
ternura da infância que quero fazer perdurar no colo de sua recordação. Como eu
estarei com os meus netos sempre.
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Bibliografia DO AUTOR
Obras publicadas:
- Livro (volume
monográfico) «Memorial Histórico de Rande e Alfozes de Felgueiras»; publicado
em Novembro de 1997. Edição patrocinada pelo Semanário de Felgueiras.
- Livro «Associação Casa
do Povo da Longra – 60 Anos ao Serviço do Povo» (alusivo ao respetivo
sexagenário, contendo a História da instituição - Abril de 1999).
- Livro (de contos
realistas) «Sorrisos de Pensamento» – Colectânea de Lembranças Dispersas;
publicado em Outubro de 2001. Edição do autor.
- Livro (alusivo da)
«Elevação da Longra a Vila» - Julho de 2003. Edição do autor.
- Livro (cronista do)
«Monumento do Nicho Nas Mais-Valias de Rande» – Dezembro de 2003 (oferecido à
Comissão Fabriqueira paroquial, destinando receita a reverter para obras na
igreja). Edição do autor.
- Livro «Padre Luís
Rodrigues: Uma Vida de Prece Melodiosa» – Na passagem de 25 anos de seu
falecimento; publicado em Novembro de 2004. Edição do autor.
- Livro «S. Jorge de
Várzea-História e Devoção», publicado em Abril de 2006. Edição da Paróquia de
Várzea.
- Livro «Futebol de
Felgueiras – Nas Fintas do Tempo» (sobre Relance Histórico do F. C. Felgueiras
e Panorâmica Memorial do Futebol Concelhio, mais Primeiros Passos e Êxitos do
Clube Académico de Felgueiras) – pub. Setembro de 2007. Edição do autor.
- Livro "Destino de
Menino" - dedicado ao 1º neto - Dezembro de 2012, em edição restrita do
autor, numerada e autenticada pessoalmente.
- Livro "Luís
Gonçalves: Amanuense - Engenheiro da Casa das Torres", patrocinado pela
fábrica IMO da Longra - biografia de homenagem ao Arquiteto do palacete das
Torres, de Felgueiras - Janeiro de 2014.
- Livro "História de
Coração" - dedicado ao 2º neto - Novembro de 2015, em edição restrita do
autor, numerada e autenticada pessoalmente.
- Livro “Torrente Escrita
– em Contagem Pessoal”, ao género autobiográfico – Dezembro de 2016 - edição
restrita do autor, numerada e autenticada pessoalmente (apenas para partilha
familiar).
- Livro “História dum
Brinquedo que não se pode estragar”, dedicado ao 3º neto - em Fevereiro de
2019, em edição restrita do autor, numerada e autenticada pessoalmente.
- Livro “Luís de Sousa Gonçalves
O SENHOR SOUSA DA IMO” – Patrocinado pelo IESF-Instituto de
Estudos Superiores de Fafe – biografia de homenagem ao fundador da Fábrica IMO
da Longra – Novembro de 2019.
- Livro “Ciclistas de
Felgueiras” – sobre os homens do ciclismo português naturais de Felgueiras que
andaram na Volta a Portugal e provas importantes - publicado pela editora
Bubock Publishing S.L. Janeiro de 2020.
- E agora este livro “Um
tal Covid na história familiar… num sorriso de vida”, dedicado ao 4.º neto,
Vasco.
(Além de livros oficiais alusivos a
realizações de eventos, entretanto também publicados.)
Pelo Natal de de 2022
Armando Pinto