Artigo de "Opinião", na habitual crónica de colaboração ao jornal Semanário de Felgueiras, edição de 17 de dezembro, à página 2 - cujo exemplar de papel do jornal, além de estar à disposição na redação e locais habituais de venda, está a chegar às caixas de correio das casas dos assinantes por estes dias, ainda, na atual atrasada distribuição dos correios CTT.
Crónica, em jeito de aplauso evocativo à histórica casa de teatro e cinema de Felgueiras, num abraço romântico a toda a sua abrangência:
Em louvor do antigo Teatro Fonseca Moreira
Decorre na atualidade felgueirense certo enlevo na passagem do centenário da mansão afetiva de espetáculos inicialmente vocacionada como Casa de Teatro de Felgueiras. Depois transformada como Cine-Teatro, e muito mais tarde voltada a áreas diversas, já com o novo nome e função de Casa das Artes. Cuja história do histórico e emblemático Teatro, depois Cine-Teatro Fonseca Moreira, se confunde com a história social de Felgueiras durante os últimos 100 anos, desde os inícios do século XX ao princípio do século XXI. Algo notável quando se assinala o seu 100.º aniversário.
Assim sendo, permita-se umas pancadas de Molière no abrir do pano e deixar à mostra da recordação a boca de cena alusiva, deambulando em torno do seu cenário memorando, como que abrindo no fundo um ambiente histórico-rememorativo.
Ora, estando-se praticamente na quadra natalícia, com a envolvência do sortilégio do Natal a reluzir nos semblantes da memória, vem a talhe relembrar que essa casa tão apropriada de todos, porque era ponto de encontro de boa parte dos felgueirenses, depois de ter passado a ser também casa de cinema, além de durante todo o ano ser local de uso normal dos frequentadores da então vila de Felgueiras, era em certas ocasiões mais ainda sítio de ida anual ao cinema, nomeadamente em alturas das tradicionais festas de ano e mais acentuadamente pelo Natal. Sendo então costume grupos de familiares e amigos, que se encontravam mais nessas oportunidades, irem ao cinema “à vila”, sendo o Cine-Teatro Fonseca Moreira o sítio de passagem das tardes do domingo de Natal, após o jantar natalício familiar e passeio domingueiro da saudade. Com algum enfoque no mais romântico ambiente sedutor de namorados que ali davam largas a sonhos e paixões, mas também a inícios de tais desejos.
Entre essas e outras facetas, esta casa em apreço contém terna envolvência. Podendo-se dizer que será um espaço de fazer lembrar histórias, com momentos de narrativa especial, numa mescla de memórias misturadas com amorosos sonhos, onde bela parte do passado faz virar a página do ponto até ao presente.
Hoje em dia, sendo agora chamada Casa das Artes, tem sido de alguma forma confundida popularmente como casa da cultura, a pontos de haver enganos com a vizinha casa e fronteiro edifício da Casa das Torres. Havendo muita gente que fica baralhada nesse aspeto, como se viu ainda recentemente e por diversas vezes, na momentânea função de uma parte do seu edifício como Centro de Vacinação de Felgueiras durante este período da pandemia Covid.
Como é da história conhecida, o original Teatro Fonseca Moreira teve a sua inauguração oficial em novembro de 1921. Tendo na noite de 19 subido a palco a peça “O Feitiço contra o feiticeiro”, da lavra do seu fundador, António José Fonseca Moreira, enquanto na seguinte noite foi ao palco a peça "Morgadinha de Valflor” de Pinheiro Chagas. Resultando esse fim-de-semana numa apoteose com a presença do seu fundador, emigrado há muito no Brasil. Após isso muitas palmas foram ouvidas ao longo de muitos anos decorridos naquela sala, a par com assobios que também foram timbre aos ouvidos noutras circunstâncias, havendo entretanto transitado a salão de passagem de fitas de cinema, e de permeio passado por diversas gerências. Tendo sido marcante a época em que esteve a cargo do entusiasta cultural Adriano Sampaio e Castro, da Longra, que trouxe a Felgueiras grandes momentos de apreço cultural. Havendo aí o Teatro de Felgueiras conhecido tempos áureos, especialmente com a presença de atores teatrais consagrados e outros agentes artísticos, como por exemplo a vinda do maestro Ino Savini para uma homenagem prestada ao célebre musicólogo felgueirense Padre Luís Rodrigues, entre outras iniciativas. Como no decurso dos tempos foi sendo registado em lápides colocadas no átrio de acesso ao salão de espetáculos, conforme faz também parte da história ainda recordada. Até que ficou sob auspícios de António Fernando Moura e sucessores, como casa cinematográfica e por fim voltou à gerência municipal.
Na passagem do respetivo centenário, enquanto é de enaltecer o papel preponderante no desenvolvimento cultural e anímico do concelho, também apraz enlaçar o ambiente sentimental, desde as primeiras audições de peças da Arte de Talma, ao vislumbre de tramas cinematográficas e até primeiros encontros e quiçá primeiros beijos.
ARMANDO PINTO