Agora os anos até passam depressa, na sensação traduzida pela
idade vivenciada. Parecendo que o tempo se esvai como areia largada duma mão mal
fechada, na ampulheta da vida. Sendo já usual saber como é isso de passar de
uns anos para outros, pela noite e entrada no dia da passagem do chamado ano
velho para o ano novo. Mas em tempos, quando criança, foi novidade para mim
essa notícia ouvida, enquanto tudo parecia diferente e surpreendente. Tendo
entre lembranças dos primeiros anos o facto de começar a ter perceção do que acontecia
nessa altura do ano, em que na “Metalúrgica” queimavam o ano velho. Como
acontecia então nessa fábrica grande da Longra, a então chamada ainda fábrica
nova, a Metalúrgica da Longra já passada do Largo da Longra para a reta da
Arrancada da Longra. Em cujo horário laboral desses tempos na véspera de Ano Novo
se trabalhava até ao meio dia, e na saída, para gozo da véspera do feriado e
dia santo do dia seguinte, queimavam um boneco, feito de propósito com
materiais corriqueiros, para o efeito, a que pomposamente apelidavam de “ano
velho”. Com certas curiosidades misturadas, quão aconteceu de terem dado até
esse apelido, depois, a um dos operários, pois era costume de numa brincadeira,
à espécie de praxe, darem um apelido a cada um dos funcionários da fábrica, alguns
dos quais pegaram mesmo pelo tempo fora.
Ora, nesses tempos de idade infantil, do que ficou na
memória de remotas lembranças, esse caso da queima do ano velho na Metalúrgica foi
uma das primeiras notas fixadas pessoalmente, do que ouvia aos mais velhos.
Depois foi ouvir em noite de consoada, à roda da lareira de casa do meu tio Zé (José da
Costa Moreira) e da tia Emília, onde nossa família ia passar um bocado e gostávamos
de ir depois da ceia desses dias, aí o tio Zé contar histórias de antanho a propósito
da saída do ano e entrada no novo, até depois ainda ouvir de seu rádio roufenho
que o ano novo era ainda uma pequena criança a gatinhar… E no dia seguinte ter ouvido
do Padre João, na “prática da Missa” de Rande, ele dizer lá de cima do altar que o ano
que entrava era como uma folha nova, em branco, dum caderno novo, para se ir
desfolhando dia a dia.
Agora já muitas folhas se folhearam ao longo de muitos anos.
E felizmente, continua este ciclo sucessivo, todos os anos, perpassando um
sentimento dos dias que se vão escorrendo, como areia solta de pensamentos
divagados, na boa sensação de estarmos vivos.
– Observação: À falta de melhor, para ilustrar esta lembrança
escrita, fica aqui uma foto de criança, de calção, ainda (embora na imagem nem pareça…),
junto a um antigo meco que estava à beira cá de casa, dos antigos pequenos mecos
de pedra da estrada, colocados na berma com numeração da quilometragem sucessiva, em contagem entre os maiores. Bem como
outra fotografia de quando já mais crescido, do tempo da Comunhão Solene e entrada na Liga
Eucarística de Rande.
Armando Pinto