Espaço de atividade literária pública e memória cronista

terça-feira, 4 de novembro de 2014

Em tempo de lembrar nossos entes queridos desaparecidos - In Memoriam: Joaquim Pinto (1916-2006)


Estamos em tempo de Todos os Santos e Fiéis Defuntos, cujos dias ocorreram ao princípio deste mês de Novembro. Sendo sempre este um período de maior lembrança aos familiares e demais ente-queridos entretanto ausentes fisicamente.

Havendo já desaparecido de nosso sangue pais, tios, primos e, de afinidade, também muitos amigos, evocamos noutras ocasiões deste blogue a figura materna e agora lembramos a figura paterna - como homenagem e perpetuação familiar, registando alguns traços das características que notabilizaram a nossos olhos e mais sentidos na alma da recordação esse que foi e é nosso herói eterno.

In Memoriam: Joaquim Pinto

Em ideia que temos, uma das evidências terrestres é que fixar memória respeitante a algo particular ou coletivo será uma forma de celebrar a vida. E, neste sentido, essa atitude terá em conta valorização de tudo o que mereça apreço, com discernimento de avaliação, a enaltecer na amplitude de uma identificação.

Pode a área cronista ter também afectividade e a visão literária ser sensível. Nem sempre a narrativa publicista deve ser demasiado técnica, de texto conciso, frases modelares, segundo normas feitas, mas em lugar próprio igualmente proporcionar oportunidade de manifestos sentimentos e partilha exposta de conhecimentos. Ora, sendo habitual ao autor escrever sobre os outros, em espaços públicos, desta vez calha a preceito dirigir uma pessoal mensagem, na ocasião do período dos Santos, como se costuma dizer, e ainda de aproximação natalícia, na pertinência da proximidade da festa de família por excelência. Ajustando-se a oportunidade para dedicação duma homenagem, no sentido de elo familiar, ao patriarca da família e extensivamente a toda a prole sucedânea.

Está, com efeito, eternamente viva a memória do progenitor e patriarca familiar do signatário. Por sinal também uma figura marcante da memória local, atendendo ao seu currículo prestigiado com o Prémio da Associação Industrial Portuense, em 1959 (como obreiro da sirene e de alguns inventos na Metalúrgica da Longra, fábrica de grande prestígio, que foi autêntica escola de artes laborais, a pontos de então haver consideração de ser uma honra pertencer a seus quadros). Além de bairrista e profundo conhecedor da história local de tempos passados, segundo o que viveu e ouviu, tendo tido primordial comparticipação na monografia sobre as memórias da freguesia natal, por meio das informações que nos deu para o livro Memorial Histórico de Rande e Alfozes de Felgueiras. Subsídio comparticipativo que se deveu também à esposa, a saudosa Mãe do autor destas evocações, a Matriarca da família, pelo muito que contava na sua ligação estremosa, dando razão suprema ao ditame de que no companheirismo a um homem de relevo sempre houve e está uma grande mulher…

Costuma dizer-se que os avós são pais com açúcar. Definição a preceito, no caso em apreço, para o avô dos filhos e sobrinhos do autor destas linhas, mas também e especialmente Pai, tal o sabor doce que deixou, a criar água em boca sufocada.

Como seiva que produz vida e renova a natureza, a memória de nosso pai permanecerá pelos tempos, em perene saudade e constante recordação. O seu exemplo estará sempre presente, nos valores que ele soube incutir, na união da família que conseguiu criar e fortalecer.

Contava ele que, segundo ouvira, se celebrava a missa dominical de Rande aquando do seu nascimento. E, conforme se tornou público, porque o parto de sua mãe estava difícil, o pároco dessa época, Padre Augusto, pediu do altar a todos uma oração. Então foi feita conjuntamente uma sentida prece, para que nascesse em boa hora. Facto passado a 10 de Dezembro de 1916, na mesma igreja onde depois foi baptizado, participou nos actos da comunidade paroquial até ao seu falecimento, ocorrido a 10 de Março de 2006; em cujo templo por fim, no seguinte dia 11, foi encomendado a Deus. Agora, de peito contrito, aqui e onde nos lembramos dele, como nosso herói e figura pública que mais nos marcou, estamos gratos, agradecendo a boa hora em que veio ao mundo para criar as raízes que deixa em nós.


= Joaquim Pinto – fisionomia aos 89 anos, quase no fim da sua marcante caminhada terrena – na foto, junto com o filho autor destas linhas. =

Aos domingos, dizia ele, para ser domingo de verdade tinha sempre de ir à missa de Rande, pela manhã; e de tarde havia de dar um passeio pela freguesia, sempre, para ver os seus sítios queridos, o lugar de Janarde onde nasceu, a casa de Valdomar onde passou sua infância, mais todos os lugares que conhecia como as próprias mãos. Quanto gostava de ver quando aparecia a seus olhos qualquer melhoria na freguesia. Assim como tinha algum desgosto pelo desaparecimento de uma fonte que fizera parte do ambiente de sua juventude, a Fonte da Vinhó, antes existente junto a um campo da Quinta, entre Casal Corne e Janarde. A freguesia de Rande fazia parte dos seus pensamentos e anseios. Como sonhava com o alargamento do Largo da Longra, de modo a que o centro da vila que ainda conheceu pudesse ter uma praça central. Conversava muito com os filhos e até os netos sobre esses e outros motivos de seu interesse, sabendo transmitir aos vindouros autêntico apego pelo torrão natal. A terra em que ele era uma referência, quer como construtor da sirene da antiga Metalúrgica, empresa onde durante muitos anos foi o operário mais antigo; tal como mais tarde artífice bobinador e, depois, por todos se terem habituado a vê-lo constantemente, em presença habitual na sua veneranda fisionomia, tão respeitado na consideração geral, tornando-se personagem grado e admirado.

No silêncio contido do nosso coração, continuamos a conversar e, sempre que haja qualquer obra ou beneficiação na sua e nossa terra, os nossos sentidos serão os seus olhos, presente como estará sempre connosco, bem no íntimo de todos quantos o amamos.

Remexendo no fundo da mensagem, que desejamos voe até ao Infinito, tomando as asas do poeta, permita-se uma adaptação para dizer-lhe, na ligação terrena fortalecida espiritualmente:

Se vires que pode merecer-te
Alguma coisa a dor que nos ficou
Da mágoa sem remédio de perder-te,
Roga a Deus que de nós te afastou 
Que na Sua Glória nos faça ver-te 
Quão ditosa a doutrina nos legou.

*
Em homenagem de reconhecimento, foi Joaquim Pinto, da Longra, merecedor de um Voto de Pesar pela Assembleia Municipal de Felgueiras, na primeira sessão ordinária realizada por aquele órgão autárquico após o seu falecimento. Deliberação essa havida na respectiva sessão ordinária realizada a 20 de Abril de 2006, por voto apresentado pelo Grupo Parlamentar do PSD e aprovado por unanimidade dos 63 membros presentes no hemiciclo municipal, de todos os grupos partidário-parlamentares Felgueirenses.

Igual reconhecimento houve de seguida na autarquia de Rande, através de voto que teve apresentação pela Junta de Freguesia de Rande e aprovação de todos os presentes em reunião magna da Assembleia local, tendo assim também a Assembleia de Freguesia de Rande tido esse sinal de apreço em sessão do seguinte dia 27 do mesmo mês.

Ora, fazendo memória, escreve o autor em nome coletivo: Também nós continuamos a procurar honrar essa memória. E, assim, cá estamos nós todos, desde os mais velhos até ao Gonçalo e ao Tiago. Com o que nos une bem presente!

Armando Pinto