Numa abordagem historiadora, buscando estudo a reportar às origens
de casos identificativos, da memória coletiva felgueirense, mais um artigo daqui
do autor foi pousar ao jornal Semanário de Felgueiras, de quanto se voa nestas
loas, dentro da colaboração habitual com assuntos respeitantes a Felgueiras.
Onde muitas coisas que se vêm todos os dias, do que está à vista de todos e existências
com que nos cruzamos, nem sempre são bem do conhecimento público nas suas
facetas cronológicas e razões de significado. Como é o caso do cruzeiro do
jardim fronteiro ao edifício da Câmara Municipal. Na lógica e diferenciação do
seu tempo. Distinto como é de outros, sem confusão possível com o vizinho
cruzeiro do adro da igreja paroquial de Margaride, dali bem próximo, mas de
cariz sobretudo religioso e de matriz comunitária-paroquial. Havendo assim dois
cruzeiros na mesma cidade de Felgueiras, contudo de particularidades distintas,
com o municipal a ser icónico padrão concelhio.
Esse, com efeito, é o mote que desta vez veio a propósito. Pois
que ainda recentemente, numa conversa através do “chat” do facebook, ou seja
nas mensagens privadas dessa rede social, foi feita uma pergunta sobre esse
cruzeiro, também conhecido por padrão, como é de facto. Então referi que haveria
de escrever sobre isso na minha colaboração ao Semanário de Felgueiras. Entretanto,
como outros temas apareceram com mais atualidade e se foram intrometendo, só
agora pude escrever reportando a este motivo.
Assim sendo, como o prometido é devido, abeiramo-nos do mesmo
padrão, com ideia de tratar do caso em sentido estudioso. Embora num tratamento
breve, como é num artigo jornalístico em espaço de opinião. Artigo esse que vem
então publicado na edição desta semana do SF. De cuja crónica para aqui
transpomos o texto respetivo. Ilustrando ainda a descrição com fotos intercaladas do mesmo padrão de cruz cimeira, com vistas algo diferentes conforme os estados floridos do ambiente.
Cruzeiro-Padrão da Independência em Felgueiras
De tempos a tempos há temporadas assinaláveis, comemorando
algo ou classificando motivações. Restando depois, por norma, marcos edificados
de alusão perene a tais acontecimentos. Como, sem rebuscar muito no tempo,
ainda lembra a edificação de pequenas capelas e nichos, com dedicação a Nossa
Senhora do Rosário ou da Conceição, existentes em diversas terras da região, de
construção próxima à passagem das comemorações do Ano Mariano, em 1985, e em
associação extensiva ainda ao período comemorativo dos 350 anos da Padroeira de
Portugal, em 1996. Assim como alguns outros pequenos monumentos respeitantes à
proximidade dos denominados Anos Santos, como já ocorreu igualmente no início
da década dos anos 2000. Também foi assim bons anos antes, aquando da
construção dos chamados Cruzeiros da Independência, que tiveram ereção à época
comemorativa do tricentenário da proclamação da Padroeira de Portugal e da
Restauração da Nacionalidade.
Pois foi assim que nasceu o cruzeiro-padrão de Felgueiras,
ereto no jardim central da sede do concelho de Felgueiras. Tal como outros
cruzeiros espalhados pelo concelho e por diversas zonas, normalmente de
características religiosas-paroquiais, enquanto o de Felgueiras em moldes mais
emblemáticos, puxa a um carácter simbólico de feição monumental.
Ora, os Cruzeiros, nos primórdios da organização territorial
das paróquias e derivadas freguesias, foram implantados como sinal de jurisdição
paroquial, em substituição dos pelourinhos das antigas freguesias. Com a erosão
dos tempos, destruídos ou transformados muitos dos originais, houve então em
1940 essa campanha nacional de implantação de novos, em movimento liderado pelo
Padre Moreira das Neves (da diocese do Porto, mas que se radicou em Lisboa, ao
serviço da comunicação social de inspiração cristã), sendo a iniciativa baseada
numa ideia de cruzeiros da independência com a divisa “Uma Cruz basta para dizer
na História quem é Portugal”, em vista à comemoração da proclamação da
Padroeira de Portugal. Aproveitando então para tal iniciativa patriótica o
espírito de respeito do povo português perante os padrões de fé existentes por
todo o país. E apelidando-os de Cruzeiro da Independência na pertinência do
triplo centenário da Restauração da Nacionalidade, que passava então, junto com
um conjunto de comemorações patrióticas e ações públicas de propaganda por todo
o país. Dessa imensa organização de âmbito nacional resultou que fossem criadas
localmente as chamadas “Comissões das Comemorações Centenárias” que
diligenciaram a construção desses “Cruzeiros da Independência” na centralidade
das localidades portuguesas. Muitos novos cruzeiros foram colocados pelo território
português. Uns com a colaboração das Câmaras Municipais e outros por iniciativa
de comissões organizadas. Em cuja sequência se deu em Felgueiras o movimento
atinente a esse desiderato, que decorria ainda em finais de 1940, como se pode
ler numa nota noticiosa inserta no jornal Notícias de Felgueiras de nove de
Novembro de 1940, referindo existência duma «Comissão encarregada de obter
fundos para o Cruzeiro da Independência, a erigir nesta vila…». Que altaneiro,
é marco concelhio no coração nobre da atual cidade de Felgueiras.
O Cruzeiro da Independência felgueirense, em formato de
padrão, colocado no jardim da Praça da República, «foi feito com pedra do monte
de S. Torcato, (sendo) obra de bom desenho e bom gosto, riscado por António de
Azevedo. No capitel da coluna oitavada (forma alusiva aos oito séculos da
Nação, ao tempo) figuram oito brasões dos dois tipos afonsinos, alternados (um
só com as quinas e o outro com cruz branca). Serve-lhe de remate uma cruz
ornada com esferas.»
ARMANDO PINTO