Espaço de atividade literária pública e memória cronista

terça-feira, 19 de fevereiro de 2019

A minha avozinha Júlia: 50 anos de saudade e constante lembrança!


Quando lia o livro das lições da Escola, na primária, ao ter diante dos olhos aqueles versos de Junqueiro dos Simples, na composição sobre a moleirinha – uma velhinha que ia com seu jumentinho adiante, enquanto enternecia netos como eu, não pela personagem mas pelo que fazia lembrar  me vinha à ideia minha avozinha, então paralítica na cama havia anos, mas que me encantava.

Ah, como me fazia bem entreter-me à sua beira, sentar-me junto a ela a ouvi-la; e como nela tudo era bom. Enquanto ela vivia santamente resignada e era o sol que entrava na família e irradiava até às pessoas amigas e conhecidas, como os raios de sol que eu via entrar pelas frinchas da casa e misturado ao fumo da lareira fazia espirais, subindo como o incenso na igreja…

«…Vendo esta velhita, encarquilhada e benta,
Toc, toc, toc, que recordação!
Minha avó… se me representa…
Tinha eu seis anos, tinha ela oitenta…

(isso nos versos de Guerra Junqueiro, pois eu era criança mas nem sei quantos anos ela teria, ao tempo, interessava-me lá... eu via-a sempre de cara linda e sorridente! E como o que eu lia a espaços ia condizendo:)

...Que prazer d’outrora para os olhos meus!
Minha avó contou-me quando fui criança…

Toc, toc, e os astros abrem diamantinos,
Como estremunhados querubins divinos,
Os olhitos meigos para a ver passar…»

A minha avó tinha ficado assim quando eu tinha poucos meses e faleceu estava eu com catorze anos, meses antes de perfazer minhas quinze primaveras da vida. Fazia parte da minha vida.

Fez 50 anos neste fevereiro de 2019 que (na então terça-feira de Carnaval, em dia chuvoso e tristonho) vim propositadamente de onde estava e a não via há meses, portanto, para me poder despedir dela fisicamente. Estávamos em 1969, ano que então me fez sentir um grande abalo, na primeira perda de alguém muito querido, assim. Dando-lhe por fim um último beijo no dia do funeral, na tarde chuvosa daquele triste e ledo 18 de fevereiro, em que eu fui nem sei bem como, absorto, mais que perdido em pensamentos. Alguns dos quais mantenho bem vivos, passados já muitos anos. Sendo que isso foi já há 50 anos, numa conta de saudade entremeada por todos esses anos em que me faz bem lembrá-la. Porque sempre gostei muito da minha avó Júlia. E nunca esquecerei a minha avozinha. 

ARMANDO PINTO
((( Clicar sobre as imagens, para ampliar )))

- Nota de curiosidade: Na fotografia antiga, com marca d' água sobreposta, vê-se por fundo visual a original fábrica MIT do Largo da Longra, estando à esquerda da imagem fotográfica o popular barracão onde funcionavam as oficinas da "fábrica velha" que deu origem à Mit/Metalúrgica da Longra. Cuja extremidade ia até à árvore grande que, após a construção da casa do sr. Verdial e fixação de seu negócio histórico, ficou conhecida por Carvalha da Padaria – ainda existente, mas agora com muito maior porte. (Foto que, de anteriores artigos publicados neste blogue, em 2014 e 2017, foi depois copiada para o livro "Felgueiras: 500 anos de Concelho", à página 150... mas sem a respetiva marca, por certo retirada em arranjo gráfico).

A. P. 

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