Espaço de atividade literária pública e memória cronista

segunda-feira, 20 de julho de 2015

Médicos de renome com ligações felgueirenses


A propósito da existência de médicos célebres com raízes de naturalidade ou afinidade a Felgueiras, recordamos aqui e agora dois artigos que há anos escrevemos e foram publicados no jornal Semanário de Felgueiras, subordinados a temas indicados nos respetivos títulos:

Duas Datas de Dois Factos Memoriais

1855 foi ano de alcance deveras significativo, entre outras ocorrências, de duas datas com relevância para a memória Felgueirense.

Se há efemérides dignas de ser referidas e nunca esquecidas, pelo seu significado simbólico, será esse o caso da data da criação da Comarca de Felgueiras, ou seja, de quando o nosso Concelho atingiu a plenitude da sua composição. Mas não só, também há ocasiões merecedoras de evocação, de serviço à recordação de pessoas e factos, vindo a propósito referir que neste mesmo ano houve igual contagem desde o nascimento do eminente médico psiquiatra Prof. Dr. António de Sousa Magalhães Lemos, distinto Felgueirense.

Ora, durante o mesmo ano, efectivamente, perfez-se a materialização daquela elevação histórica de Felgueiras a Comarca, acontecimento ocorrido em 1855, por decreto de 24 de Outubro. Assim como se passou, em 18 de Agosto, o nascimento daquele grande vulto Felgueirense que foi o Dr. Magalhães Lemos, nascido em Felgueiras.

Indo por partes, e começando pelo relevo simbólico institucional: Foi, pois, a criação da Comarca um facto da maior importância à afirmação concelhia de Felgueiras. (... E passamos adiante, por este tema não vir ao caso, agora, tratando apenas dos médicos.)

Quanto ao segundo tema em foco, é naturalmente aprazível relembrar a natalidade de Magalhães Lemos, personagem cuja naturalidade Felgueirense é patente em estar perpetuado com um busto na fisionomia central da sede do concelho. Nascido em Felgueiras, na freguesia de Margaride, dentro da Casa do Curral, sua memória irradia ainda maior amplitude na actual função de sua casa, transformada em estabelecimento de ensino, onde está instalada a Escola Superior de Tecnologia e Gestão de Felgueiras, tal o funcionamento desde 1999 desempenhado pelo edifício que lhe acolheu o berço natal. Para lá de esse nome ser entre nós algo familiar aos sentidos, por constar da toponímia numa rua da cidade e ainda ter um monumento no jardim do centro de Felgueiras, convirá mencionar, embora numa resenha breve sobre sua prestigiada folha curricular, que o Dr. Magalhães Lemos se distinguiu no domínio da Neurologia e Psiquiatria. Tendo, depois de cursar na Escola Médico-Cirúrgica do Porto (onde obteve o doutoramento com tese “A Região Psicomotriz”), também estudado e trabalhado em Paris com Charcot e Magnan, dois cérebros da ciência neurológica internacional. Depois, a partir de 1911, desempenhou os cargos de professor de Neurologia na Universidade Livre do Porto e director do Hospital Conde Ferreira. Desenvolveu então sua obra principal, escrita em 1912: Curso de Psiquiatria. Mais tarde regeu a cadeira de Psiquiatria na Faculdade de Medicina do Porto (que, então, funcionava junto ao Hospital de Santo António, onde depois esteve a Faculdade de Letras e mais tarde o Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar – pois apenas em 1959, em dia de festa do santo patrono da cidade, passou para o Hospital Escolar de São João). Tendo, Magalhães Lemos, ainda durante sua intensa actividade, integrado o Conselho Médico-Legal e o corpo docente do Instituto de Medicina Legal em Psiquiatria Forense. Foi também sócio de mérito da Academia de Ciências de Lisboa, da Sociedade de Ciências Médicas, do Instituto de Coimbra, sócio da Associação dos Jornalistas e Homens de Letras do Porto e sócio correspondente de diversas sociedades científicas estrangeiras. Teve autoria de uma vasta bibliografia no campo científico da sua acção. Como recebeu condecoração do grau de Oficial de Instrução Pública de França e foi feito Cavaleiro da Legião de Honra.

Considerado autoridade na área da ciência psíquica, teve a honra de ser homenageado, em vida, com descerramento de um busto no salão nobre da Faculdade de Medicina do Porto, aquando se sessão aí realizada em sua homenagem, corria o ano de 1925, presidida pelo então titular da pasta ministerial da Instrução Pública. Desse acto foi publicado um livro de 100 páginas, editado em 1927 pela Empresa Industrial Gráfica, do Porto. Tendo, posteriormente, o Dr. Magalhães Lemos publicado um livro referente a uma dissertação, de “Elogio histórico do Dr. Zeferino Falcão”, em 1929. Em homenagem póstuma, aquando do seu passamento, o “Nobel” Dr. Egas Moniz (1874-1955) dedicou-lhe um elogio escrito, “Professor Magalhães Lemos”, in separata de Lisboa Médica. Após o seu falecimento, ocorrido em 1931, recebeu o Dr. Magalhães Lemos homenagem solene da Misericórdia de Felgueiras, tal qual colocação de retrato no salão da Associação dos Bombeiros Voluntários, de que foi benfeitor e sócio honorário. Anos volvidos, teve mais devido reconhecimento de Felgueiras, com erecção de pedestal público. E, também a título póstumo, no Porto houve atribuição do nome do Dr. Magalhães Lemos a um importante estabelecimento hospitalar psiquiátrico.

Muitos anos depois, continuou a merecer atenções estudiosas, como se nota em alguns exemplos, tal o que escreveu o Dr. Barahoma Fernandes (1907-1992) com escrito de sessão solene em homenagem ao Dr. Magalhães Lemos (pelo seu Centenário), in separata de Anais Portugueses de Psiquiatria, em 1955 e O Médico em 1956, tendo o mesmo especialista também publicado em 1956, in sep. Portugal Médico, uma “Relação da neurologia com a psiquiatria na obra de Magalhães Lemos”. Entretanto, também o Dr. Elísio de Moura (1877-1977), se exprimiu literariamente, em alusivo trabalho “Prof. Magalhães Lemos”, datado de Coimbra em 1971.

Como disse o Dr. José Leal de Faria, na sessão solene da referida homenagem prestada pelos Bombeiros de Felgueiras, «as terras só são grandes, consideradas e conhecidas, quando as qualidades dos seus filhos as inculcam e tornam notáveis».

Dois Vultos da Medicina

Há tempos, ao pousar os olhos em notícias de área distrital, deparamo-nos com dois importantes nomes de ligação Felgueirense, no quadro de honra de uma prestigiada instituição portuense. Tratando-se do percurso histórico do Instituto Superior de Serviço Social do Porto, criado em 1956, no âmbito dos Movimentos de Acção Católica da Diocese do Porto, que presentemente confere formação de bases científicas.

Ora, tendo estado essa actual cooperativa de ensino superior a comemorar então, em 2006, o cinquentenário de fundação da respectiva inicial Associação, veio a público na ocasião algo do seu historial. Tomando-se assim conhecimento, à distância, que no quadro docente desse Instituto, passaram desde 1956 também, entre outros, o Prof. Dr. Fernando Sarmento Pimentel das Neves, em Psicologia e Psicopatologia, como o Prof. Dr. Abel Sampaio Tavares, em Medicina Social.

Estes dois eminentes Vultos da Medicina, com efeito, transportam em seu rasto curricular fortes afinidades e raízes de Felgueiras. Tendo o Dr. Fernando Pimentel das Neves nascido em Rande, embora ficasse registado como natural do Porto, acabando por ser sepultado no cemitério paroquial de S. Tiago de Rande, no jazigo de família da sua Casa da Torre (solar da linhagem de sua mãe e dos famosos João e Francisco Sarmento Pimentel, seus tios). Enquanto o Dr. Abel Tavares (pai), sendo oriundo do Minho, assentou domicílio sazonal em pleno Douro Litoral, na Casa do Souto, da freguesia da Pedreira, concelho de Felgueiras, onde, dividindo com permanência no Porto, passava também temporadas no remanso da verde paisagem Felgueirense, em fase de jubilação da sua prestigiada carreira médico-científica. Mantendo-se então integrado na terra de laços familiares e conjugais, como no caso de participação social que entretanto teve na Cooperativa Agrícola de Felgueiras, onde desempenhou durante alguns anos o cargo de Presidente da Assembleia Geral.

Pois os referidos personagens ilustres do meio, fazem assim parte da honrosa galeria de médicos integrantes na memória Felgueirense, desde o célebre Prof. Dr. Magalhães Lemos, passando por um vasto conjunto de figuras, seja como clínicos, investigadores e professores, naturais ou residentes do concelho, além de tantos que também desempenharam funções e exercem medicina dentro do mesmo território Felgariano. Não sendo possível uma enumeração exaustiva, até para evitar omissão involuntária de quaisquer nomes.

Cingindo-nos, por conseguinte, aos referenciados, será de vincar que, entre uma ampla folha de serviços como a sua, alguns factos merecem ser registados.

Faz parte da História Médica Portuense, por exemplo, que o Dr. Fernando José Sarmento Pimentel das Neves incluiu o Conselho Regional da Ordem dos Médicos de 1950 a 55, fez parte da organização de Cursos de Aperfeiçoamento, como aconteceu por exemplo com o de 1952, em que Pimentel das Neves esteve no grupo representante do Hospital Conde Ferreira, como nos respectivos mandatos iniciados em 1956 e 1959 integrou o Conselho Disciplinar Regional do Porto. Sendo de recordar o que se fixou no livro “Memorial Histórico de Rande e Alfozes de Felgueiras”, que o Psiquiatra Dr. Fernando Pimentel das Neves (n. 1918 - f. 1973) foi Director do Hospital Magalhães Lemos e do Conde Ferreira, havendo ocupado o cargo de Director dos Serviços de Psiquiatria da Região Norte e de Delegado do Instituto de Assistência Psiquiátrica da Zona Norte, bem como de Director do Centro de Saúde Mental do Porto. Publicou diversos trabalhos sobre Psiquiatria, incluídos nos Anais de Psiquiatria, n’O Médico e Actas do Congresso Mundial de Psiquiatria, além de conter artigos noutras prestigiadas publicações técnicas de medicina e da sua especialidade, tal como colaborou também na Enciclopédia Luso-Brasileira de Cultura. Tendo casado em Rande, na sua terra e paróquia de implantação da casa-mãe da tradicional família, repousou depois, para sempre, também em chão Felgueirense, no campo santo da mesma freguesia.

Desenvolvendo um percurso com etapas contemporâneas, o Prof. Dr. Abel José Sampaio da Costa Tavares (n. 1920) constituiu também o Conselho Disciplinar Regional do Porto, eleito em 1959. Consta entre os «anatomistas de carreira» do Laboratório de Cirurgia Experimental do Prof. Hernâni Monteiro (conf. “História da Medicina Portuguesa no Século XX”). Depois de outros desempenhos salientes, mais tarde esteve incluído no núcleo organizador das Bodas de Prata da Ordem dos Médicos, no Conselho Regional do Porto, integrado em comissão que em 1963 realizou importante programa, com saliência para uma Exposição de Artistas Médicos. Incluiu igualmente os Corpos Gerentes de 1971/73 da mesma Secção Regional da sua Ordem, como Delegado à Assembleia Geral. Tendo ainda sido Director do jornal A Ordem, de vinculação diocesana, tem colaboração n’ O Tripeiro, com artigos de articulação historiadora, além de uma vasta produção literário-monográfica. Deste famoso Catedrático, consta seu nome na Base Nacional de Dados Bibliográficos com mais duma centena de publicações, de que é autor e co-autor, desde obras de cariz médico, de investigação, intervenções em congressos, relatórios, estudos culturais, biografias e homenagens a médicos ilustres – cujo conteúdo não podemos aprofundar, por só conhecermos os títulos, nalguns casos mesmo sintomáticos, como “Um retrato com meio século: comentários e saudades”, de 1994.


Armando Pinto

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