Espaço de atividade literária pública e memória cronista

sábado, 7 de fevereiro de 2015

Curiosidade sobre o comboio que passou na Longra…Felgueiras e Lixa.


Na linha do tratamento de assuntos locais, como é norma editorial deste espaço, quanto a vislumbres histórico-culturais, eis aqui, apenas como tal, uma nota sobre material que pertenceu à linha do comboio que passou na Longra…

Como se sabe, foi comemorado em 1914 o centenário do início da passagem pelo concelho de Felgueiras do comboio do Vale do Sousa, da chamada linha férrea de Penafiel à Lixa e Entre os Rios. E, entre as comemorações evocativas da chegada da primeira composição à Longra, a Felgueiras e à Lixa, houve algumas curiosidades então chegadas a público, embora não tanto como a ocasião merecia.

Visto isso, aproveita-se para recordar uma curiosidade que não temos visto publicada, de permeio a outras possíveis.

Ora, uma máquina locomotiva e alguns dos “vagons” que circularam por esta linha, a partir de 1914, haviam pertencido a uma célebre "Máquina" que percorrera a cidade do Porto entre 1878 até, precisamente, 1914.
Pois esse “maquinão” fora «o primeiro "metro de superfície" do país. Tratava-se de uma pequena locomotiva a vapor de dimensões urbanas, devidamente carroçada de forma a disfarçar o seu aspeto ferroviário, que puxava três ou quatro carruagens e circulava em carris pela via pública. Saía da rotunda (da Boavista, no Porto) e descia a avenida até à Fonte da Moura, onde infletia pela atual rua de Correia de Sá e seguia pela Ervilha até chegar a Cadouços (atual largo do Capitão Pinheiro Torres de Meireles) – onde existia uma estação. Daí prosseguia até ao Castelo do Queijo pelas ruas do Túnel e de Gondarém e entrava em Matosinhos pela rua de Roberto Ivens. Com o prolongamento da avenida da Boavista até ao castelo do Queijo em 1914, a Companhia Carris de Ferro do Porto decidiu substituir a "máquina" por carros elétricos que passaram a descer a avenida até ao mar, sendo a antiga linha desativada. O antigo material circulante foi vendido à empresa “Caminho de Ferro de Penafiel à Lixa e Entre-os-Rios”, continuando a funcionar durante anos...»

(Informação recolhida em “Porto Desaparecido”)

Armando Pinto

quinta-feira, 5 de fevereiro de 2015

Imagens históricas do tradicional Carnaval da Longra


Aproxima-se mais uma edição do cortejo folião e restantes números carnavalescos, que fazem do dia de Carnaval sempre um acontecimento apetecido da região.


Remonta já ao ano de 1997 o início organizativo do chamado Carnaval da Longra, desde que começou a ser organizado oficialmente o Corso Carnavalesco e o Enterro do Entrudo, na então povoação e depois vila da Longra. Primeiro através de organização da Direção e Grupos da Associação Casa do Povo da Longra, desde 1997 até 2003, e a partir de 2004, já com a Longra como vila, incluindo então parceria com as Juntas das freguesias da mesma vila.

Desse assim já tradicional evento, que vai portanto nos seus 19 anos de organização consecutiva, recordamos aqui alguns momentos de seus primeiros anos, através de imagens que fizeram história e lhe dão aquele cunho folgazão, constante das memórias etnográficas do acontecimento tão lembrado.

Armando Pinto

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domingo, 1 de fevereiro de 2015

Coisas nossas, de Felgueiras... e à Porto!


Refleti eu ainda há dias, na mais recente crónica escrita no jornal Semanário de Felgueiras, sobre o que nos faz sentir Felgueirenses, a propósito da tal máxima “Je suis”, referindo que até valorizamos a presença duma moça felgueirense na televisiva Casa dos Segredos. 

Assim, aflorou-se, naquele espaço jornalístico: “Tanto que quando surge, para além do horizonte daquém de nossos montes, vulgo fora de portas ou até ao longe, qualquer coisa que seja de Felgueiras, logo afilamos as atenções. Como aconteceu quando se soube que estava uma felgueirense num programa televisivo, daqueles ditos de vida real, vulgarmente chamados “Reality shows”, de causar audiências ao nível de canais televisivos do espaço portuga. E, mesmo entre quem não seguisse aquele espetáculo diário de pessoas à procura de fama, na ideia de possibilidade dum futuro publicitado, houve mais mediatização no resultado e foi interessante saber-se que a vencedora foi essa felgueirense. O que, afinal de contas, desta feita alterou a tendência, visto tal conterrânea concelhia ter levado o nome de Felgueiras bem longe, por motivos mais sociáveis.”

Apenas sabíamos então que essa jovem, concorrente ao referido programa da TVI, era uma simpática felgueirense. Por sinal bonita, mas que não conhecemos pessoalmente, por nunca a termos  visto, que nos lembre. Mesmo porque a sua localidade de residência, segundo ouvimos, é na povoação da  Serrinha, da freguesia de Santão, num extremo do concelho de Felgueiras, ainda relativamente distante da Longra, portanto. Soubemos agora que também é Portista. O que até parece que adivinhávamos, sabendo que as mulheres mais bonitas, aqui para o autor destas linhas, são Portistas. Como relacionamos ao caso da Elisabete Moutinho. Ah, da qual até o nome, logo fazendo lembrar a maçã madura do João Moutinho, é à Porto!

Não nos interessa, para o caso, nada mais, nem sequer em relação à parte promocional. Tão só nos detemos no facto em si.

Ora, por imagens captadas na Internet, soubemos que a Elisabete Moutinho esteve no estádio do Dragão, a assistir ao jogo da equipa principal do F C Porto neste domingo dia primeiro de Fevereiro. Motivo que, com a devida vénia, das postagens colocadas na sua página oficial do facebook, nos leva, com orgulho e honra, a colocar aqui uma alusiva "reportagem " visual dessa sua presença no local dos sonhos, como uma das nossas – tal é agora conhecida essa adepta Portista e Felgueirense!

Armando Pinto

sexta-feira, 30 de janeiro de 2015

Sendo por Felgueiras… em mais um artigo no SF


Somam-se os casos de carência interessante entre as ocorrências que dão sal à vida, nos dias que correm, derivado sobretudo à crise provocada pelos erros monetários das ligações políticas e pela perda de valores político-sociais e  consequente trespasse afetivo, a juntar ao abatimento social que se tem acentuado.

Como tal, a escrita atual não pode abstrair-se dessas realidades. Tanto como, sem necessidades de muitas explicações, se desenrolou o tema que desta vez desenvolvemos em mais um artigo, da nossa colaboração publicista, com lugar no jornal concelhio Semanário de Felgueiras.

Eis aí a respetiva coluna, impressa na página 12 do número do SF desta sexta-feira, dia 30 de Janeiro;  e de  seguida o texto normal – para registo e leitura, a bem do cunho Felgueirense genuíno e dos Felgueirenses interessados:

(((Clicar sobre a imagem do recorte digitalizado, para ampliar)))

Je suis Felgueiras

A frase JE SUIS… andou por muito lado, a dizer que todos eram Charlie, como se sabe. Traduzindo apelo à liberdade, a propósito dos trágicos acontecimentos recentemente ocorridos em Paris, devido aos condenáveis ataques ao jornal francês Charlie Ebdo, de cujos atos resultaram mortes físicas e morais à liberdade de imprensa e opinião. Passando a ser uma máxima atual o derivado conceito de que todos somos qualquer coisa, como afirmação de apoio.

Como tudo o que se passa no miolo da Europa acaba por cá chegar, qual nuvem passageira, transpondo a um campo que nos relaciona mais, o pensamento voa por assuntos da naturalidade local, de que todos fazemos parte. Podendo então dizer-se que todos somos Felgueirenses; e, quanto ao resto, tudo o que é de cá, nosso, destes lados, é “Made in Felgueiras”.

Noutros tempos, sem estrangeirismos, aqui pelas nossas bandas, em vez de se dizer assim, somente, o povo comum tomava o todo pela parte e era costume acrescentar-se por ou pelo, conforme o facto – como no caso do futebol popularmente dizíamos… somos pelo Felgueiras. Mas também pelo nosso clube predileto nacional, representante de nosso distrito ou região, pela nossa freguesia, pelo nosso país. Pelo telurismo que estava impregnado em todos os que se sentiam felizes com suas raízes.

Ora hoje em dia, com as leviandades políticas recentes, já se perdeu fidelidade de afinidade à freguesia, natal ou afetiva, pois até em documentação aparece ou um monte de nomes para denominar um sítio apenas, ou então simplesmente o nome da primeira freguesia que foi escolhida pelos responsáveis dentre as amontoadas a esmo… e quase ninguém se sente ligado a qualquer circunscrição, dessas tais agora de tudo a monte e fé ao calha, em uniões fictícias, até mais ver.

Nesse prisma, vem a talhe, por extensão de convicções, aquele sentimento tido por bairrismo, contudo muito mais abrangente ou expansivo e que ainda se sente nalgum interesse por afinidades que nos são comuns. Tanto que quando surge, para além do horizonte daquém de nossos montes, vulgo fora de portas ou até ao longe, qualquer coisa que seja de Felgueiras, logo afilamos as atenções. Como aconteceu quando se soube que estava uma felgueirense num programa televisivo, daqueles ditos de vida real, vulgarmente chamados “Reality shows”, de causar audiências ao nível de canais televisivos do espaço portuga. E, mesmo entre quem não seguisse aquele espetáculo diário de pessoas à procura de fama, na ideia de possibilidade dum futuro publicitado, houve mais mediatização no resultado e foi interessante saber-se que a vencedora foi essa felgueirense. O que, afinal de contas, desta feita alterou a tendência, visto tal conterrânea concelhia ter levado o nome de Felgueiras bem longe, por motivos mais sociáveis.

Pois Felgueiras, afinal, também tem sua marca, de gente laboriosa, nos mais diversos aspetos. Conforme é bem sabido, desde a produção de calçado ao doce pão de ló, mais seus usos e costumes, agora já pouco vincados, etc. e tal. Porém, e esse é um dos pomos da questão, deve haver respeito pelo que é mesmo felgueirense. Repare-se, a título de exemplo, na salvaguarda da memória coletiva, no caso da autenticidade etnográfica que tem sido preservada através das coreografias dos ranchos folclóricos, felizmente. Contudo, não se entende, por exemplo, quando acontecem desvirtuamentos; como, por exemplo, se num grupo folclórico felgueirense aparecer um traje feminino de branqueta, à poveira; sabendo-se que nesta região imperavam as cores e não uma tonalidade só, nos trajes acotiados. Tudo tem seu quê e porquê. Daí que quando se vê por cima do casario da sede do concelho uma branca torre se associa à igreja matriz, e mais adiante duas torres cimeiras dum edifício mentalmente nos faz visualizar o palacete da Casa das Torres, como ao cimo, por entre o arvoredo do monte sobranceiro, aquela torre diferente com seu gradeamento no cume logo nos transpõe até santa Quitéria…

Para alguém se sentir bem é necessário haver sedução, como quem diz que o ambiente conta muito, importando haver propriedade, de modo a todos sentirmos estar no que é nosso, entre os nossos. Haja então verdade, em podermos ser felizes tendo raízes.


Armando Pinto

terça-feira, 27 de janeiro de 2015

RECORDANDO: Uma inspeção do famoso Fontinha ao Posto Médico da Longra


Dizem-me os meus quase quarenta anos de serviço público que a distância delapida melhor um percurso de vida.  Embora,  tal como quando se constrói uma casa, nossa, ao findá-la é que se devia estar a começar, para melhor aproveitamento; também ao findar uma carreira, no caso profissional, se fica a entender determinadas situações e a conhecer melhor as pessoas.

Ora, passando adiante disso, por ora, fica porém o sabor dileto dos bons momentos. Como de tanta peripécia vivida no decurso do emprego mantido no Centro de Saúde da Longra, desde o inicial Posto Clínico da Casa do Povo, até ao Centro de Saúde, que popularmente sempre foi e será o Posto Médico. Daí que durante muito tempo eu fosse conhecido, primeiro por Pinto da Casa do Povo, e mais tarde por senhor Pinto do Posto Médico…

Pois então, no meio de infindáveis e engraçadas situações (a par com horas lixadas, que mexeram com um tipo, por mais calmo que fosse!), houve uma situação que não mais esquece. Passada com um antigo inspetor da entidade distrital de saúde, dos Serviços Médico-Sociais do Porto, a que estavam ligadas as unidades, quer no tempo em que se incluíam nas Casas do Povo, quer mais tarde na anexação ao serviço nacional. Sim, num tempo que dava para haver funcionários a fiscalizar as funções de outros, vindo então certos fiscais administrativos, por assim dizer, desde o Porto, para ver e passar a pente fino as escritas, como se dizia, dos chamados postos médicos. Sendo à época muito temido (na boca de colegas mais antigos) um senhor conhecido por Fontinha, algo rígido, mais pela sua sisuda postura, além de ser muito exigente e minucioso na examinação das papeladas. José Fontinha, de nome mais completo, como assinava por fim os relatórios (embora nos registos biográficos apareça publicado Fontinhas, porém sempre foi mais conhecido por Fontinha, enquanto ele nunca ripostou a esse tratamento). Mas que, como alguém dissera e passamos a saber, se tratava de um poeta conhecido por um outro nome, Eugénio de Andrade, conforme o pseudónimo que escolhera para a autoria de suas obras literárias.

Daí que se entenda uma passagem dum seu livro:

«...Sou um homem que nunca fez da poesia uma carreira. Passei trinta e cinco anos a fazer inquéritos e processos disciplinares, sem o menor gosto mas com grande sentido de responsabilidade, e escrevi a poesia de que fui capaz nas horas que me deixavam livres a profissão de inspector de uns serviços do Ministério da Saúde, que ainda aí estão, cada vez piores, ao que consta ...» - Eugénio de Andrade (1923-2005), in “Poesia e Prosa”.

Pois sim, mas a quem o aturava, nas vezes em que ele aparecia no local do nosso emprego, não havia poesia nos contactos cara a cara. Não dando muito uma coisa com outra e, a quem conhecesse suas composições poéticas tal não diria que eram dele, muito menos quem estivesse a leste perceberia como podia ele ser um vate na matéria. Apesar disso, pessoalmente eu até simpatizei com ele e nunca tive queixa. Aliás, por das poucas vezes que trocamos algumas palavras, uma ocasião se ter proporcionado para ele se aperceber que eu tinha certa simpatia pela literatura, deu para, passados anos, ele me ter autografado um livro, que mantenho com apreço – apesar de eu nem ser muito apreciador de poesia livre, quase sem rima, mais voltado sempre a melodiosas rimas declamadas.


Enquanto isso, o que via com o Fontinha, nas suas vindas ao Posto Médico da Longra, dava para espairecer o pensamento, por estar sempre a estudar o ambiente derivado e fazer analogia dum quadro situacionista ao outro facto. Mas pude presenciar ocorrências divertidas, quase cómicas, para não dizer mais.

Aconteceu de uma das vezes, quase no início da minha carreira profissional, uma dessas tais. Estando ainda a trabalhar lá, na parte médica dos serviços da Casa do Povo local, o senhor Gomes, da Pedreira, um simpático senhor já idoso, pois acumulava esse emprego com uma reforma (aposentado que era dum emprego que antes tivera em Lisboa e, ao regressar à região natal, conseguira esse extra para aumentar o vencimento mensal). Chefiava o Posto o senhor Cunha (Agostinho Cunha), trabalhando em secretária ao lado o sr. Luís (também Cunha), como se sentava mais à frente a D. Emília Costa (esposa do antigo funcionário sr. Jaime). E, entre nós, contando comigo que era o mais novo no serviço, trabalhava também como novato o Miguel. Então ainda jovem despreocupado, nada parecido com o mesmo Miguel Lemos que passou muitos anos no próprio Posto da Longra, que chegou a chefiar mais tarde. Por isso, numa das fiscalizações que o Fontinha estava a vasculhar, calhou do Miguel ter de dar conta duma das suas funções, ele que nesse tempo tinha a seu cargo a correspondência postal e por conseguinte os respetivos registos, de envios e gastos de selos. E o senhor Luís Gomes, a fazer serviço de retaguarda, como hoje se diz, andava mais ao brejo, em trabalho de terreno, de um lado para outro.

Então o Miguel, para o Fontinha o não apanhar desprevenido, antes de ele ir ver os livros e as pastas, fartou-se de tentar pôr tudo em ordem, tim tim por tim tim, e como pensou que lá estavam selos a mais, não coincidindo nas suas apressadas contas os selos registados com os que restavam, tratou de esconder os que pensou estarem a mais. Só que o tal Fontinha, fuinha como era, escarafunchou por todos os lados das parcelas e não é que descobriu que as contas estavam mal, faltando uns tostões na soma das verbas…?! E, de imediato, diz-lhe de chofre:

- vá, jovem, isto está errado. Ponha já aqui a diferença. Tire lá o dinheiro de sua algibeira, e reponha o que falta, ora vá… (deixando o Miguel de boca aberta, muito admirado e de testa franzida, por nem saber muito bem a que propósito vinha isso da algibeira… enquanto nós, sufocando o riso entre dentes, nos divertíamos com a reação do Miguel ser obrigado a pôr de seu bolso a “massa”, apesar de se tratar duns trocos…)

Entretanto, estavamos nesse pé, quando entra o senhor Gomes na secretaria, esbaforido, a arfar pela caminhada de ter ido ao correio, onde levara cartas à estação do Correio da Longra. Com sua barba por fazer, como era costume dele, vendo-se-lhe a cara com brancos pelos da barba de pelo menos uns dois dias sem ter sido cortada. Estava-se nos primeiros anos após o 25 de Abril, mas ainda havia resquícios de outros tempos, quando os funcionários públicos eram obrigados a apresentar boa aparência. Então, mirando-o de cima a baixo, o senhor Fontinha dispara:

- Ó homem, o ordenado não dá sequer para lâminas? Como pode andar aqui com esse aspeto?

Todos ficamos à espera do que ia sair. Ao passo que o sr. Gomes, desculpando-se, ripostou, a tossir no seu catarro de fumador (como quem diz que nem tinha tempo, por morar longe, o que nem era muito o caso, de permeio com sua linguagem de português arcaico):

- Ó, ohhh, ora, ora, se eu saio de casa de noute e entro de noute…

Todos afilamos os sentidos, à espera de mais uma reprimenda. Mas eis que o Fontinha, poeta como era, e apreciador da linguagem clássica, teve então um remate épico, todo apreciativo e muito sensível…

- Noute... muito bem dito. Sim senhor. É assim mesmo. Esse português até me enche o peito. Noute... muito bem dito! (Foi repetindo com trejeito de apreço. Quão até esqueceu a esquálida aparência do senhor Gomes.)

Num baque, lá ficamos todos a olhar uns para os outros. E mal ele se foi embora, logo que o Fontinha nos deixou em paz, nos fartamos de rir com aquilo. Tanto que ficou para sempre entre engraçados ditotes memoriais, nas nossas recordações do tempo passado na secretaria da Casa do Povo da Longra.

ARMANDO PINTO


(Texto dentre o material a incluir possivelmente num futuro livro, planeado.)

segunda-feira, 26 de janeiro de 2015

Um artigo interessante


Com carradas de razão, veio publicado na página de Cultura do jornal Voz Portucalense, da Diocese do Porto, um artigo cujo teor dispensa muitas explicações.

Com a devida vénia, reproduzimos aqui essa peça jornalística, através de digitalização, por ter sido inserida num espaço de cultura, do órgão diocesano da nossa região.

Nesta época em que o país tem estado, como se costuma dizer, "entregue à bicharada", a valer quase tudo, nem é de admirar o que acontece quando se retira duma rua o nome dum personagem importante da história não muito distante da nação, quase por dá cá aquela palha... mas, mesmo assim, achamos de todo o interesse alguma reflexão no que vem expresso no referido texto.



A P

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terça-feira, 6 de janeiro de 2015

Tempo de Janeiras e Reis


Passada a quadra de Natal, ao chegar-se aos Reis, pelo dia seis de Janeiro, é tempo de alagar o presépio, como se diz popularmente. Com o desfazer daquela construção caseira a servir de final da época do encanto natalício.  Mas o início de ano, no calendário festivo anual, alonga-se pelo primeiro mês adiante, com os tradicionais cantares das Janeiras, canto que a partir do dia seis passa a ser chamado dos Reis.

Assim sendo, ultrapassados os festejos natalícios, comido o bacalhau e as batatas da consoada, com a árvore decorativa a representar como que uma réstia do antigo cepo que ardia nos adros das igrejas em noite de missa do galo, e com a passagem de ano, tempo de beijar comunitariamente ainda os pés do Menino no fim das missas, chega a vez das Janeiras e complementares cantares dos Reis. Costume de influência importante noutras eras, teve formas variadas conforme as terras, por esse país fora, e também no nosso ambiente concelhio. Maneira essa de convívio que mais não é que um velho uso, deveras misturado num apego religioso revestido com sabor popular, vulgo pagão.

Segundo estudiosos eminentes da matéria, do que fomos lendo algures e anotando há longo tempo, essas reuniões de grupos de amigos, familiares e vizinhos, que iam às portas uns dos outros entoar as “boas entradas”, é uma usança derivada das “Saturnais”, festas clássicas celebradas pelo povo romano e romanizado em honra de Saturno, festividade relacionada com os segredos da crença popular comum à agricultura. Folganças aquelas realizadas por alturas das calendas de Janeiro e com a particularidade de que durante tal período desapareciam as distinções sociais.

Na antiguidade, conforme ainda algo que chegou transmitido através de alguns estudos historiadores, reuniam-se ranchos de gente, formando grupos de cada lugar ou famílias, os quais a partir da noite de ano novo percorriam as casas das pessoas mais gradas a desejar-lhes as boas festas, juntando-se por fim todos os da mesma freguesia num local tradicional, normalmente no adro ou proximidade da igreja paroquial, acabando ao calor do que restara do tronco da fogueira de natal a cantarem, ora ao desafio ou todos juntos.
A respectiva campanha, conforme a definição mais conhecida, é efectivamente uma tradicional manifestação de cultura popular de origem pagã, consistindo em reunião de grupos de pessoas que, no início de Janeiro, percorrem uma região, à noite, cantando pelas casas, ao som de instrumentos tradicionais de música, e desejando às pessoas conhecidas e amigas um feliz novo ano, por via de quadras de sabor popular. Tal como as Janeiras são “cantigas de boas-festas por ocasião do Ano Novo”. A propósito de Janeiro ser o primeiro mês do ano, sendo assim chamado em honra do deus Jano (de janua = porta, entrada). Uma outra ideia relacionada, pois Jano era como que um porteiro celestial, e, consequentemente, qual deus das portas, que as abria e fechava, esperando-se a sua protecção na partida e no regresso. Tido assim por um deus dos começos, Jano era invocado para afastar das casas os espíritos funestos. Fundamentando-se, por isso, que esta manifestação tem origem em cultos pagãos, que o cristianismo não conseguiu apagar e se foram transmitindo de geração em geração. Por extensão, a versão religiosa cristianizada das Janeiras é o cantar dos Reis, desde 6 de Janeiro.

Com o decurso dos tempos surgiram transformações desse hábito, das Janeiras e Reis, por via de que resultaram particularidades diversas. Passou a associar-se cambiante de convívio mais restrito, com esse canto nocturno de porta em porta, dando vivas às pessoas das casas visitadas, a ser recompensado por meio de qualquer espécie alimentar, sendo depois essa angariação repartida por todos os participantes em folguedo final conjunto.

A partir da noite de Reis, depois da ceia tradicional, que nalgumas freguesias do concelho de Felgueiras, pelo menos, metia arroz de feijão branco acompanhado de rodelas de paio, começavam então as Reizadas, seguindo o mesmo ritual, apenas com adaptação da letra entoada ao som dos instrumentos musicais mais acotiados.

Sendo estes cantos efectuados por grupos de mulheres e homens adultos, acompanhados por rapazes e raparigas jovens e por vezes também por crianças, em anos não muito distantes passaram a ser levados a efeito mais por jovens e crianças, com o fito de receberem donativos, conhecidos por “esmola”.

Tal tradição tem sido preservada nos tempos mais recentes, sobretudo, pelos Ranchos Folclóricos e outros grupos institucionais, com o propósito de angariação de receitas para a sua sobrevivência, em vista à manutenção anual associativa, ou por comissões e agrupamentos organizados como recolha de fundos para qualquer iniciativa de interesse público.

ARMANDO PINTO

(Texto publicado em crónica no Semanário de Felgueiras há alguns anos e, com algumas adaptações, reservado para um possível livro futuro)