Tal como no título se levanta o véu, reporta ao sentido do livro "Ciclistas de Felgueiras", já muito proximamente a chegar, o que se verteu em mais um artigo da normal colaboração no jornal Semanário de Felgueiras. Desta vez com lugar na edição da sexta-feira 21 de fevereiro, à página 10.
Coisas de gosto
Uma vez... Há já uns anos bons, uma minha sobrinha, que
cresceu praticamente cá em casa, me disse um dia: - É de ti que eu gosto! Ela
tinha ido tomar uma vacina ao Centro de Saúde, e como eu trabalhava lá estava
com ela quando a enfermeira lhe aplicou a dose; então instantaneamente ela, que
aí teria coisa duns dois anitos, me abraçou, como que dizendo não ter gostado
nada daquilo, e agarrando-se a mim me diz: - É de ti que eu gosto. Outra vez...
Muito antes disso, não me esquece mais, em tempos que nos hospitais ainda não
deixavam nenhum dos pais ficar a acompanhar as crianças internadas, aconteceu
que o meu filho, ainda muito pequenino, teve de ficar no hospital de crianças
no Porto para uma intervenção e por isso lá passou uma noite (que foi das
piores noites que nós os pais passamos); e na manhã seguinte, mal pudemos,
corremos para o ir buscar, tendo ele quando me viu se atirado para meus braços
a suspirar: - ó pai! Depois disso tudo, anos volvidos, quando minha filha foi
estudar para longe, tendo ido para Lisboa, a primeira vez que veio a casa, não
mais me esquece, quando ambos nos abraçamos nem foi preciso dizer nada, eu
soube, como sabia, quanto nos queríamos. Tanto como sempre que ela vem a casa,
agora já com meu neto também e meu genro, nossos olhos dizem: - Eu gosto de ti!
Bem como com os outros netos, que vejo mais vezes por andarem por aqui à beira,
quando os abraço é como que aperto tudo quanto é isso de gostar fortemente de
alguém. Entre tantas e diversas situações, além de momentos e afetos
particulares que guardamos bem no íntimo.
Também é assim, salvo as devidas diferenças de sentidos e
afetos, que gostando do rincão natal gostamos de recordar coisas boas que
existiram e fazem parte da nossa história ou da história comum a muito do que
nos rodeia. Mas porque temos memória, senão quando desaparecer o disco cerebral
onde isso está gravado, se não houver transmissão, ninguém mais lembrará isso.
Assim também em gravações mentais que perduram cá, vêm à ideia aspetos antigos da antiga vila de Felgueiras, da célebre pérgula do jardim e do largo das árvores onde paravam as conversas da praça. Como ainda, veio-me um destes dias à cabeça, a fábrica da manteiga que existiu na quinta da vacaria da Longra, do tempo do Conselheiro de Rande, onde em épocas de sucessores era servido leite a quartilho à clientela; e, como tal, então em criança ali eu vi potes de louça fina que lá restavam, mais maquinaria e mobiliário do fabrico de laticínios, de aspeto clássico. Coisas que se perderam, por não ter havido gosto de preservação. E aquelas oficinas de ferraria à maneira antiga, com forjas e bigornas, entre lojas antigas de ofícios tradicionais de tempos idos. Por entre outros possíveis exemplos. Algo que em Felgueiras tem sido recorrente deixar perder, a passar no andamento do tempo que voa e não volta. O que faz lembrar amiúde a necessidade de haver na sede do concelho um museu felgueirense que abarque a memória concelhia. Havendo ainda desconhecimentos e desconhecedores.
Assim também em gravações mentais que perduram cá, vêm à ideia aspetos antigos da antiga vila de Felgueiras, da célebre pérgula do jardim e do largo das árvores onde paravam as conversas da praça. Como ainda, veio-me um destes dias à cabeça, a fábrica da manteiga que existiu na quinta da vacaria da Longra, do tempo do Conselheiro de Rande, onde em épocas de sucessores era servido leite a quartilho à clientela; e, como tal, então em criança ali eu vi potes de louça fina que lá restavam, mais maquinaria e mobiliário do fabrico de laticínios, de aspeto clássico. Coisas que se perderam, por não ter havido gosto de preservação. E aquelas oficinas de ferraria à maneira antiga, com forjas e bigornas, entre lojas antigas de ofícios tradicionais de tempos idos. Por entre outros possíveis exemplos. Algo que em Felgueiras tem sido recorrente deixar perder, a passar no andamento do tempo que voa e não volta. O que faz lembrar amiúde a necessidade de haver na sede do concelho um museu felgueirense que abarque a memória concelhia. Havendo ainda desconhecimentos e desconhecedores.
Ora, enquanto não há preservação física de tanta coisa,
resta o que tem ficado escrito. Entre cuja colaboração, tem aqui o autor,
dentro do possível, procurado dar alguma contribuição. Desde parcelas
historiadoras, até biografias e outras lembranças. Como agora, dentro de pouco
tempo, ficará em mais um livro registado algo que, embora podendo ser
desconhecido de alguém, merece ser guardado na memória coletiva. Pois, tal como
nem só de pão vive o homem, também na memorização tudo tem lugar, não apenas os
personagens de cargos públicos e heróis nacionais, mas também os que se
salientaram nos mais diversificados campos da atração social. Entre coisas que
alguém gostou. E, como em tempos gostamos de ver desenhos oferecidos por nossos
rebentos em dias de pai e mãe, também como filho desta terra gosto de ofertar
algo sincero, dando desenhos feitos de memórias escritas para sempre
recordar.
Armando Pinto
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