sexta-feira, 30 de dezembro de 2016

Livro Particular, para Familiares: "Torrente Escrita – Em Contagem Pessoal"


Como oferta especial de Natal, na presente fase da vida, publiquei um pequeno livro que escrevi e dei nesta quadra  natalícia de 2016, como oferta pessoal à família (filhos e parentes mais próximos, apenas), ou seja de edição restrita. Sendo autobiográfico, ao género de memórias resumidas, como testemunho aos filhos e netos especialmente, qual mero exercício de transmissão na primeira pessoa. Em cuja descrição refiro o que mais representa para mim na existência entretanto vivida, de quanto me lembro de sentir e quão me recordo em tal percurso partilhado ao correr dos sentimentos, entre algumas curiosidades e factos relacionados.

Por a respetiva edição privada de autor ser de publicação limitada, restrita a pouco mais duma dúzia de exemplares (mais um outro dos que normalmente ficam no acervo da Biblioteca Municipal de Felgueiras, de oferta pessoal também), sendo mais precisamente de 15 exemplares, tão só, deixo aqui o mesmo texto para eventuais interessados - sem fotos naturalmente, pelo cunho personalizado que contém…

Assim, eis o texto original do livro (começando pela correspondente capa):




Torrente Escrita
– Em Contagem Pessoal

2016


Edição de autor, em tiragem restrita de 15 exemplares, numerados e autenticados com rubrica autógrafa do autor.

Nº --
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Torrente Escrita – Em Contagem Pessoal

A vida decorre por anos adiante, em ampla vivência. Numa imensidão a combinar de par em par, como o céu e o mar conciliam em tonalidade, a refletir azul brilhante, aprazivelmente. Na corrente que em tantos anos passou rio abaixo pela Longra, e chegou até ao oceano do que fui escrevendo, quanto aqui e agora coo e deixo fluir, qual torrente descritiva.

Revendo mentalmente o percurso coado, relembro como, na sequência de quando minha mãe me sussurrava ao ouvido orações, por entre a missa na igreja de Rande, me ensinou a orar. Daí, a partir da infância me habituei a pedir nas orações pela minha família, orando pelos meus pais, irmãos e por minha avozinha, tal como homem feito comecei a ter minhas intenções com desejos de que tudo fosse bom para a minha família contando já com a esposa e filhos. Ao passo que agora, com a idade madura, estão nos meus pensamentos mais ternos também as famílias dos meus filhos, contando os meus netos e também genro e nora, como que desejando ver ainda tudo quanto for possível.

Ao folhear as páginas dos muitos álbuns fotográficos que fui fazendo e hoje são já preciosidades do património familiar (numa herança sentimental que tenho gosto em deixar aos meus descendentes), ao olhar para o que ficou para trás, claro que gosto de rever fisionomias e situações, factos e paixões, sentindo alguma nostalgia própria pelo tempo que passou. E até gostaria em parte que o tempo tivesse parado em certas alturas, quando ainda usava bigode e os meus filhos eram pequenos, eu e minha esposa eramos jovens com pensamento ainda distante da idade atual… Porém, não gostaria de voltar atrás, na realidade, pois ainda não tinha ideia do que seria ter netos, ainda não podia sentir o que é ter apertados a mim os meus meninos. Nem sabia ainda que ia conseguir ter uma família como a que tenho – uma família bonita, como dizia o meu pai também da dele, e obviamente minha.

Ora, o que passou deverá ficar no conhecimento familiar, porque a família é um bem. Passando a contar daqui para a frente o que somos, com o que temos. Daí assim o que se vai seguir.

Acostumado a escrever sobre tudo e todos, normalmente sobre os outros, como se costuma dizer, desta vez isto é respeitante ao próprio, referente a mim. Na primeira pessoa. Sem qualquer ponta de expor história com conta e medida, mas tão só de deixar anotada uma contagem pessoal, a quem interessar. E, deixando de lado qualquer esgar de fazer boa figura, através duma narração segundo os cânones, no plural, desta feita é em nome próprio, por ser para familiares e amigos, para quem ler e se interesse, de maneira a tentar deixar algo escrito do percurso pessoal. Discorrendo duma vida com os pés e o coração na terra.

Escrita esta particular, deste modo, com mais sentido, porque diz respeito a tudo o que mais quero. Tal como em casa, no ambiente familiar, gosto mais de ter nas paredes quadros que me digam algo, em vez duma decoração sem nos dizer respeito, só para dar colorido ou parecer bem.

E cá estou, assim.

Olha eu com meus netos, um em cada braço, enlaçando nossos braços, e outro prestes a chegar (mais algum ou alguma que também ainda venha), estando assim a presenciar o presente, com olhos rentes a um passado que tornará possível o futuro. Parecendo ainda ver os meus filhos anos atrás, crianças bonitas como agora os seus e meus rebentos, que até apetece abraçar no tempo, juntando coração com corações, bem próximos e apertados.

Os meus netos ao nascerem, bem bonitos, como vi logo nas primeiras horas, parece que tinham parecenças das variadas proveniências, segundo fui ouvindo. Um tinha isto, outro aquilo, um e outro parecendo-se com este e aquele, isto e aquilo, ou esta e aquela… enquanto eu, pensava para mim, deixando toda a gente falar à vontade, que bem podiam estar assim convencidos, mas ali havia muito de meu. E há. Como se nota em quanto nos sentimos apegados. Tal como gosto de os ter juntinhos contra meu peito e eles gostam de estar ao meu colo, quão e como era quando andei com meus filhos ao colo e levava pela mão o meu menino e a minha menina. Quanto salta à memória e os vejo à luz do pensamento: Olha… como parece que ainda os estou a ver, de sacola e lancheira, quando os levava à escola, às “freiras do Unhão”, e os ia buscar ao fim da tarde logo que saía do emprego, primeiro no nosso Fiat 124 azul e depois no Renault verde-acinzentado, dos carros sempre em segunda mão (até talvez mais) que fui tendo. 

O tempo passa, mas não passa o que se viveu. Permanece em nós. Como lembro como gostei quando o Nuno me ofereceu um Dragão, uma escultura do Dragão Portista, e, como a irmã era pequena, ele comprou um quadro atrativo com o emblema do Porto para eu receber das mãos dela, em dia de meu aniversário. Tal como gostara anos antes quando a minha namorada me ofereceu um estojo como primeira prenda, também pelos anos… não pela oferta física, mas por quanto já queria dizer. E veio a dizer pela vida adiante. Como de ver a Clara organizar com gosto programas para fazermos em família, em dia de nossos aniversários e mais… Por isso não se pode deixar perder essas e outras ternas e eternas lembranças, quando se pode passar ao papel quaisquer apontamentos capazes de fazer perdurar o tempo do que sentimos. Que é o que aqui procuro deixar, legando algumas referências. Entrado que estou no rol sexagenário, já no passar além da conta da idade dos 60. Mais precisamente com 62 anos, ao publicar isto.

Assim sendo, eis aqui uma oferta pessoal às pessoas de quem mais gosto. Enlaçando meu mundo nestas linhas.

Isto será uma forma de contar aos filhos, mais aos netos e gerações futuras, uma história de vida, normal, mas particular. Para que não aconteça como a mim que, apesar de sempre ter procurado saber tudo, guardando comigo o que ia apreendendo, há muita coisa que já não conseguirei mais conhecer de meus antepassados mais marcantes, dos que conheci, ou seja sobre a minha avó Júlia, e sobre o meu avô da Quinta, falecidos ainda durante a minha adolescência. E muita coisa terá faltado falar, para saber mais, sobre meu pai, bem como quanto a curiosidades da vida de minha mãe, até sobre meus tios mais chegados. E por aí adiante.

Extensivamente isto também servirá para pessoas amigas e conhecidas poderem para sempre recordar afinidades, dos momentos da existência partilhada.

No contexto, aproveito para intercalar algumas histórias contadas, ao género de narrativa, como ilustração momentânea de intermeio. Cujos motes obrigarão, em vez de leitura apressada de esguelha, na diagonal como é costume dizer, a ter mesmo de se correr o texto duma ponta à outra.

Efetivamente, no percurso de vida, a memória é como em certa medida uma máquina fotográfica capaz de captar imagens dignas de permanecerem no cérebro. Tendo eu, por sinal, um gosto especial por tirar retratos, desde pequeno. Apesar de ter hoje pena de não haver fotografado minha avozinha em seu leito, por então ser pequeno. Mas depois, com a evolução da idade, já pude ir fazendo retratos de família e mais, com as muitas máquinas que fui conseguindo ter ao longo do tempo.

(foto) = Máquinas de uma vida ou a vida em máquinas! =

A vida não é como devia ser, mesmo. Porquê? Porque murcham e morrem as flores? Como gosto de flores vivas, quase falando com o que plantei, em meu jardim, não gosto de ver as flores, que embelezam o relvado de minha casa, a murchar… e logo anseio o seu florir, na renovação da natureza. E então detesto ver árvores a secar, entre as que plantei nomeadamente, restando algumas ainda das que eram dos tempos iniciais de casa, companheiras dos dias passados em nossa casa.

Por conseguinte, escrevo aqui de seguida o que me lembro, para o caso, abrindo a mala de minhas recordações, numas regrazinhas escritas ao sabor da recordação. Mais para quem faz parte do meu e nosso círculo particular e familiar, a quem naturalmente percebe a importância destes afetos personalizados. Com quem em dias especiais e pela vida continuamos a brindar e a sorrir à nossa… e ao que ela nos reserva. Tudo com natural ponta sentimental, duma saudade não nostálgica mas de apreço e valorização, de que vale a pena viver, afinal, e sentir desejo de continuar, neste caso através das pessoas de que gosto. Não sentindo tristeza pelo que já passou, mas felicidade pelo que se teve e tem.

Como disse alguém, em tempos, “tristes dos infelizes que não têm raízes”… E como poetou António Gedeão:
“Triste de quem não tem, / na hora que se esfuma, / saudades de ninguém / nem de coisa nenhuma. “

***
Passemos a vias de factos: Pois o poder da vida tem muita força. A ponto de guardar bem no íntimo aspetos algo simples, mas marcantes. Quanto, para vislumbre recôndito, recordo o colo de minha mãe. Como me sinto (não sei bem como me lembro, se mesmo como foi ou me ficou), aconchegado, agasalhado com qualquer coisa que me fazia sentir quente, numa fria manhã, nos braços de minha mãe. Tenho essa imagem na cabeça: a minha mãe indo manhã cedo ao pão, para dar de acompanhamento a meu pai antes de ele sair para a fábrica (segundo entendo), e deparando-se comigo acordado, a chorar para ir com ela, me pegou contra seu peito e protegendo-me com o que tinha mais à mão, me levou… Ah, como me senti bem assim protegido e unido, naquele tempo. Então, sabendo que meu irmão mais novo me seguiu no mundo quase dois anos depois, eu não teria ainda muitos mais… mas tenho essa sensação no meu íntimo, bem envolvido pelos braços de minha mãe, à vista do mundo que começava a alvorecer também ainda, para mim. 

Ah, e como em criança houve momentos especiais, que por qualquer motivo ficaram gravados na retina da memória… Quanto lembra (não sei se pela sensação da prenda tida na idade infantil, ou pela curiosidade), de por exemplo um “burbarinho” que recebi, assim conhecido como popularmente ouvia chamar a esses vira-ventos, ou cata-ventos de papel, que andavam à roda por força do vento… E popularmente assim conhecidos por estes lados, no meu tempo de petiz, não sei se pela assimilação, por burburinho também significar redemoinho. E então aquelas figuras de barro que recebia, por vezes, quando meus pais iam a passeios de excursão ou festas, como a estatueta típica dum jogador equipado à Porto, outras do Padre Cruz e do Padre Américo, que o povo chamava de santos, ou ainda de figurantes do presépio, por sentimento que davam… e proporcionavam impressão de posse de algo apreciável, sendo que só gostava de “macacada” dessa em barro fino, de feições perfeitas, não gostando muito das de barro grosso, tipo grosseiras…

Esta coisa que é a vida tem que se lhe diga… mesmo. Quanto seja uma vida mais ou menos vivida. Rima e é verdade, mas sem ter sido muito rimada, ou por outro lado mais, conforme foi possível - é o que apraz focar, duma vida, afinal, sobretudo sentida.

Ora bem, para melhor reviver um percurso assim, na visão de quem se predispõe aqui a passar umas quantas loas recordatórias, melhor seria ter um dom de musicar as ideias, passando tudo numa pauta para através de instrumentos musicais conseguir expressar tudo, numa balada atraente, com letra incisiva e profunda. Contudo, como de autoria musical só conheço noções e sinais, sem tom nem som, tenho de ficar pela escrita, à falta de dotes vocais e instrumentais. Musicas há que, ao ouvi-las, entoadas em antigas canções entradas no ouvido, de imediato nos transportam a momentos que pareciam distantes. Sem interessar muito a mensagem escrita, mas a melodia e sobremaneira o que aquilo traz à memória, ainda que diluído no tempo.

Coisa mais bonita… A luz no olhar dum jovem… oh, como só a música trauteada mentalmente faz mexer os sentidos… Não que a letra legendasse qualquer sentimento particularmente especial, então, mas uma cançoneta dos idos de finais de sessenta e inícios dos anos setentas, traz à lembrança princípios das noites de sábado, no odor corporal depois dum banho de água a fumegar e ao sair de casa sem poder esconder ir bem disposto… enquanto me ficava o sorriso de minha mãe, ocupada a “burnir”, atarefada diante de peças de roupa para brunir, do que era para pegar no domingo, na ida à missa pela manhã, mas distraída no semblante como que a perceber quanto me sentia bem, naqueles verdes anos (embora sempre com mais gosto pela cor azul…), ainda que apenas fosse ver um filme de cinema à Casa do Povo, a dois passos de casa, onde sabia ir ter olhares em que depositar outras imagens.

Muitas manhãs seguintes se passaram. Ao que até fechamos os olhos de saudade, quando já não se vai para novo. Agora a tarde vai caindo e o andamento dos dias traz essas e outras lembranças.

Num vislumbre de resumo, posso dizer que na vida sobretudo gostei de dar valor ao que teve e tem valor.

Isto duma e numa vida particular, sem nada de mais, como se costuma dizer, mas com algo que pode dizer qualquer coisa a alguém. Por isso, nesta linha de raciocínio, deixo aqui umas quantas anotações. Porque a vida, com seus mistérios e peripécias, é como um bichinho que vai roendo e deixa as pontas remoídas e tudo aos retalhos, restando marcas da erosão do tempo. 

~~~ - ~~~
Percurso Pessoal

Porquanto a imagem conta, para que se possa ter ideia do que possa aparecer ao abrir a embalagem, façamos apropriado embrulho deste memorando.

Assim sendo, sem que o autor se queira enfileirar por si próprio em nada, e muito menos para ver ao espelho ou olhar o umbigo, mas tão só a guardar recordações personalizadas, unicamente para esboçar um perfil a fugir à vulgar nota biográfica esquemática ou apresentação usual (como a que foi transcrita no livro “Sorrisos de Pensamento” ou outras, como também consta na Internet); houve ideia de fixar alguns traços biográficos pela cabeça do próprio. Em memórias, repito, com laivos autobiográficos, afinal, que terão nomeadamente atenção em quem tem afinidades e interesse nos escritos deste cunho pessoal; tal como a quem teve ou tenha conhecimento personificado e possa recordar ou reviver passagens comuns e públicas; como ainda aproveitamento para desenrolar curiosidades relacionadas.

Diz-se que há uma trilogia de realização pessoal maior, em três premissas que se deve conseguir fazer para obter o pleno da vida, e a ser assim a verdade é que pessoalmente, sem falsas modéstias à espera que outros apontem, já fiz tudo isso mais que uma vez, tendo eu orgulhosamente plantado, pelas próprias mãos, regado e educado árvores, no jardim da casa que igualmente edificamos, tal como, na parte mais importante, felizmente também temos filhos, e, acrescente-se, escrevi entretanto mais que um livro.

Poderia haver certo receio desta exposição, porém já algo disto se franqueou na diversa escrita afetiva, afinal, em porção do que se escreveu ao longo do tempo, porque em tudo fica sempre alguma coisa própria.

*
Mais conhecido por Armando Pinto, como a própria assinatura de Bilhete de Identidade e literária, sendo de nome completo José Armando da Costa Pinto:

- Nasci a 6 de Julho de 1954, por volta do meio dia (quando o sol está mais a prumo), sendo natural da freguesia de Rande e concelho de Felgueiras, com berço natal na Longra, então povoação e hoje centro da Vila da Longra, onde resido.

Nesse dia houve uma heroína: Minha Mãe. Em sua memória, com a devida vénia, faço minhas as bonitas palavras dum poema de Sebastião da Gama:

Quando eu nasci,
Ficou tudo como estava.
Nem homens cortaram veias.
Nem o sol escureceu.
Nem houve estrelas a mais...
Somente,
Esquecida das dores
A minha mãe sorriu e agradeceu.
Quando eu nasci,
Não houve nada de novo
senão eu.
As nuvens não se espantaram,
Não enlouqueceu ninguém...
Pra que o dia fosse enorme,
bastava
toda a ternura que olhava
nos olhos de minha MÃE...

*
Em 1954, segundo relatos da imprensa da época, o mês de Julho foi de «calor intenso». Não admirando que um nativo desse tempo seja calorento e de coração ardente... E no dia seis, naturalmente entre muitos outros acontecimentos nesse dia quente, houve por exemplo publicação do livro “A Missão”, do consagrado escritor Ferreira de Castro.

Nesse mesmo dia seis de Julho, em 1954, fazia 48 anos que nascera, também em Rande-Felgueiras, o Padre Luís de Sousa Rodrigues, ao tempo professor no seminário diocesano, reitor da igreja da Lapa do Porto e compositor musical – que pouco depois, a 24 do mesmo mês, teve uma homenagem em Felgueiras, na casa do Cine-Teatro Fonseca Moreira. Nome saliente esse, já então figura da música sacra (depois porém caído parcialmente no esquecimento), o Padre Luís Rodrigues, por quem o visado, eu, nascido décadas depois mas no mesmo dia aniversariante, mais tarde viria a pugnar por justo reconhecimento local para com tão importante vulto e até a participar em homenagens evocativas que foram prestadas a tal ilustre conterrâneo, aquando da passagem de 25 anos de seu falecimento e na comemoração de seu centenário natalício. Incluindo a escrita de sua biografia, em livro de autoria própria e edição do autor.

No dia seguinte, a eu ter nascido, e digo o dia depois porque é quando aparecem as notícias escritas do dia anterior, não houve naturalmente qualquer registo impresso sobre a nova vida vinda ao mundo na Longra. Apenas uns dias depois foi registado o nome na conservatória do Registo Civil de Felgueiras. Contudo na Longra isso foi sentido em casa de meu pai, Joaquim Pinto, então um respeitado operário da fábrica de Móveis Metálicos da Longra, a MIT do Largo da Longra, cujo edifício, à maneira de barracão industrial típico do desenvolvimento da época, se situava quase de frente à casa de meus pais, até junto da árvore antiga e de grande porte mais tarde conhecida por carvalha da padaria. Habitando ali um bando de filhos, de que eu passava a ser o quinto, na ocasião, numa parte da casa que também tinha outra família ali moradora, com a prole do senhor Zé Verde, pai da que, por isso, veio a ser minha madrinha de batismo - naquela casa com uma sacada tradicional a todo o correr da frente da casa, em varanda esguia a abranger a divisória exterior do rés do chão ao primeiro andar…

E foi bem mais sentido por meu pai, de modo particular por ele ter estado antes internado num sanatório (devido a doença pulmonar que nesse tempo era muito frequente), havendo estado ausente de casa algum tempo. E derivado a isso, estar com algum receio de sequelas. Sendo assim uma boa hora em que vim ao mundo são e perfeitinho…

= FOTO da avó Júlia com o barracão da fábrica como campo visual =.

Por coincidente sobreposição, Julho era e é o mês de celebração do Padroeiro de Rande, São Tiago Maior, cujo dia que lhe está dedicado pela Igreja ocorre a 25 do mesmo mês. E, décadas volvidas, Julho seria depois, logo no dia 1, também, o mês da elevação da Longra a vila (em 2003).

Julho é ainda, especialmente um mês de outras datas históricas de saliência retumbante a nível da vida humana, noutros casos, reportando-se a tempos recuados. Concretamente, entre diversas possíveis efemérides de antes e depois, com um século de antecedência ficou Julho assinalado por ter sido em sua passagem, no século XIX, que foi abolida a pena de morte em Portugal – a 05 de Julho de 1852 para crimes políticos e a 01 de Julho de 1867 para crimes civis, promulgação extensiva ao Ultramar Português a 09 de Julho de 1870.

Séculos antes, foi também em Julho, e mais precisamente num dia seis, que se deu um facto relacionado com um santo de minha predileção, S. Francisco de Assis. Com efeito, menos de dois anos depois de sua morte, o papa Gregório IX foi pessoalmente a Assis para canonizá-lo, o que aconteceu em 6 de julho de 1228 com grande pompa. Após isso, em 1230 foi inaugurada uma nova basílica em Assis, que recebeu seu nome e hoje guarda as suas relíquias e abriga o seu túmulo definitivo – local onde estive no ano 2002, em excursão de algumas paróquias de Felgueiras (no seguimento de périplo turístico pelos países mais bíblicos, a partir do ano 2000, desde Israel, mais Turquia e até à Itália).

Voltando a eras contemporâneas do tempo em apreço, o ano de 1954 foi considerado Ano Mariano, em comemoração do primeiro centenário da promulgação do Dogma da Imaculada Conceição (na sequência do Ano Santo do Jubileu de 1950, assinalado com campanha de colocação de efígies de Nossa Senhora em azulejos fixados em frontarias de casas e padrões – ocorrência verificada até pelo concelho de Felgueiras, como registei em crónica sobre Alminhas, Cruzeiros e Nichos, no livro sobre o Nicho de Rande).

No mesmo ano de 1954 foi também colocada na Praça da Liberdade, no Porto, a estátua de Almeida Garrett, escritor portuense, lutador por um ideal de política social no país, recuperador de memórias pátrias e impulsionador do teatro português, um verdadeiro personagem de interesse histórico nacional.

Ainda quanto a esse ano, 1954 ficou também nos anais por ter sido então que a igreja de Nossa Senhora do Rosário, do santuário de Fátima, recebeu a categoria de Basílica, título concedido por Pio XII pelo breve “Luce Superna”.

Em 1954 a equipa de futebol principal do Futebol Clube do Porto integrava, com maior utilização, o guarda-redes Frederico Barrigana, famoso “mãos de ferro”, o defesa Virgílio Mendes, o Leão de Génova e durante muitos anos recordista português de internacionalizações na Seleção A (em tempo de escassos jogos disputados, a nível de Seleções), mais Miguel Arcanjo, Vale, Carvalho, Porcel, Albasini, Eleutério, Henrique Monteiro da Costa, José Maria, António Teixeira, o famoso Hernâni Silva, Carlos Duarte, Fernando Perdigão e José Pedroto; como também Osvaldo Cambalacho, Dell Pinto, Sarmento, Vieira e Romeu.

Nessa época o F. C. Porto não foi campeão nacional de futebol (o que veio a ser de seguida em 1955/56 e depois em 1958/59), mas sim, nesse ano de 54, em Andebol de Onze, modalidade em voga ao tempo, na qual foi campeoníssimo com títulos a eito, anos a fio. E em Andebol de Sete, variante que era recente no país, nesse tempo. Mas, porém, no futebol sénior, naquele ano, o FCP foi a Lisboa vencer o Benfica, em futebol de primeiras, como se denominava à época as formações de honra, na inauguração do então ainda chamado Estádio de Carnide, o depois (antigo e originalmente) denominado Estádio da Luz, trazendo para as Antas o artístico trofeu em disputa (na permuta, relativamente à presença do Benfica na inauguração do Estádio das Antas, em 1952).

Não se pode escamotear, porém, que, conforme até “disse” a imprensa, o F. C. Porto só não venceu o campeonato de 1954, como noutras ocasiões, aliás, por fatores por demais estranhos ao próprio jogo. Repare-se, a título de exemplo, do que veio (em edição impressa muitos anos volvidos) ainda, pasme-se, numa publicação do jornal A Bola, de Lisboa, in “50 Anos do desporto português”: «1954-Janeiro-30 - Jogo de importância transcendente na luta pelo título, em Alvalade: Sporting-Porto... com vitória do Sporting por 2-1. Muito polémico o 2º golo do Sporting, por Vasques.» Curiosamente, do mesmo “lapso”, o Jornal de Notícias, do Porto, publicou na ocasião uma foto a mostrar o “crime”, de quando o mesmo avançado leonino se antecipou e enfiou a bola nas redes com um soco...Tendo, por isso, o JN sido impedido de entrar em Alvalade durante uns tempos...! Ainda, segundo a anteriormente referida publicação d’ A Bola, por ironia estranha também, «o árbitro era Inocêncio Calabote, que algum tempo depois mais tragicamente famoso ficaria...» (com o célebre prolongamento escandaloso de inesquecível jogo SLB-CUF, na tentativa de o Benfica marcar os golos que precisaria para poder suplantar o F.C. Porto no desempate por golos, em 1959). Por esses e outros tempos, tem de se ter em conta essas particularidades que enfermaram o país em eras passadas, de que naturalmente ficaram resquícios pelos tempos fora.

Por essas e por outras, ficou então célebre aquela tirada do Hernâni, o malabarista da bola e senhor do futebol (que era ao tempo o “Capitão”, como autêntico General do Porto), de que ao F. C. Porto não bastava só ter uma equipa tão boa ou melhor que a dos outros, mas sim teria de ser muitíssimo superior, para poder lutar contra as arbitragens e os jogos de bastidores, pelo que um campeonato ganho pelo Porto valia, na realidade, por dez dos adversários rivais... E, como dizia Alves Teixeira amiudadas vezes no antigo jornal “O Norte Desportivo”, o grande goleador Artur de Sousa “Pinga”, famoso ídolo dos anos trinta e quarenta, do séc. XX, só não tem sido considerado o melhor futebolista português de todos os tempos porque jogou com a camisola do Porto!

Isto tem aqui lugar, também, porque como bairrista e com feitio de dar valor ao que tem valor, sempre me revi no Porto como clube resistente ao poder centralizador e resiliente em ser representante de valores de bem, sem favorecimentos. E como sempre fui adverso a maiorias, que não defendem normalmente dignidades, não me deixei entusiasmar pela comunicação social que faz algumas mentalidades. 

Nessa era, a meio do século XX, de tempos coincidentes ao quarto ano da década de cinquenta do século XX, ainda, amealhava o Futebol Clube de Felgueiras sua primeira experiência de provas oficiais, tendo disputado o campeonato distrital da Associação de Futebol do Porto da época desportiva de 1953/54.

No ano de 1954 estava como Presidente do F. C. Porto o Dr. José Carvalho Moreira de Sousa; o Pároco de Rande era o Padre João Ferreira da Silva; era Papa Pio XII; a Patriarca da Igreja portuguesa estava o Cardeal D. Manuel Gonçalves Cerejeira; o Bispo do Porto era o mítico D. António Ferreira Gomes; o Presidente da República de Portugal era o Gen. Francisco Craveiro Lopes; enquanto Presidente do Conselho de Ministros obviamente o Dr. António Oliveira Salazar; a Presidente da Câmara Municipal de Felgueiras estava o Dr. José de Castro Leal de Faria, como Dirigente fundador e primeiro treinador oficial do F. C. Felgueiras estava Verdial Horácio de Moura e como Presidente da Junta de Freguesia de Rande havia Adriano Ribeiro da Cunha.

De particular apreço, 1954 foi ainda o ano em que começou a fazer-se ouvir a célebre sirene da Metalúrgica da Longra, que se revelou autêntica referência local, feita pela lavra do pai do autor destas lembranças e considerações.

*
Filho de Joaquim Pinto e Matilde da Costa. Irmão de Joaquim António, Luís Manuel, António Manuel, Maria Rosa e Fernando da Costa Pinto. Marido de Maria Deolinda Guimarães Sampaio Pinto. Pai de Nuno Cristiano e Clara Isabel Sampaio da Costa Pinto - ele Engenheiro Eletrónico e ela Enfermeira Licenciada, os quais, além do mais, proporcionam assim maior orgulho paterno nas suas formaturas de engenharia eletrónica e licenciatura em enfermagem, respetivamente. Tal qual, sogro de Hugo Gonçalo Costa de Matos, Enfermeiro Licenciado, e de Lígia Pereira e Silva, também enfermeira. E avô apegado do Gonçalo Pinto de Matos e do Tiago Sampaio Silva Pinto, por ora (quando escrevo isto, pois em breve e futuramente conto com mais alguém), os quais são meus companheirinhos, meus amores e eu deles. Bem como sou tio de sobrinhos de que sempre gostei muito e sei gostarem de mim. Além de ser amigo de quem é meu amigo, tal como sinto afeição por outras pessoas que são familiares não por sangue mas pelo coração.    

Enquanto, como neto, tive minha avozinha, a avó paterna Júlia de Jesus Pinto (mais ainda, não reconhecidamente, de Henrique Barbosa Mendonça, da solarenga Casa de Rande) e como avós maternos António da Costa e Rosa Moreira de Magalhães. Sendo bisneto, pelo lado materno, de Maria da Costa (ascendente do avô António, de Janarde; o qual, também não oficialmente, teve filiação de um ancestral da família Babo, da casa do Rosário, de Unhão), mais, Ana Moreira de Sampaio e José de Magalhães da Mota (da Longra, pais da avó Rosa), como pelo ramo paterno de Emília de Jesus Pinto (que, sendo natural de S. Cristóvão de Lordelo, veio depois para Rande, onde morou nas Chãos e na Fonte, e era mãe da avozinha Júlia), assim como de António Barbosa Mendonça Pinto de Magalhães Alpoim e Carolina Gonçalves Mendonça (da Casa de Rande, avós de sangue de Joaquim Pinto...).

Nas relações antigas, em que os filhos das assalariadas de fidalgos não eram reconhecidos, ficando como ilegítimos aos olhos da lei desse tempo, o avô António ainda teve reconhecimento moral com uma simbólica nota de herança, à morte do dono da casa do Rosário do Unhão, quantia que, naquela época, deu para ele comprar a propriedade que teve na Longra. Já da parte Mendonça sabe-se história que nem vale a pena aflorar... a não ser de haver transmissões fidedignas. Dali apenas tendo eu herdado o gosto pela escrita e valores históricos… Ao passo que de outras origens também antepassadas, se desconhecem mais informações concretas, que não é preciso aprofundar. Interessa que de todo esse percurso genético resultou existência, tanto como, afinal, tornou possível os registos escritos proporcionados...

= X =
A propósito intercalo, aqui e agora, uma cronicazita que escrevi e foi publicada no jornal Semanário de Felgueiras, aquando da comemoração de meio milénio dos Forais de Felgueiras e Unhão (no caso do Unhão também pertinente, por ter sido uma parcela administrativa a que a zona de Rande pertenceu antigamente, há séculos):

Gado de Vento e o meu Avô da Quinta…

(A propósito da então comemoração da outorga do Foral Manuelino ao antigo concelho de Unhão, cuja carta régia foi passada por D. Manuel I, o rei venturoso português, fazia em 2015 quinhentos anos) …afloramos acrescento de algo relacionado ao tema, por quanto esse facto histórico nos toca, nos trilhos da história calcorreada por nossos antepassados. Na sequência do que publicamos no livro “Memorial Histórico de Rande e Alfozes de Felgueiras”, editado em 1997, no qual desenrolamos um capítulo sobre a Honra, Julgado e posterior Concelho do Unhão, entre os antigos Alfozes da organização regional. Tendo aí sido estudado, e pela primeira vez publicado, um princípio de apreciação pública sobre o referido documento. Estudo esse que, mais tarde, serviu de achega contributiva à monografia de Cepães, por exemplo, conforme pudemos ajudar o seu autor, entre diversos casos. Sabendo-se que o Foral do Unhão contemplava outros parâmetros, como terras jurisdicionais de antigas circunscrições de Cepães, de Fafe, Meinedo, de Lousada, etc.

Ora no Foral do Unhão, entre a matéria medieval ali contida, há uma expressão deveras interessante. A nomeação de um tal “gado de vento”, do que havia pela região. Tanto quanto sabemos, dava-se este nome nalguns forais, e mais papéis antigos, ao gado de toda a espécie que era encontrado sem dono. Tratando-se de uma expressão muito antiga, quase sempre usada nos documentos do género, com o sentido coletivo, para designar alguns animais extraviados, isto é, de que não se conhecia dono, mais precisamente que andava a monte, bravio. Esta expressão já aparecia no Código Visigótico. Chegando a ser referenciada nalgumas Ordenações do Reino. Contudo, também por quanto pudemos saber, localmente esta denominação era dirigida aos enxames de abelhas, sabendo-se que, em caso de abespinhamento, uma comunidade dessas podia sair de uma colmeia e acabar por pousar em local indeterminado. Havendo inclusive regras de honra quanto a essa realidade, respeitando o poiso escolhido por um enxame que mudasse de sítio, passando a ser de quem o conseguisse atrair a um cortiço seu… Sendo, como era, a região deveras atrita à lavra das abelhas, como mais tarde ficou nas armas heráldicas felgueirenses, na identificação concelhia que vingou.

De tenra idade ouvi essas dicas de meu avô materno, um expert famoso na região, em seus tempos, de tudo o que respeitava à criação de abelhas e derivado mel. O meu avô da Quinta, como era mais conhecido o avozinho António, tal o seu nome de batismo, António da Costa conforme o registo lavrado na repartição de Felgueiras. Um senhor de respeito nos idílicos tempos da monarquia, oriundo de família respeitada, como filho de fora de uma família fidalga da zona, precisamente do Unhão, com um rosário de tradições, que se fez à vida e era uma espécie de feitor na Casa da Quinta, de Rande. Proprietário, com uma moradia na Longra comprada através duma tença recebida de seu pai, e sobretudo pessoa culta, que guardava muita literatura de seus tempos, de cujo rol um neto ainda conseguiu salvar alguns romances de cordel, desse tempo, como a história do Zé do Telhado em verso… e outro neto herdou o gosto pela apicultura.

(Foto) = O meu "Avô da Quinta", em pose numa idade mais jovem, junto com a minha avó materna Rosa; e junto às suas colmeias, num dos quintais da Casa da Quinta =

Pois o Avô da Quinta falava muito sobre esse tal gado de vento. Ele que nos quintais da Casa da Quinta muito mel tirou de suas abelhas. Curiosamente nessa mesma Quinta onde era o remanso dum grande benfeitor da Misericórdia do Unhão, o senhor Luís Teixeira, recordado perenemente numa lápide da frontaria e num quadro do mesmo solar condal e conventual do Unhão. Enquanto ele, o meu avô materno, estava horas à beira das suas abelhas, sabendo de tudo o que elas precisavam e faziam, como convivendo com sua existência ao vento, a dar às asas da vida a leveza de seu voo existencial.

= X =

Posto isto, voltemos ao rumo desta conversa escrita, sobre mim:

Tendo passado uma infância feliz, dentro das limitações de família que vivia do trabalho, não tive contudo qualquer facto especial, de grande monta, a assinalar os verdes anos (embora sempre gostasse sobretudo do azul... como se sabe!); bem como na juventude e vida adulta não fui protagonista de aventuras nem peripécias de muito relevo, fora vincadas recordações singelamente dispersas. Tão só me habituei a obter as coisas e a conseguir tudo com empenho e querer, após esperas, expectativas, esperanças, contratempos e insistências, trabalho e interesse, depois de muito remoer interiormente, produto de personalidade própria, sem que nada caísse do céu, de mão beijada ou fruto de acasos inesperados.

Passei o tempo descontraído da infância na Longra, num mundo meu, por assim dizer. E então comecei a afeiçoar-me à Longra. Longra que era uma terra com muita presença, desde eras remotas. O que leva a dar um ar de divagação, a propósito…

= X =

Neste ponto, isto pode ir com um conto… para melhor ilustração.

Quimera Reconstrutiva...

No torpor de pensamentos, qual reconstituição histórica mental, permita-se desta feita uma deambulação pelo mundo dos sonhos sonolentos, à guisa descritiva de conto:

... Huuum…  Diante dos olhos, quão abstrato pensamento, distante e diluído, depois com mais nitidez aos filtros do cérebro, apareciam pessoas de semblante algo rude, homens, mulheres e magotes de filharadas, uns cobertos parcialmente por arremedos de vestimentas em pele animal, ao género das peles de lapónio, outros cobertos com lã de seus rebanhos, e alguns outros já por uma aparente veste comprida quase até aos joelhos, presa por uma cinta… Possivelmente povo de tempos pré-romanos, patrícios dos Lusitanos, parecendo mesmo avoengos Calaicos, cirandando num escarpado povoado remoto. Traziam cabelos compridos, seguros por uma atadura em volta da fronte, e, nos que usavam peles, saía dos agasalhos um saio mais ou menos curto, cingido ao corpo. Conviviam numa comunitária descontração, parecendo tribos de vida autónoma, aliados em inocente felicidade, mais sentido de defesa e entreajuda. Enquanto usavam danças muito próprias e se exercitavam em culto de jogos atléticos e práticas de guerreiros.

Huuum? Mas aquilo…

Ora, vislumbravam-se construções colmaças cilíndricas, de céltica fisionomia, casas arredondadas feitas de pedras miúdas e graúdas, cobertas de colmo, mais cortelhos irregulares e casotas de paredes lisas quadradas e retangulares, espécies de humildes cabanas e grutas escavadas, com aspeto da Idade do Ferro, como nos livros vem.

Mas… Era, aquilo, num sítio com apreciável grau de urbanização, em forma antiga, através de núcleos urbanos distintos, por meio de habitações agrupadas ao longo de caminhos com traçados de regulares carreiros… E, além, divisavam-se ainda umas antas, edificações de dólmenes genuínos, quais monumentos funerários de acrisolado apego antepassado, na religiosidade simbólica. Tal como uma construção de balneários, com ar de banhos públicos, em cuja cabeceira se salientava adornada pedra formosa. Realçando-se, no coração da localidade, uma figuração em pedra de um guerreiro, hirto como se de vigia se tratasse, tipo sentinela protetor. E, nas periferias, após limites de pequenas muralhas de rústica alvenaria, em fileiras de pedras, sucediam-se penedias, bem comparantes ao penedo rebolão, das histórias de encantamento mourisco, mais um par de outros, ambos como o do bem e do mal, quanto ficaram na memória do imaginário popular, bem como um tatuado penedo das ninfas, assim chamado e com marcas epigráficas, em referencial de divindade idolatrada, por entre fraguedos; revezando-se o panorama até paisagens amenas, entrecortadas por campinas, qual lameira de Redundo e sítios das lendárias ervas arbóreas ao pé da pedra furada…

Uma povoação castreja?! ...A vida regurgitava, ali, num quotidiano de labor montanhês, a par com labuta de culturas de trigo e cevada nas chãs mais altas e vizinhas do povoado, atarefando-se porém com mais parcimónia em cuidados de pastorícia, medrando rebanhos de gado, donde retiravam peles com que se cobriam e carne e leite para o sustento. Cotejando necessidades com costumes, por tradições e superstições condimentadas em ciência adquirida pelos tempos fora.

Só que era esquisito, surgia tudo tão diferente, do que as pálpebras tinham ideia, num ambiente a parecer primitivo, como se o tempo tivesse andado muito, mas muito para trás…

 Então, quem estava a presenciar tal ocorrência, deu com toda a gente a olhar para si… Tantas caras meio apalermadas, num misto de rostos esquálidos interrogativos, boquiabertos, de dedo em riste e riso inquisidor… Olhando, de pé atrás, viu-se logo rodeado por aqueles indígenas, a admirar suas roupas, de pleno século XXI, a indagar a direção de seus sapatos, a apontar os óculos do incrédulo visitante, a mexer-lhe na cara, barbeada, enquanto se olhavam entre si, comparsas barbudos e de hirsutos cabelos… De imediato o circundaram com danças, ao género de ritual como se via em filmes… Como poderia ser aquilo…?

Sem entender o que estava a acontecer, entretanto, ouvia-se, num dialeto arcaico… umas falas grunhidas por entre dentes, possivelmente a conversarem sobre tão estranha ocorrência também para eles. Até que o agarraram e o estavam já a levar, no meio de uma vozearia cantada, quando, deveras apreensivo, estremeceu, e… E acordou.

Uff!!!  Olhando em volta, ainda estremunhado, no torpor de sono consolado, apercebeu-se que estivera a sonhar! Tudo isso, aquilo, tinha sido apenas fruto de recente visita a um significativo local de preservação castreja do Noroeste Peninsular. O que estivera a pressentir mais não fora o que lhe ficara no subconsciente, reconstituindo historicamente o que sentira. Tratava-se, afinal, do que apreendera diante duma emblemática citânia de Entre Douro e Minho, sendo dos melhores exemplares do proto-urbanismo da II Idade do Ferro, com uma organização funcional desse importante espaço que foi urbanizado em tempos idos, a remeter à penumbra dos tempos. Estivera, por instantes, no âmago duma Citânia de outrora, após visita pessoal em dias do próximo presente, agora, a sonhar, como se séculos antes fora… À espécie duma quimera, de reconstituição histórica, em mental devaneio estudioso.

Isto por estar presente facto relacionado com o passado da terra natal, transpondo à realidade local. Sabendo, como ficou descrito no “Memorial Histórico de Rande e Alfozes de Felgueiras”, que Longra provém de Lôngara, que queria significar algo arqueológico, sendo um sítio de vestígios soterrados, coisa alongada pelo tempo.

*

Ora (já sem ser conto ficcionado, de ilustração, mas descrição real, de afinidade), assim sendo, a Longra é um dos lugares de Felgueiras com história, tal o caso do local arqueológico apelidado de Cimalha. O chamado povoado da Cimalha, que em tempos (pelos inícios do século XXI, já) foi descoberto e depois continuou soterrado no alto de Cimalhas, na fronteira de Rande com Sernande, uma das áreas da nova divisão administrativa que a partir de 2013 ficou englobando Pedreira, Rande e Sernande, conforme o que foi decidido pelos poderes reinantes.

Pois então, quanto ao tema arqueológico, por meio de trabalhos públicos de pesquisas, houve novidades de povoamentos antigos da bacia inicial do rio Sousa, nas veredas de Sousa e necrópole do Senhor dos Perdidos, da proto-história à romanização, incluindo mesmo informações de um povoado da Idade do Bronze, como o chamado Povoado da Cimalha (cujos vestígios não foram muito valorizados, oficialmente, atendendo a que ficaram soterrados pouco depois de seu estudo e seguinte construção dos acessos à auto-estrada A11), mais algo de arqueologia romana, com respeito às descobertas da denominada villa romana de Sendim, como haverá diversas outras, onde há informes de casas originais (villas) das fundações das paróquias / freguesias, pelo concelho.

Dando razão ao que escrevi no “Memorial Histórico de Rande e Alfozes de Felgueiras” (ed. 1997), quanto a breves referências expostas sobre iniciais estudos que se tinham proporcionado, o Alto de Cimalhas guardava resquícios de velha civilização. Aliás os lugares antigos em torno desse planalto, pela toponímia histórica, referem assimilação derivada, ao que se passa com Longra, de Lôngara, significando algo arqueológico, bem como Castelo e Castela, lugares da encosta de Rande, como também mais alguns outros pelas próprias freguesias ao redor têm nomes dessa procedência. Ou seja, comprova tal passado, da penumbra dos tempos, também as eminências do povoamento primitivo, quanto designam que o mesmo território possui elementos de interligação, como sejam os limites transfronteiriços de freguesias no antigo Monte de Cimalhas. Aí se percebe, no dito local antigamente também chamado Picoto de Cimalhas, como a zona teve população alguns séculos antes da nacionalidade, conforme se encontra documentado a partir pelo menos do séc. X, visto ali se haver elevado um castro (fortificação castreja), em tal sítio remotamente ainda referido como Pico da Cimalha, onde Varziela herdou o nome do lugar do Monte, enquanto Sernande e Rande dividem terras que ficaram conhecidas por lugares de Cimalhas de Cima e de Baixo, ao passo que a Pedreira se chega por Carcavelos, local de designação de antiga fortificação, até à Sobreira, para mais além possuir réstia toponímica de um próprio lugar de Castro (Crasto, na evolução popular). Entre outros casos, nesta singularidade familiar de exemplos múltiplos, na área da atual Vila da Longra. Sendo atualmente o nome Cimalha constante das escrituras do terreno, e naturalmente da sua localização, do chamado Edifício Vila da Longra, construído em 2007 ao fundo da encosta de Cimalhas, na parte da freguesia de Rande, já em pleno centro da vila a que pertence.

Efetivamente, desenvolvendo mais o tema, no referido local, ao cimo, inicialmente chamado da Cimalha (aliás nome de todo o antigo monte), apareceram recentemente, desde trabalhos de pesquisa arqueológica efetuados a partir de 2004, uns escassos vestígios, derivado aos desaterros ocorridos nos trabalhos de terraplanagem da ligação à auto-estrada A11, sobremaneira de velho caminho divisório interfreguesias, mas também, com novas sondagens em 2008, antecedendo o rasgamento da continuação da estrada para ligação em viaduto, do alto da Longra/Cimalhas para os próximos lugares de Varziela, apareceram alguns pequenos vasos de deposição de restos funerários, comprovativos de ancestral povoado.

Conforme os dados entretanto difundidos, ali foram detetados vestígios de um habitat da Idade do Bronze, através da análise de cortes do terreno, existindo partículas de cerâmica, o que possibilitou a compreensão do tipo de ocupação do sítio, com realce a determinadas estruturas, de reduzido número de buracos de poste e algumas fossas de silos de armazenamento, paralelamente com recolha de fragmentos cerâmicos que possibilitaram reconstituição de vasos, de largo bordo, tipo de guarida de cinzas funerárias, a par com alguns objetos de pedra, caso de artefactos de moinhos manuais, molde de machado plano e inclusive peças de ferro, como uma pequena estatueta e aldrabas de portadas, entre diversos exemplos.

Atendendo ao que está observado, por meio das intervenções realizadas, e dadas as características do espaço inspecionado, tem sido concluído tratar-se o caso da Cimalha de parte de um lugar habitado do período do Bronze Final, com vocação agro-pastoril, que se julga com ocupação até cerca do período romano, antes de instalação de próximas villas romanas que, depois do período dos godos, viriam a fundar as paróquias circunvizinhas. Pressupondo uma primitiva ocupação do local, entretanto destruída, da qual restam assim diminutos testemunhos. Devendo o aglomerado central do lugar ter desempenhado, em seu tempo, relevo de vigia na defesa dos sítios circundantes, ao género de uma atalaia (de acordo com o espólio dos achados das escavações). Disso, após os devidos restauros, as peças encontradas no alto dos Perdidos e na Cimalha, junto com as descobertas da villa romana, fazem parte, para já (enquanto não há um museu geral concelhio) do acervo museológico exposto no centro de interpretação de apoio às ruínas de Sendim.

= X =

Posto isto, continua o percurso vital.

Fui batizado na igreja paroquial de S. Tiago de Rande a 1 de Agosto de 1954, pelo pároco Padre João Ferreira da Silva, tendo como padrinho o irmão mais velho, Joaquim; e por madrinha (a então vizinha de casa) Maria Celeste Guimarães Pinto da Costa. E, feita a Primeira Comunhão a 1 de Junho de 1960, fiz a Comunhão Solene também em Rande, no domingo da Festa Paroquial do Padroeiro S. Tiago, a 26 de Julho de 1964.

Porque da infância pouco fica, não são muitas as imagens dos primeiros tempos de assimilação à vida. Porém no subconsciente, segundo instantâneos que por vezes transparecem à retina da memória pessoal, ficaram algumas impressões adocicadas, das presenças supremas de pai e mãe no amparo inicial, quais manhãs de Primavera ridente, mais a companhia permanente da avozinha Júlia desde seu leito contínuo, como anjo protetor dedicado. E entranhadas imagens de convivência familiar, daquelas sortes que permanecem gravadas e de quando em vez assumem sua imponência mental.

Entretanto, iniciara primeiro a aprendizagem da doutrina cristã, assimilando as normas da religião católica de ouvido, matriculado que fui na catequese antes de ter podido aprender as primeiras letras.

Entrado para a Escola (inicialmente sem estar inscrito, em 1960, por então não ter ainda atingido a idade, assistindo apenas durante algum tempo às aulas de D. Maria Amélia Noronha; e no ano seguinte, aí já matriculado), havendo iniciado as aulas a 1 de Outubro de 1961, tive como primeira professora a D. Candidinha Sousa, como era conhecida D. Maria Cândida Gonçalves de Sousa; seguindo-se desde a 2ª à 4ª classe a D. Maria Fernanda Figueiredo Silva (esposa do Presidente da Câmara de Felgueiras nessa época, Dr. Dias Ribeiro).

Perfiz o ensino primário na Escola (antiga) da Longra, cujas provas escrita e oral do exame final da 4.ª Classe (do ensino público e obrigatório da época) ocorreram, respetivamente, a 1 e 5 de Julho de 1965 na então vila de Felgueiras, sede do concelho natal – por ocasião da primeira subida de divisão do Futebol Clube de Felgueiras, que então ascendeu à Segunda Divisão Distrital, com dois golos de Sabú na “finalíssima...!

Passei todo esse saudoso período de brincadeiras infantis com os meus amigos, de início com o grupo restrito de familiares, mais escasso número de crianças vizinhas; seguindo-se depois, ao tempo da escola, alguns amigos mais assíduos de passatempos. E, além das companhias da gente miúda, de minha igualha, gostava da sensibilidade feita experiência de pessoas mais velhas, que me diziam respeito, como o tio Zé (José da Costa Moreira) e a tia Emília, na Longra, em cuja presença, junto à lareira, ia povoando a imaginação de histórias antigas, ouvidas em serões de roda familiar; como também, por vezes, em casa do tio Quim e da tia Rosa, de Janarde, sobretudo em almoços nalguns dias de festas; bem como na casa do Tio Tónio e da tia Micas, também de Janarde, onde vivia ainda a “tia ceguinha” e era a antiga casa do avô António da Quinta (que gostava de guardar livros e panfletos antigos com histórias de seu tempo, a que infelizmente não consegui pôr as mãos, salvo exceção de dois folhetos que minha mãe me conseguiu, remidos da destruição acontecida, aquando de reunião dos meus tios à procura de outros bens...). E, quanto ao acompanhamento com familiares, de modo especial sentia-me bem com a prima Glória, do Paço da Torre, em andanças eternizadas intimamente – como ficou aflorado, numa suave recordação, em “Sorrisos de Pensamento” (livro de contos, de capa azul e branca por gosto pessoal).

Por esses tempos, dos inícios de frequência pública local, por volta de 1960 quando já ia à “doutrina” (catequese) e principiei a interessar-me por ouvir falar do Porto, quem venceu a Volta a Portugal em bicicleta foi o ídolo Sousa Cardoso, do F.C.Porto, em tempo em que ainda corria com a camisola azul e branca o ciclista Felgueirense Artur Coelho. Tal qual quando então passei a colecionar cromos, os “macacos” de ases da bola, a equipa de futebol principal do F. C. Porto era composta por uns Américo Lopes, Virgílio, Arcanjo, Mesquita, Barbosa, Paula, Ivan, Luís Roberto, Monteiro da Costa, Carlos Duarte, Serafim, Jaime Silva, Custódio Pinto, Azumir, Hernâni... E Azumir, artista no ataque, foi o melhor goleador do campeonato em 1961/62, conquistando o galardão da Bola de Prata.

- Azumir… Américo…

… Inícios do Portismo do autor destas linhas. E havia um jogador, que nunca vi em carne e osso, só conhecia de nome e fisionomia pelas gravuras dos jornais e cromo que tinha na minha caderneta. Mas muito admirava pelos meus seis, sete anos, no acompanhamento do que já ia sentindo pelo Porto, sendo um goleador que vestia a camisola azul e branca, chamado Azumir. Ouvia o seu nome no rádio que estava junto à cabeceira da minha avozinha (que estava sempre na cama, paralítica) e ficava a pensar como seria ele vestido com a camisola linda que eu tinha numa fotografia, retirada dum papel que viera com qualquer coisa duma feira.

Azumir foi então um dos meus primeiros ídolos, do que me lembra desses tempos de primeiros anos de convivência infantil, de toda a ambiência que tive entre aulas, recreios e brincadeiras dessas eras de escola primária, durante a semana, e ensino da catequese, aos domingos. Em cujos dias santificados, mal acabavam as preleções das catequistas, nos lançávamos em loucas correrias para ainda presenciarmos o que restasse dos jogos de basquetebol da equipa da Metalúrgica da Longra, ao tempo a competir nos campeonatos corporativos, da coeva FNAT (mais tarde substituída, com a mudança de regime político, pelo Inatel). Como gostava de ouvir o povo assistente a gritar “Longra ao lado” (!), sinal de que haveria lançamento lateral a favor da equipa Longrina e a bola ficava na “nossa” posse. Pois a maioria das vezes nem sabia a quantos estava, ou seja qual era o resultado, mas pelas reações me apercebia se estávamos a ganhar ou não… E de tarde, como tivesse de ir à igreja para a reza do terço, estava em silêncio com a cabeça no jogo do Porto, da equipa principal de futebol do F. C. Porto, e mal o saudoso Padre João tirasse a capa, com que dava a última bênção, eu e outros nos lançávamos para onde soubéssemos que havia um rádio a dar relato do jogo… Foi então, numa dessas tardes de domingo, que me ficou na cabeça um jogo em que o Porto venceu o Benfica em pleno estádio da Luz, por 2-1, com dois golos de Azumir. O jogador que nessa altura mais custava a sair nos rebuçados, sendo cromo raro para a coleção da caderneta que colecionávamos…

Quão mexia cá dentro sempre que ouvia o relatador, do som radiofónico, a berrar uma grande defesa do Américo - outro meu ídolo, até o que mais admirei sempre – e nas andanças da bola saber que lá estavam e andavam outros a mexer e remexer o esférico para a nossa causa, gravando-se no íntimo certa afeição aos nossos, que então compunham um naipe de grandes futebolistas, completada que era a equipa por nomes como Virgílio, Arcanjo, Festa, Jaime, Pinto, Hernâni…

Outra vez, ainda ficou mais nas recordações em ter ouvido entre Sportinguistas e Benfiquistas que nos saíria o pio numa ida a Alvalade. Mas não é que, aí, o Porto foi lá vencer, com mais um golo de Azumir..?! 

Ora bem, Azumir, como tal, é nome que prevalece Tal a fibra de “artilheiro” que nos entusiasmou e perdurará como vencedor duma Bola de Prata, como melhor goleador do campeonato, a primeira que me lembro de saber que um jogador do Porto ganhou.

Os referidos cromos, de gravuras dos jogadores de futebol, vinham embrulhados em rebuçados baratos, a tostão, ou seja um centavo (em tempo de moeda do Escudo) – coisa que agora, com a moeda em Euros já não tem equivalência, pois a mais baixa unidade, de 1 cêntimo, corresponde a dois antigos escudos. Recordando-se que um escudo andava à volta de cem centavos ou tostões, como se dizia popularmente, num enquadramento aos tempos que correm, das primeiras décadas do século XXI, em que um Euro equivale a duzentos escudos de antigamente (1 E = 200$00 arredondados, mais precisamente 200,482 escudos, na ocasião da entrada da moeda Euro, em 2002). E, naquele tempo, nos anos sessentas, com um tostão até se comprava bem mais coisas, também, bastando saber que com uma coroa, de cinco tostões (centavos), já se comprava um doce na Padaria (equivalente aos pastéis de hoje em dia, que custam em média oitenta cêntimos, cerca de cento e sessenta escudos antigos), para o que servia a coroa que se ganhava em ir na “Cruzada” aos enterros...  

Depois, enquanto memorização dos inícios da década de sessenta do século XX, entre jogatanas no recreio da escola e andanças pelos caminhos da Longra, apareceram aos ouvidos, nas conversas sobre futebol, os nomes de uns Festa, Nóbrega, Almeida, Alípio, Joaquim Jorge, Valdir, Atraca, Vasconcelos, Rolando... dos que foram passando a envergar a linda camisola azul e branca. Enquanto o grande ídolo desse tempo, o guarda-redes Américo, ganhou em 1963/64 a primeira “Baliza de Prata”, trofeu então instituído para premiar o guardião mais regular, sendo ele o menos batido (havendo sofrido só 17 golos em 25 jogos, enquanto Carvalho do Sporting encaixou 19 em 23 jogos e Costa Pereira do Benfica 24). Ao passo que na Volta a Portugal, na sequência desses anos, se sucederam vitórias por Mário Silva, José Pacheco e Joaquim Leão, ciclistas de azul e branco vestidos.

Américo… Américo sempre!

Então, quando eu era pequeno (em idade, na infância, entenda-se), sendo Portista por intuição de bom gosto, como sempre julgo que tive, e paixão por encantamento do que me entusiasma, tinha na cabeça, quase por entre os livros e cadernos escolares, os nomes dos jogadores do Porto, imaginando-os de cara pelo que via nos populares cromos da bola, que circulavam entre nós, moços da escola. E o Américo era o que mais admirava, o que me seduzia ao ouvir os relatos domingueiros dos jogos pelas suas defesas: - Américo voa para a bola, blocando o esférico…! - Américo, entre vários jogadores, afasta o perigo… - Américo segura a redondinha, espetacularmente! (ouvia nos emissores do Norte Reunidos, porque as emissoras de Lisboa pouco davam do Porto) – Nem só os pássaros voam, Américo quase dá com as costas na trave, lançado em voo elegante…”

Até que… Depois, quando pela primeira vez entrei num campo em que jogava o Porto, foi com os olhos no Américo que senti melhor como gostava daquele Porto…

(Foto) = Muitos anos depois, com Américo, o guarda-redes de futebol, mais o hoquista Cristiano, grandes ídolos portistas! =

A propósito, nunca é para mim demasiado lembrar Américo, por quanto ele foi referência e representa na história do F C Porto e do desporto nacional. Américo que foi o grande injustiçado do futebol português, quanto a internacionalizações pela seleção dita portuguesa, como ficou para a história. Mas, apesar de tudo, foi o melhor guarda-redes português da década dos anos sessentas. Em tempo do sistema BSB (do sistema das presidências federativas circunscritas a serem comandadas por homens de Benfica, Sporting e Belenenses). Américo era o melhor guarda-redes português, mas no Mundial de 1966 ficou a ver os jogos no banco de suplentes, porque tinham que jogar os dos clubes dos dirigentes federativos. Motivo porque do lote dos 22 “Magriços” (como foram chamados os futebolistas dessa campanha), do F C Porto só o defesa Alberto Festa pôde jogar e apenas em metade dos jogos dessa fase final. Ficando Américo e Custódio Pinto a suplentes, enquanto Nóbrega, que até chegou a ter feito o fato oficial para o efeito, ficou fora a ver os jogos pela televisão, preterido quase nos últimos dias, indo em sua vez um que jogava num clube pequeno mas que estava já comprometido com um dos clubes grandes de Lisboa.

Atendendo a essa simpatia que Américo sempre me merece, foi com grande prazer que mais tarde, já em Outubro de 2016, pude visitar seu museu particular e ver bem diante dos olhos a camisola que ele vestia e outras recordações dessas eras. Sendo com muita honra que fiquei ao seu lado em fotos que guardo, das quais aqui reporto uma…

(Foto) = Com Américo, em visita a seu museu particular…

Voltando a acertar o passo, retomo as lembranças daqueles tempos antigos, nos começos da década de sessenta:

Ainda tenho na cabeça o dia da minha 1ª Comunhão, estava para fazer 6 anos… Num dia feriado (soube mais tarde, pois na altura para mim todos os dias eram de livre trânsito, voando sobre a vida sem pensar, praticamente, como passarinho que me sentia). Minha mãe vestiu-me com todo o esmero um calçãozinho azulado-escuro e uma blusa branquinha, tipo blusão de pano como se usava então em ocasiões especiais… e umas meias brancas, que, estando ela ao meu lado na igreja, me lembro bem de olhar e fixar, enquanto de cabeça baixa a ouvia sussurrar-me ao ouvido orações de preparação para receber a hóstia…

Por esses tempos, por ver o padre da freguesia a “dizer missa”, uma das brincadeiras em casa era recriar o que via o Padre João fazer no altar da igreja, embora num cortelho que havia em nossa casa; assim como juntava alguns dos amiguitos que brincavam comigo para os pôr com uma gaiola de arame que tínhamos, existente em casa para pássaros, e num arremedo de andor, eles transportarem em procissão, atrás de mim. Tal como, por ver os jogos de basquetebol da equipa da “fábrica nova” (Metalúrgica da Longra) me punha a tentar encestar uma bola num aro que os meus irmãos colocaram num muro. E como sempre gostei de coisas de género etnográfico, encantava-me ver os campinos do Ribatejo em filmes, como via nos documentários do cinema que via no salão da Casa do Povo ou nos serões para trabalhadores da Metalúrgica. Filmes esses que eram a preto e branco. Os meus colegas sabiam disso pois falávamos muito de preferências, até que um dia alguém me mostrou um recorte de revista com uma imagem dum campino e quando vi que o seu traje tinha muito vermelho, deixei logo de apreciar aquilo, por não gostar de tal colorido.

De permeio fui tendo participações coletivas locais ao integrar a Cruzada Eucarística das Crianças de Rande, de 1960 a 1964 (de que sempre guardei, junto com a patente, a minha medalhinha de membro); tal como fiz parte do escalão infantil do Rancho Folclórico (das Quatro-Barrocas) da Longra, de 1962 a 64; e como adolescente integrei de seguida a Liga Eucarística dos Homens de Rande de 1965 a 1973 (tendo guardado, além da patente de inscrição, religiosamente também a respetiva braçadeira identificativa, que era usada no braço em procissões e outros atos solenes).

De vincada recordação, perdurou na memória o Grupo Coral da Liga de Rande, que, tal qual a organização em que se inseria, durou até ao falecimento do Padre João, a 1973. Grupo que solenizava a missa paroquial, revendo tempos que afinal foram os últimos anos do tempo da Liga.

Entretanto, na transição juvenil, em Setembro de 1965 dera-se interrupção na frequência efetiva à terra natal, indo para a área urbana do Grande Porto. Tendo então ingressado no Seminário dos Capuchinhos em Gondomar. Roído de saudades logo ao partir, contudo algo amenizado por alegria de na véspera o Porto ter vencido o Benfica por 2-0, com golos de Nóbrega e Naftal, na estreia de Fernando Pavão. Tal como no ano seguinte, depois das férias grandes e nas vésperas de me ter de ausentar novamente para longe da terra do coração, o Porto bateu o Sporting por 1-0, com golo apontado por Carlos Baptista, em Setembro de 1966.

Contudo, sempre que havia regresso em tempos de férias, pelo Natal, pela Páscoa e no Verão, enquanto sobrevinha ânsia sequiosa em inteirar-me do que se passara na vida do F. C. Porto nesses períodos (sobretudo através do jornal “O Porto”, cujos números semanais sucessivos o meu padrinho me guardava), havia também como que sofreguidão de recuperação de tempo em atualização da terra amada, percorrendo todos os sítios para ver e rever locais e focos de atenção, inteirando-me de possíveis novidades e outras situações. Embrenhava-me então de novo na ambiência afetiva, convivendo com os amigos e conhecidos, dentro do possível.

Então, tal como já na escola primária antes acontecera, todos reconheciam alguma influência pessoal na cativação de simpatias clubistas, para o clube representativo do Norte, como também em aderências a predileções de outras áreas de interesse.

Estive assim, também, em 1967, integrado no núcleo fundador da ADEL – Associação Desportiva e Estudantil da Longra (junto com meu clã mais assíduo de brincadeiras juvenis, em tempos de férias grandes, cujo grupo desenvolveu no seu círculo restrito algumas atividades de fins culturais e recreativos, incluindo alguns improvisados bailes de quem não sabia dançar, isso tudo até inícios da década seguinte, contando também jogos de futebol com equipas de estudantes de outras freguesias.

No princípio dos anos 70, já a residir permanentemente de novo na Longra, como estudante externo, integrei ainda pontualmente, como atleta praticante, algumas formações episódicas do Futebol Clube da Longra (em jogos decorridos em campos de equipas visitantes, sendo época em que o clube não teve atividade regular, por falta de recinto próprio durante anos, depois que o antigo da Metalúrgica da Longra foi ocupado com aumento das instalações fabris).

Qualquer pessoa, para mais numa região do interior do país de brandos costumes, andava então totalmente a leste de ideias e situações políticas. E, afinal, como no decurso dos anos já vividos se tem constatado, embora sendo a política social coisa para se andar minimamente a par, atendendo às intenções e interesses, como que para não se andar no mundo só por ver os outros andarem, é, porém, como um mundo à parte que cada vez se revela mais, origem de menor apologia de convicções.

Antes, o tempo foi passado como ouvinte e atento leitor por todo o período histórico que meteu a guerra do ultramar, a morte de Salazar (que, na altura, teve repercussão porque, durante os respetivos dias de luto nacional, impediu transmissões diretas, na rádio, de notícias da Volta a Portugal em bicicleta...), passando pela primavera do regime antigo e todo um manancial de ocorrências, do que se ouvia nos noticiários e se podia ler, até aos alvores do 25 de Abril de 1974... Ao passo que a guerra do Vietname era apenas um tema que se ouvia nas notícias do Telejornal, mas já o golpe militar do Chile, pelas consequentes atrocidades cometidas, foi coisa que mexeu com a sensibilidade, segundo o que foi possível saber-se. Enquanto, também em Felgueiras se viveram tempos de mudança, na transição das presidências do Dr. Dias Ribeiro para o Dr. José de Barros, tendo, por esse tempo, negativamente haver acontecido a destruição da pérgula que embelezava o jardim do centro da então vila de Felgueiras. Houve ainda grande esperança de melhorias nas freguesias, a partir da presidência aberta do Dr. José de Barros, o qual criou muitas expectativas com históricas visitas às freguesias do concelho, contudo sem resultados práticos, culminando no seu afastamento por muito falada saída da Câmara (quando esses cargos eram nomeados pelo poder central, através dos governadores civis), sendo substituído no exercício pelo Prof. Freitas, vivendo-se sem relevantes novidades. Até à instalação de Comissão Administrativa presidida pelo Dr. José Machado de Matos, na sequência da queda do regime, sobrevindo posteriormente eleição sufragada de executivo liderado igualmente pelo Dr. Machado, começando então a espairecer o ambiente na transformação obreira, num horizonte, porém, de curta duração (ao que se verificou mais tarde, ou seja sem sequência em mandatos seguintes, tendo continuado Felgueiras a passar ao lado do desenvolvimento planeado, pesando as muitas possibilidades ante as realizações materializadas, até à atualidade).

Chegada a fase mediana à adolescência, concluí o ensino secundário alcançando o oficial Curso Geral dos Liceus. Ficando habilitado com o antigo 5º ano liceal, equiparado profissionalmente ao Curso Complementar/11º ano do posterior regime oficial de ensino (em tempo de escolaridade obrigatória de ciclo preparatório do antigo 2º ano). Percorrido trajeto estudantil que fora iniciado no já referido Seminário dos Capuchinhos, em Gondomar-Porto, depois continuado no ensino externo em que frequentei o Externato Eça de Queirós em Lousada e encerrado por fim com última fase letiva no Colégio de Vila Meã, de onde fui proposto aos exames finais no Liceu Nacional de Guimarães.

= Foto no Externato de Lousada – uma parte da turma da área de letras (4º ano do então ensino liceal).

Trespassado o percurso estudantil, com habilitações do Curso Geral dos Liceus, estive longo período, de cerca de três anos, à espera pela resolução da situação militar, em tempo de guerra colonial (apurado para o serviço militar, mas a aguardar incorporação além do tempo normal, que depois se não verificou por entretanto ter acontecido o “25 de Abril” em 1974, seguido do processo político de descolonização, até finalmente ser abrangido por lei de passagem à “reserva territorial”, em Fevereiro de 1976).

Havia começado a namorar com a “minha rapariga” em Agosto de 1973 e perante a falta de definição na vida, à falta de emprego e sem ir nem sair da tropa, entretanto, a coisa estava para não poder tomar decisões sérias.

Logo que tive resolvido o problema da “tropa”, enveredei (foi o melhor que se pôde arranjar…) pela carreira administrativa pública, entrando a 1 de Março de 1976 ao serviço na secretaria da Casa do Povo da Longra, que incluía ação social, cotização e benefícios de sócios da instituição e o então Posto Clínico da Casa do Povo.

Meses depois de iniciada a carreira profissional, em Maio de 1977, passei a estar integrado noutro organismo, dentro do mesmo setor e do próprio edifício, tendo ficado no derivado Posto Clínico da Longra (por opção da área de Saúde, na separação institucional então verificada de autonomia do referido Posto Médico, em vez de continuação nos serviços da Previdência Rural e Segurança Social), aquando de diploma governamental que integrou as unidades médico-sociais das Casas do Povo nos serviços médico-sociais de âmbito distrital. Passando então a ter vínculo aos Serviços Médico-Sociais do Distrito do Porto, mais tarde com denominação de Administração Regional de Saúde do Norte/Sub-Região de Saúde do Porto.

Inicialmente, como funcionário eventual fora ganhar ordenado de 4.000$00 (quatro contos, conforme se dizia, ou seja quatro mil escudos na moeda desse tempo, que em conversão atual daria 20 Euros), tendo sido efetivado em Julho imediato com vencimento de 5.000$00. Na transferência para os SMS passei, desde Maio do ano seguinte, a receber 6.800$00. Até nem ganhava mal, a correspondência aos tempos posteriores é que não é muito fácil de cambiar, pela grande transformação por que tem passado o país em desvalorizações monetárias e aumentos de custo de vida, com a inflação que sucessivamente e cada vez mais se tem verificado (sobretudo a partir da mudança para a moeda Euro)...

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Recordando: Uma inspeção do famoso Fontinha ao Posto Médico da Longra

Dizem-me os meus quase quarenta anos de serviço público que a distância delapida melhor um percurso de vida. Embora, tal como quando se constrói uma casa, nossa, ao findá-la é que se devia estar a começar, para melhor aproveitamento; também ao findar uma carreira, no caso profissional, se ficou a entender determinadas situações e a conhecer melhor as pessoas.

Ora, passando adiante disso, por ora, fica porém o sabor dileto dos bons momentos. Como de tanta peripécia vivida no decurso do emprego mantido no Centro de Saúde da Longra, desde o inicial Posto Clínico da Casa do Povo, até ao Centro de Saúde, que popularmente sempre foi e será o Posto Médico. Daí que durante muito tempo eu fosse conhecido, primeiro por Pinto da Casa do Povo, e mais tarde por senhor Pinto do Posto Médico…

Pois então, no meio de infindáveis e engraçadas situações (a par com horas lixadas, que mexeram com um tipo, por mais calmo que fosse!), houve uma situação que não mais esquece. Passada com um antigo inspetor da entidade distrital de saúde, dos Serviços Médico-Sociais do Porto, a que estavam ligadas as unidades, quer no tempo em que se incluíam nas Casas do Povo, quer mais tarde na anexação ao serviço nacional. Sim, num tempo que dava para haver funcionários a fiscalizar as funções de outros, vindo então certos fiscais administrativos, por assim dizer, desde o Porto, para ver e passar a pente fino as escritas, como se dizia, dos chamados postos médicos. Sendo à época muito temido (na boca de colegas mais antigos) um senhor conhecido por Fontinha, algo rígido, mais pela sua sisuda postura, além de ser muito exigente e minucioso na examinação das papeladas. José Fontinha, de nome mais completo, como assinava por fim os relatórios (embora nos registos biográficos apareça publicado Fontinhas, porém sempre foi mais conhecido por Fontinha, enquanto ele nunca ripostou a esse tratamento). Mas que, como alguém dissera e passamos a saber, se tratava de um poeta conhecido por um outro nome, Eugénio de Andrade, conforme o pseudónimo que escolhera para a autoria de suas obras literárias.

Daí que se entenda uma passagem dum seu livro:
«...Sou um homem que nunca fez da poesia uma carreira. Passei trinta e cinco anos a fazer inquéritos e processos disciplinares, sem o menor gosto mas com grande sentido de responsabilidade, e escrevi a poesia de que fui capaz nas horas que me deixavam livres a profissão de inspetor de uns serviços do Ministério da Saúde, que ainda aí estão, cada vez piores, ao que consta...» - Eugénio de Andrade (1923-2005), in “Poesia e Prosa”.

Pois sim, mas a quem o aturava, nas vezes em que ele aparecia no local do nosso emprego, não havia poesia nos contactos cara a cara. Não dando muito uma coisa com outra e, a quem conhecesse suas composições poéticas tal não diria que eram dele, muito menos quem estivesse a leste perceberia como podia ele ser um vate na matéria. Apesar disso, pessoalmente eu até simpatizei com ele e nunca tive queixa. Aliás, por das poucas vezes que trocamos algumas palavras, uma ocasião se ter proporcionado para ele se aperceber que eu tinha certa simpatia pela literatura, deu para, passados anos, ele me ter autografado um livro, que mantenho com apreço – apesar de eu nem ser muito apreciador de poesia livre, quase sem rima, mais voltado sempre a melodiosas rimas declamadas.

Enquanto isso, o que via com o Fontinha, nas suas vindas ao Posto Médico da Longra, dava para espairecer o pensamento, por estar sempre a estudar o ambiente derivado e fazer analogia dum quadro situacionista ao outro facto. Mas pude presenciar ocorrências divertidas, quase cómicas, para não dizer mais.

Aconteceu de uma das vezes, quase no início da minha carreira profissional, uma dessas tais. Estando ainda a trabalhar lá, na parte médica dos serviços da Casa do Povo local, o senhor Gomes, da Pedreira, um simpático senhor já idoso, pois acumulava esse emprego com uma reforma (aposentado que era dum emprego que antes tivera em Lisboa e, ao regressar à região natal, conseguira esse extra para aumentar o vencimento mensal). Chefiava o Posto o senhor Cunha (Agostinho Cunha), trabalhando em secretária ao lado o sr. Luís (também Cunha), como se sentava mais à frente a D. Emília Costa (esposa do antigo funcionário sr. Jaime). E, entre nós, contando comigo que era o mais novo no serviço, trabalhava também como novato o Miguel. Então ainda jovem despreocupado, nada parecido com o mesmo Miguel Lemos que passou muitos anos no próprio Posto da Longra, que chegou a chefiar mais tarde. Por isso, numa das fiscalizações que o Fontinha estava a vasculhar, calhou do Miguel ter de dar conta duma das suas funções, ele que nesse tempo tinha a seu cargo a correspondência postal e por conseguinte os respetivos registos, de envios e gastos de selos. E o senhor Luís Gomes, a fazer serviço de retaguarda, como hoje se diz, andava mais ao brejo, em trabalho de terreno, de um lado para outro.

Então o Miguel, para o Fontinha o não apanhar desprevenido, antes de ele ir ver os livros e as pastas, fartou-se de tentar pôr tudo em ordem, tim tim por tim tim, e como pensou que lá estavam selos a mais, não coincidindo nas suas apressadas contas os selos registados com os que restavam, tratou de esconder os que pensou estarem a mais. Só que o tal Fontinha, fuinha como era, escarafunchou por todos os lados das parcelas e não é que descobriu que as contas estavam mal, faltando uns tostões na soma das verbas…?! E, de imediato, diz-lhe de chofre:

- vá, jovem, isto está errado. Ponha já aqui a diferença. Tire lá o dinheiro de sua algibeira, e reponha o que falta, ora vá… (deixando o Miguel de boca aberta, muito admirado e de testa franzida, por nem saber muito bem a que propósito vinha isso da algibeira… enquanto nós, sufocando o riso entre dentes, nos divertíamos com a reação do Miguel ser obrigado a pôr de seu bolso a “massa”, apesar de se tratar duns trocos…)

Entretanto, estávamos nesse pé, quando entra o senhor Gomes na secretaria, esbaforido, a arfar pela caminhada de ter ido ao correio, onde levara cartas à estação do Correio da Longra. Com sua barba por fazer, como era costume dele, vendo-se-lhe a cara com brancos pelos da barba de pelo menos uns dois dias sem ter sido cortada. Estava-se nos primeiros anos após o 25 de Abril, mas ainda havia resquícios de outros tempos, quando os funcionários públicos eram obrigados a apresentar boa aparência. Então, mirando-o de cima a baixo, o senhor Fontinha dispara:

- Ó homem, o ordenado não dá sequer para lâminas? Como pode andar aqui com esse aspeto?

Todos ficamos à espera do que ia sair. Ao passo que o sr. Gomes, desculpando-se, ripostou, a tossir no seu catarro de fumador (como quem diz que nem tinha tempo, por morar longe, o que nem era muito o caso, de permeio com sua linguagem de português arcaico):

- Ó, ohhh, ora, ora, se eu saio de casa de noute e entro de noute…

Todos afilamos os sentidos, à espera de mais uma reprimenda. Mas eis que o Fontinha, poeta como era, e apreciador da linguagem clássica, teve então um remate épico, todo apreciativo e muito sensível…

- Noute... muito bem dito. Sim senhor. É assim mesmo. Esse português até me enche o peito. Noute... muito bem dito! (Foi repetindo com trejeito de apreço. Quão até esqueceu a esquálida aparência do senhor Gomes.)

Num baque, lá ficamos todos a olhar uns para os outros. E mal ele se foi embora, logo que o Fontinha nos deixou em paz, nos fartamos de rir com aquilo. Tanto que ficou para sempre entre engraçados ditotes memoriais, nas nossas recordações do tempo passado na secretaria da Casa do Povo da Longra.

***

Então, já eu escrevia artigos também regularmente, com alguma colaboração publicista, inclusive no jornal “O Porto” (do F. C. Porto), além de colaboração ao local “Mensageiro da Longra”, no pouco tempo de respetiva existência; e, por esses tempos, andava já a recolher dados sobre a história da freguesia natal e da região concelhia, começando a alinhavar hipótese de escrita de uma monografia local, em vista do que se notava faltar, atendendo às incorreções e esquecimentos que iam aparecendo na imprensa periódica e oficial de Felgueiras, bem como para procurar elevar a mística local, através da preservação da memória coletiva.

Entretanto casei a 24 de Setembro de 1977, na igreja paroquial de Rande, em cerimónia nupcial iniciada pelas 15 horas da tarde desse sábado.

A missa, celebrada pelo Padre Arnaldo Meireles, amigo do noivo e do qual fora (meu) professor de História no Externato de Lousada, teve acompanhamento de cânticos por grupo formado para a ocasião através de antigos componentes do Coral da Liga de Rande. A reportagem fotográfica foi efetuada pelo amigo sr. Fernando Timóteo, fotógrafo do jornal O Porto. E, entre testemunhas presenciais de familiares e companheiros, tive como convidados também representantes dos hoquistas do Porto, havendo estado presentes à cerimónia e no banquete os irmãos Barbots e o Jorge – o que motivou, depois pose fotográfica impressa n’ O Porto de 19/10/1977, sob título «Um Colaborador “passou-se” para o grupo dos casados».

Na nova situação familiar, ficamos a residir inicialmente na Longra em que eu sempre vivera, mas, como ficara em casa cedida temporariamente (porque a casa entretanto alugada teve obras prolongadas e depois houve quebra de compromisso pelo arrendatário, no lugar do Monte da Costa), verificando-se falta de habitações na área, depois tivemos de transitar para residência alugada na vizinha freguesia da Pedreira durante alguns meses, no lugar do Crasto, perto da ponte da Sorte. Para logo mais, mal apareceu oportunidade de casa vaga, termos regressado à povoação da Longra, ficando a residir no lugar da Estação, bem na freguesia de Rande.

De permeio, a 18 de Julho de 1978 passei a ser Pai, com o nascimento do Nuno Cristiano, dado à luz com 50 cm e 3, 400 Kg, pelas 03, 55 horas da noite dessa terça-feira. Tendo a 7 de Março de 1982, com o nascimento da Clara Isabel, vinda com 50 cm e 3, 450 Kg, pelas 10, 35 h da manhã desse domingo, então ficado concretizada realização familiar – completando a soma de meu casal de filhos, ambos oficialmente naturais de Rande, conforme foram registados (embora nascidos, respetivamente, nas maternidades do Hospital da Misericórdia de Lousada e do Hospital de S. João no Porto).

Enquanto de 1982 a 1985 construí e materializei edificação de casa própria no rincão natural, sita em frente à casa dos meus pais, onde nasci e vivi, com mudança e primeiro dia de habitação na nossa casa a ter ocorrido no sábado 1 de Junho de 1985.

Nesses ínterins, durante alguns anos, em início da carreira profissional, quando funcionário da Casa do Povo e depois do então Posto Clínico da Longra, acumulei funções a meio tempo com responsabilidade do funcionamento da Sub-Delegação de Barrosas, dependente da Casa do Povo da Longra, como do posterior Posto Clínico da mesma localidade, ao tempo ainda dependente até 1979 do Posto da Longra. A partir daí continuei em exclusividade no quadro do vulgarmente chamado Posto Médico/Centro de Saúde da Longra (na evolução das suas denominações), onde, depois de algumas promoções ao longo de diversos anos, atingi a categoria de funcionário Assistente Administrativo Especialista de Saúde, da atual A. R. S. Norte/Sub-Região de Saúde do Porto.

Enquanto isso, na terra-natal a autoestima coletiva era coisa que ao povo pouco dizia, andando a população quase a leste das ocorrências e sem grande noção das realidades, tendo sido permitido pelos votos populares que a representatividade autárquica local se arrastasse sem obra de vulto, deixando passar ótimas oportunidades de progresso. Dessas ocorrências ficaram registadas algumas considerações no Memorial Histórico de Rande e Alfozes de Felgueiras, no capítulo da Organização Administrativa em Rande.

Mantendo-me sempre, durante esses anos, no mesmo local de trabalho (e instituição local, de que ficou registo histórico personalizado também no livro Memorial Histórico, não necessitando assim de repetição quanto a apreciações e enumerações), enquanto colegas mais antigos se foram transferindo, passei a ser desde 1992 o Responsável Administrativo do mesmo Centro de Saúde da Longra–Extensão do Centro de Saúde de Felgueiras. Para cuja instalação definitiva contribuí, intervindo como interlocutor com necessidade de decisão, em 2001, aquando da transferência de local (tendo estado em risco a continuidade da mesma Unidade de Saúde na Longra), de que derivou posteriormente a implantação das instalações de raiz noutro terreno pertencente da Casa do Povo da Longra e daí resultou o novo e atual edifício do Centro de Saúde da Longra, cujo processo foi concluído em 2004. Um bem público este onde, enquanto lá estive, ultrapassei tempo de serviço de quaisquer outros funcionários, ou seja, durante alguns bons anos cheguei a ser o mais antigo dentre os administrativos, médicos e enfermeiras/os que desempenharam e exercem funções na Unidade de Saúde da Longra (cuja relação também foi arrolada no referido livro), quer contando a era da Delegação Clínica e Posto Médico da Casa do Povo, como depois na época do Posto Clínico e Centro/Extensão de Saúde da Longra.

Ainda que integrado no meio envolvente, onde por norma não ia havendo muita gente interessada em valores culturais e focos de aculturação, também me fui mantendo, mesmo assim, interessado por assuntos que sempre me despertaram apreço, como a literatura, por exemplo. Admirador de autores clássicos, com relevância para Camilo Castelo Branco e seus enredos vernáculos de realismos descritivos. Como também sobre o introdutor do Romantismo em Portugal, Garrett, autor do Cancioneiro Português e de Viagens na Minha Terra; mais Alexandre Herculano das Lendas e Narrativas e da História de Portugal monumental (Portugaliae Monumenta Historica); e diversos mais cultores de escrita estudiosa. E, especialmente, livros historiadores temáticos. Sem grande valorização, na inversa, para modernices de escrita, nem autores de novas vagas saídas de campanhas sócio promocionais.  

Debruçado assim sobre temas de leitura, quando à mão há o que mais vai despertando interesse, tais momentos tornam-se ainda mais aprazíveis a ouvir, por fundo, melodias ou músicas quase sussurrantes aos ouvidos. 

Noutras atividades públicas, de âmbito social, incluí a formação de mesas de voto de Rande em alguns atos eleitorais, a primeira vez das quais em cinco de Outubro de 1980; depois fui Secretário da Junta de Freguesia de Rande, de Janeiro a Março de 1983 (durante cerca de 3 meses apenas, por me ter demitido em discordância com alteração verificada no rumo de gerência e atendendo à falta de realizações, comparativamente ao que me fora afiançado anteriormente e prometido ao povo durante a campanha eleitoral...), transitando então para Presidente da Assembleia de Freguesia de Rande desde aí até 1989. Tendo, mais tarde, voltado a ser membro e presidente da mesma Assembleia de Freguesia entre 1998 a 2001.

Pelo meio, além de associado, fui colaborador do Centro Cultural e Recreativo da Longra, instituição existente de 1978 a 1980, onde escrevi no respetivo jornal saído a público em 1978 (durante quatro números editados), como fiz o desenho original de que resultou o distintivo/logotipo do mesmo agrupamento. Após o seu desaparecimento, ainda tentei (com outros sócios) promover a realização duma Assembleia para resolução existencial, mas tivemos de esperar sentados...

Mais tarde, em exercícios associativos locais fui Vice-presidente da Associação Casa do Povo da Longra de Março de 1994 a Dezembro de 1996; e Presidente da Direção da mesma Associação desde a gerência iniciada em Dezembro de 1996, cargo que mantive após sucessivas reeleições para novos mandatos, até Setembro de 2006. De permeio fui, juntamente com minha esposa, co-fundador do Rancho Infantil e Juvenil da Casa do Povo da Longra, criado em 5 de Maio de 1994, do qual fui Presidente também até 2006. (Entretanto chegara antes a anunciar desejo de substituição, em 2002, mas então não tive como não aceder ao que me foi pedido em palco e até em célebre comemoração, conforme uns versos emoldurados e outras recordações que guardo ainda.) Tendo, por fim, pedido a demissão desses cargos no Verão de 2006, embora mantendo-se no lugar enquanto houve compromissos assumidos, até Setembro do mesmo ano, dando vez a outros ao fim de doze anos de existência do “meu” Rancho e das próprias lides diretivas na Associação.

Na sequência dessas atividades, anteriormente, em colaboração com elementos de respetivas comissões que formei para o efeito, consegui organizar algumas exposições temporárias, através das quais estiveram patentes ao público objetos e ilustrações evocativas, como as da ”Memória Etnográfica da Longra” e ”1ª Mostra Filatélica e Exposição Museológico-Postal da Casa do Povo da Longra” em 1995, “Memória Fotográfica de Rande” em 1996, “Espólio do Rancho Infantil e Juvenil da Casa do Povo da Longra”, em 1998 e 1999, e “60 Anos da Casa do Povo da Longra” em 1999; resultando disso que, a partir de 1999 criei uma mostra permanente do museu etnográfico e historiador (de recolhas de objetos, alfaias e recordações) do Rancho da Casa do Povo da Longra; e em 2004 uma galeria foto-documental da memória histórica da própria Casa do Povo, nas instalações da mesma instituição.

Nessa posição, à frente da Casa do Povo (e já muito depois de ter dado vez em cargo que, de permeio, ainda exercera na presidência da Assembleia do clube de futebol local, tendo sido no mandato da Direção seguinte, em 1998, que o mesmo clube deixou de ter atividade), foi também possível ter-se procedido à salvaguarda das taças do Futebol Clube da Longra, tendo acudido a valer da destruição ao que foi possível salvar, entre o que não desaparecera entretanto, do património histórico-museológico do extinto F. C. Longra: Havendo-se guardado e exposto na Casa do Povo da Longra esse material – do que estava no antigo balneário do clube, de portas escancaradas, depois que o FCL desapareceu e a sua última Direção não mais ligou a nada...!

Tempos de esforçado labor, porém esforço entusiasta que era e foi sendo contrariado pelo ostracismo do poder municipal, porque a Câmara, ao que se foi notando, nas gerências desses anos, nunca teve grande simpatia por tudo o que fosse da Longra, como aliás também da região sul do concelho de Felgueiras, comparativamente ao que foi sendo atribuído a terras, instituições e agrupamentos de outros quadrantes.

Naturalmente que tudo, do que se procurou fazer, teve a melhor das intenções, mediante possíveis ações construtivas. Entre isso, a constituição do museu etnográfico, instalado na Casa do Povo, teve um carinho especial, pela ideia de salvaguarda da memória física de antigos artefactos da região.

(Esperava eu que as sucessivas Direções seguintes e seus representantes, do respetivo organismo associativo, no imediato presente e depois no futuro, ainda tivessem suficiente cultura para saberem entender e sobretudo respeitar o trabalho legado... naquilo que foi criado em 1999. O que pelo contrário teve outro rumo, com invenções de desculpas de outros aproveitamentos, qual desvirtuamento do seu carácter telúrico. Como, volvido pouco tempo começou a ser interpretado, logo dois meses depois da entrada de novos diretores, com parcial desmembramento acontecido em Dezembro de 2006, do mesmo museu etnográfico da Casa do Povo da Longra. Tendo a nova Direção da mesma Associação, após ter tomado posse em Outubro anterior, decidido dividir o anterior museu, que tinha acervo exposto em duas amplas salas contínuas. Ficando então depois dividido esse espólio memorial e tudo o mais em compartimentos, ao tipo de exposições separadas entre si, para criação de salas de reuniões e convívios... restando algo que ainda deve sobreviver, por enquanto, ao menos.)

Sensações especiais

Além dum natural sentido de ser e fazer algo útil, dentro do possível, de andar a par de tudo o que respeite ao que se gosta, de se sentir bem com o próprio e com os outros, felizmente que foi conseguido mais qualquer coisa, como uma ação das que mais orgulho proporcionam. Efetivamente, numa feliz ocorrência, acontecida numa tarde dum sábado, foi-me possível contribuir para salvamento de uma criança. O caso interessa apenas pelo final feliz, em resultado de ter valido a uma mãe que, com uma pequena filha inerte nos braços (retirada de uma poça de água, onde caíra) clamava junto à estrada a quem passava, aflita. À beira, ao que parece, não havia quem chamasse uma ambulância e o pânico não dera para outra reação. Então, quando ela já desesperava, por nenhum carro parar, nem ninguém aparecer a dar-lhe atenção, com o tempo a escoar-se, foi providencial uma ida da Longra a Felgueiras, com passagem por ali. Pois que, nesse lugar duma freguesia acima da então povoação da Longra, vendo aquilo, após parar surpreendido, depressa acorri e levei à pressa a desfalecida criança ao hospital. Podendo-se dizer que lhe salvei a vida – como a própria mãe me dizia anos depois, num acaso de encontro, ao apresentar diante de mim a jovem já crescida... Valendo a pena ter solicitamente parado o carro na ocasião, por ter podido ser prestável em oportunidade das que aparecem no caminho do chamado destino.

Sensação diferente aconteceu doutra vez, de estranheza súbita e alívio, quando por um triz não houve uma fatalidade, curiosamente quando estava prestes a viver uma realização há muito ansiada. Depois de tantos anos de trabalho e espera para conseguir publicar o livro da memória coletiva local, quando já estava a escassas horas de poder vê-lo impresso, precisamente na véspera da respetiva apresentação pública, só por mera felicidade não sucumbi eletrocutado (com um choque elétrico) no banho. Até parecendo haver qualquer coisa fadada... Ocorreu o facto ao entrar na banheira, só que houve feliz perceção, saltando fora antes de possível choque, quase que só chegando um pé a sentir a inicial leve contração (por descarga elétrica, como depois se descobriu, na verificação de passagem de corrente no aparelho de aquecimento da água). Há coisas...?!

Mas, voltando a folha para outra natureza, por entre algumas recordações do que pode ser, afinal, a força da vida, acresce quão importante é fazer alguma coisa pela existência própria ou de outrem, enquanto se cá anda; o que também terá significado, senão mais, pelo menos por se não andar no mundo por ver os outros. Tal quando se consegue ter alguma participação, de algum modo influente, na salvaguarda de qualquer construção, de acordar memórias. Nesse prisma, apesar de na terra natal nem ter conseguido muito isso, já aconteceu por outro lado ter podido ter alguma participação noutra terra vizinha, por exemplo. Pois, no plano interno, no que respeita à freguesia natal, apesar de ter algumas vezes procurado remar contra a maré, em criticar construtivamente algumas transformações, com vista a procurar chamar a atenção para a necessidade de certas realidades, o certo é que na igreja paroquial ocorreram alguns casos a desvirtuar a autenticidade histórica da casa comum. Enquanto, de outra forma, consegui inverter a situação quanto ao caso da igreja antiga de S Cristóvão de Lordelo, sobretudo. A partir de umas crónicas escritas no Semanário de Felgueiras em 2001, já que nos próprios livros editados pela Câmara Municipal era dada essa igreja velha como totalmente perdida, aparecendo escrito que já nada existia dela, quando ainda tinha as paredes de pé e pedras antiquíssimas a testemunharem sua importância, como igreja românica antiquíssima. Algo que despoletou uma série de acontecimentos, embora com muitos anos de espera pelo meio, incluindo o facto de ter havido entretanto publicação dessas crónicas na Internet. E, ao menos, ficou qualquer coisa a patentear a existência dessa que era a mais antiga igreja da região.

Acumulei sensivelmente em parte da década de noventa outros desempenhos comunitários, no tempo em que fui Presidente da Conferência Vicentina de S. Tiago de Rande e S. João de Sernande, de 1995 a 1997; e Presidente da Assembleia do Futebol Clube da Longra em coincidente período, durante as épocas de 1994/95 a 1995/96 (mas mantendo-me em funções até oficial substituição da seguinte Direção respetiva e nomeação de sucessora Comissão Administrativa, em Setembro de 1997). Em 1997 também integrei a Comissão Instaladora do Conselho Particular das Conferências Vicentinas de Felgueiras. E em 1997/98 fiz parte do Conselho Paroquial da Pastoral de S. Tiago de Rande.

Igualmente de 1998 a 2002, como Presidente da Direção da Casa do Povo da Longra, fiz parte de Comissão de Acompanhamento Social de Felgueiras, em representação da mesma Associação na parceria de instituições concelhias com a Delegação Local da Segurança Social.

Dessas e outras participações, em prol do bem comum, ficaram diversas experiências e perceções.

Tive também intercalada atividade autárquica na Assembleia de Freguesia, mas mesmo quando ausente de cargos não me mantive alheado. Houve até ocasião em que foi dito que havia quem não entendesse como é que, enquanto os elementos da Junta da época não mostravam qualquer interesse, alguém sem ser da Junta se podia preocupar, como andar sempre atento a tudo e levantar questões, quando na ocasião se tentava repor a verdade no caso do Edifício Nova Longra, que foi indevidamente registado fora do território donde pertencia o terreno em que foi construído... Tal qual no caso de Santana, quando se descreveu a realidade, mas só depois de polémica oficial (quando nova composição da Junta de Rande teve coragem, pela defesa da integridade da freguesia) e posterior decisão judicial verificada, a verdade pôde vir acima como o azeite... Como no que acontece, por outro lado, em saber-se que uma parte do lugar da Telheira era de Rande, conforme ficou registado, demonstrado e ilustrado no livro Memorial Histórico de Rande e Alfozes de Felgueiras, e inclusive constava do mapa municipal, mas só na ocasião dos Censos, de dez em dez anos, isso se tornava notório...

Por se estar com a mão na massa, pode acrescentar-se que o livro “Memorial” foi um marco especial na vida particular e vivência coletiva, também, pelo que entusiasmou, criou expectativas, como custou até ser publicado e pelo que representou então conseguir que a freguesia natal ficasse historiada. Algo que, passe falsas modéstias, não será fácil de repetir, além de precisa e metódica disponibilidade, também pelos custos necessários a uma reedição ou realização doutra obra do género, embora fosse até mais que desejável futura complementação, de atualização, para continuidade vindoura.

Passando por tudo o mais inerente e subjacente (conforme ficou aflorado numa das crónicas do livro de contos “Sorrisos de Pensamento”), quanto ao “Memorial Histórico de Rande e Alfozes de Felgueiras”, melhor que outras considerações, falam algumas apreciações e afirmações transmitidas, entre as referências recebidas:

(A cerimónia de apresentação, a 21 de Novembro de 1997) «decorreu sempre num verdadeiro ambiente de festa, chegando a ter momentos de elevada emoção. Sobre a apresentação propriamente dita, caberá referir as inúmeras comunicações elogiosas que pelos membros da mesa da assembleia foram feitas ao autor e ao valor da sua obra publicada... é uma obra literário-monográfica que nos conduz a épocas e vivências muito reais mas que, atualmente, nem sequer existem no imaginário de muitos de nós, pela doce ilustração que nos faz sobre um maravilhoso conceito de vida que existiu mas que em grande parte desapareceu... é um livro cuja leitura se recomenda e uma obra que faltava no meio literário Felgueirense e que corria o risco de ficar na gaveta por falta de apoios públicos ou privados, mas que em boa hora saiu à estampa graças ao pertinente patrocínio do Semanário de Felgueiras, na pessoa do seu administrador, Manuel Faria.» - in “Semanário de Felgueiras” de 28-11-1997 (entre diversos textos apreciativos de José Quintela, Armindo Mendes e Conceição Fonseca).

«...Uma obra muito esperada, mas que obstáculos vários impediram de publicar mais cedo...» - in “Jornal de Barrosas” de 27-11-1997.

«Armando Pinto, mais um escritor Felgueirense, apresentou publicamente o lançamento do seu livro “Memorial Histórico de Rande e Alfozes de Felgueiras”... Este projeto literário nasceu na cabeça de Armando Pinto no longínquo ano de 1974 e em 1991 estava pronto a ser publicado. O que veio a acontecer seis anos depois...» - in “O Sovela” de 28-11-97.

« (Do livro) já fiz um juízo que bem o enobrece...Você escreveu a Bíblia dos povos de Rande e Alfozes de Felgueiras onde nada falta, a história e a tradição dos lugares e gentes (Velho Testamento) e a mensagem iluminada (Novo Testamento) que, Deus o queira, seja um caminho aberto de progresso, felicidade e paz para essas terras de Promissão e para esse Bom Povo. Felicito-o sinceramente...» - Monsenhor-Padre Manuel Amorim, historiador, da Póvoa de Varzim, em missiva de 02-12-97.

«...Uma obra importante para todos aqueles que se dedicam ao estudo das localidades portuguesas... é um repositório da história do que é uma freguesia e um concelho... interessante livro que se lê com agrado e que relata a vida de uma freguesia onde ainda vale a pena viver...» - Dr. Paulo Sá Machado (“Das Letras e das Artes”), “Notícias do Tâmega” de 18-12-97.

«...Para lá das sete centenas de páginas, o autor abrange tudo quanto existe de informação total desta freguesia, um trabalho que levou bastante tempo a cozinhá-lo, pois sabemos dar esse justo valor, já que fizemos diversos trabalhos monográficos e sabemos muito bem os custos e sacrifícios que se têm de fazer para levar a bom porto estas tarefas...» - Dr. A. Lopes de Oliveira, em alocução cultural na “Rádio Clube de Fafe” a 6 de Março de 1998, então no seu programa “Dos Livros e dos Autores”. Texto depois transcrito no jornal “Notícias de Felgueiras” de 19-3-98.

«...Louvamos o autor e, bem assim, o editor deste belo trabalho monográfico de Armando Pinto, que nos dá este admirável estudo, contendo uma caminhada de mais de sete centenas de páginas. Consideramos que ele bateu o recorde de paginação no tocante a freguesias. Que saibamos este excedeu em tudo o que se tenha imprimido... Acerca deste precioso estudo, de que mais uma vez sublinho o seu total interesse e que sirva de exemplo a outros autores que estudem as suas freguesias...» - A. Lopes de Oliveira, in “Notícias de Guimarães” de 17-4-98, como no “Notícias de Vizela” de 24-4-98.  E, do mesmo autor-comentador, também na rubrica “Leituras” de um dos jornais de Fafe: « (Repetindo anteriores apreciações à obra e autor) ...É preciso que haja mais estudos monográficos assim das nossas freguesias...» -  no “Correio de Fafe” de 30-9-98.

«...Parabéns pelo belíssimo estudo monográfico que recolheu sobre uma freguesia – Rande – a demonstrar que é possível produzir grandes obras de temas aparentemente insignificantes... – Dr. Barroso da Fonte, em missiva datada de Guimarães em 03-01-2002.

«Armando Pinto trouxe a público, em 1997, um volume a que chamou “Memorial Histórico de Rande e Alfozes de Felgueiras”... (onde) perpassa toda a história local da freguesia de Rande e do concelho de Felgueiras... Vista à luz deste livro, feito por quem gosta da investigação e tem amor ao que faz, resulta num verdadeiro exemplo de como não é pelo tamanho das terras que se deve medir a sua grandeza social, industrial, intelectual, enfim a sua dimensão geográfica. Que ela foi berço de gente ilustre que faz grande a sua história, prova-o Armando Pinto pelas largas dezenas de nomes próprios que bem poderiam caber numa verdadeira enciclopédia...» - jornal “Poetas e Trovadores” de Janeiro/Março 2002.

«Li com interesse o livro Memorial Histórico de Rande e Alfozes de Felgueiras. Interesse, aquele, acrescido pelo fato que meus ancestrais maternos são de Felgueiras... Seu livro, retratando Rande, região próxima (de Jugueiros), com detalhes, deu-me uma ideia como teria sido a vida daqueles meus ancestrais. Escrevo-lhe, em primeiro, felicitando-o pelo seu trabalho...» - Eng.º Carlos Freire Machado, do Rio de Janeiro-Brasil, em missiva de 28-02-2004. E, do mesmo (estudioso de suas raízes familiares com proveniência de Felgueiras): «Tenho o maior apreço pelo seu trabalho, que não só é útil por registar o passado, como também serve de documentação para estudos futuros sobre o presente... Aqueles que escrevem, como o caro amigo, nem imaginam quais os caminhos que pode seguir sua obra. Ela poderá percorrer mundo, dependendo da ventura que envolve tudo e todos nesta vida.» - Eng.º Carlos F. Machado, em missiva datada do Rio de Janeiro a 27-03-2004.

«... De sua obra, tão esclarecedora nas minudências históricas, as informações foram e são para mim verdadeiras aulas dos costumes e monumentos portugueses dessa região de Felgueiras...» - Lygia Sampaio, de Salvador da Baía-Brasil (artista e investigadora, depois autora do livro “De Sam Payo a Sampaio”), em missiva de 17-6-2004.

«... Espero poder desenhar o título do seu novo livro “Remembranças Felgueirenses” que, a julgar pelos livros que me ofereceu e que estou lendo com o maior interesse e prazer, deve ser mais uma joia na sua riqueza literária. A propósito, gostaria que me dissesse o significado de “Alfozes”. Embora imagine o que é, desconheço o termo que não encontro nos dicionários que consultei...» - Armando (Lucas) Teixeira, em missiva datada de Piracicaba, Estado de São Paulo-Brasil, a 09 de Fevereiro de 2007.

Enquanto isso, foi-se continuando e mantendo permanente faina, de tudo o que despertasse os sentidos, ao nível de escrita, investigação, divulgação, mas também atenta ação e, dentro do possível, necessário protagonismo, como intervindo noutros aspetos culturais e bairristas.

Antes e depois, ainda, durante a participação autárquica como membro da Assembleia de Freguesia, além de pugnar sempre pela afirmação telúrica, pelo progresso local e desenvolvimento cultural, como pelo ordenamento toponímico e pelo processo da aspiração da elevação da Longra a vila, fui em 1999, a pedido da equipa executiva da Junta de Freguesia, autor da proposta textual para a simbologia heráldica do Brasão da Freguesia de Rande (embora a mesma Junta de Freguesia, à época, tenha depois procedido a algumas alterações pontuais, e sobretudo imposição de cores, na proposta oficial feita em 2000 à respetiva Comissão de Arqueologia e Heráldica, quando o respetivo brasão perdeu o símbolo que relacionava à História local... conforme foi, posteriormente, aprovado em Setembro de 2003).

Em 1999/2001 estive incluído numa Comissão para criação da Toponímia de Rande, nomeada em Assembleia de Freguesia, a qual não teve efetividade por parte da respetiva Junta de Freguesia.

Em 2002 fiz parte de nova Comissão para o Ordenamento Toponímico de Rande, escolhida pela Junta de Freguesia em Março desse ano, tendo sido desenvolvido o processo da inventariação das vias de comunicação e atribuição dos nomes (de cujo trabalho eu próprio elaborei as respetivas atas, a relação apropriada e o relatório de informação e conclusão, documento que teve aprovação em Assembleia de Freguesia a 23 de Abril seguinte e foi entregue na Câmara Municipal de Felgueiras em 30 de Abril do mesmo ano para a devida aprovação; o que veio a ocorrer oficialmente cerca de dois anos e tal depois... em Dezembro de 2004 – embora, na decisão, fosse aprovada com cortes e alterações introduzidas, com certas intenções, em nome de uma comissão oficial instalada para formalização de despacho).

Como estudioso da história local, em resultado de ter escrito a monografia histórica da freguesia, servi de testemunha, depondo no mês de Agosto de 2002, no processo judicial de defesa da integridade do território da freguesia de Rande, no caso do monte de Santana (que pôs em confronto a Junta de Rande com a de Idães, a propósito de processo movido pelo então proprietário do terreno em causa, quando em Julho de 2002 fora pela autarquia de Idães arrancado o marco de delimitação e invadida propriedade, de cuja contra-ordenação em Setembro seguinte houve despacho favorável e em Novembro imediato sentença vitoriosa para Rande). E fui, também em 2002, autor do original da Proposta de Lei para a Elevação da Longra a Vila, a pedido da Junta de Freguesia de Rande (de que resultou, depois, a respetiva apresentação oficial por meio de deputados subscritores e posteriormente a aprovação da Vila da Longra pela AR a 1 de Julho de 2003).

Convirá notar que foram três as propostas entradas na Assembleia, através dos partidos PS, PSD e CDS, sendo depois votadas em conjunto, simplesmente a que ficou oficializada foi a do PSD, ou seja a proposta pela Junta de Rande e apresentada pelo Grupo Parlamentar do PSD, visto nas outras duas ter havido inclusão de Unhão, freguesia que no fim não ficou integrada na vila. Aliás como registei na escrita do livro “Elevação da Longra a Vila”, publicado dias depois, nos princípios de Julho de 2003.

Nestas atitudes e ações, quer colaborando com a Junta de Freguesia de Rande quando a sua composição era de elementos do Partido Socialista, até 2001, como, depois, a partir de 2002 a sucessora gerência passou a ser do Partido Social Democrata, houve apenas e tão só intento de contribuir e defender a freguesia natal, sem outros fins nem segundas intenções, não olhando a nomes ou posições mas unicamente aos interesses da terra do coração. Tal como, tendo subjacente desejo de que houvesse fortalecimento da mística local, atendendo a vislumbre de algum desconhecimento e certo desinteresse para com o passado conterrâneo, ou seja a memória coletiva, houve oferta pessoal de quadros emoldurados a expor material fotográfico de interesse histórico local, para exposição pública permanente na sede da Junta de Freguesia de Rande. Como, entre possíveis exemplos, cedi material fotográfico histórico para decoração de outros espaços públicos, como foi o caso de fotografia que, depois da necessária ampliação, ficou em lugar de destaque na farmácia da Longra e uma outra num café da região.

Nesse sentido e com idêntico objetivo, sempre estive disponível para demais colaborações solicitadas ou necessárias aos interesses da terra, como aconteceu na co-autoria de um livro em 1996 e oferta de outro de própria autoria em 2003, em ambos os casos para fins de angariação de receitas para benefícios paroquiais; assim como, graciosamente também, em 2003 e 2004 na produção do Boletim Informativo da Junta de Freguesia, como desde 2004 no Boletim Informativo da Comissão Fabriqueira da Paróquia (nos números que se editaram, por ora), entre outros exemplos.

E, porque é de notar também, a quase totalidade dos livros escritos foram, na sua maior parte, dirigidos e são dedicados à freguesia de Rande e à Longra povoação e vila, como ao concelho de Felgueiras.

Apesar de feitio algo discreto, não gostando muito de me mostrar em público ou subir a palcos, como a tribunas e deitar faladura, mas antes preferindo trabalhar na área organizativa, por trás, como se diz, tive entretanto ainda algumas funções coletivas de organização, além dos cargos e desempenhos institucionais de permeio exercidos. Assim, estive incluído em 1996 no grupo que recuperou a tradição das Marchas de S. Tiago de Rande, como em 1997 na comissão organizadora que criou o Desfile de Carnaval da Longra, de iniciativa de representantes da Associação Casa do Povo da Longra; e em 2004 na implantação do Carnaval da Vila da Longra, desde então organizado em parceria da mesma Associação com as Juntas de Freguesia da vila. Assim como em 2004 na reedição da Feira da Longra, inicialmente recriada pela Direção da Associação Casa do Povo e depois continuada junto com os representantes das instituições autárquicas. Tal qual integrei as comissões promotoras das comemorações dos sucessivos aniversários da Vila da Longra, até 2006.

Quando requeridos préstimos, estive igualmente disponível para colaborar com outras terras do concelho de Felgueiras. Conforme ocorreu já com participação solicitada e concretizada em curta prestação para um trabalho realizado pela Escola de Sernande (datilografado nos originais e fotocopiado nos exemplares distribuídos), volume esse escrito pelas respetivas professoras sob título “Minha Terra, Minha Escola, Minha Gente”, no ano letivo de 1992/93. E mais profusamente com um longo artigo no livro oficial das Festas das Vitórias da Lixa, em 2000. Bem como na autoria do livro historiador de S. Jorge de Várzea, em 2006. Além de no Memorial Histórico de Rande e Alfozes de Felgueiras, publicado em 1997, haver referências às freguesias da área sul do concelho, como ali está guardada a história da Honra, do Julgado e Concelho do Unhão, da Misericórdia do Unhão, do Concelho de Barrosas e do Concelho de Felgueiras. Assim como pugnei pela recuperação do que restava da antiga igreja românica de São Cristóvão de Lordelo, através de artigos escritos a partir de 2001 no Semanário de Felgueiras e nos meus blogues da Internet.

Pelo meio de tanta coisa, durante anos de intensa atividade pública a nível local, outras ocorrências foram passando, enquanto decorria a década de noventa até parecer uma eternidade... enquanto as ocupações bairristas e telúricas iam atenuando a espera, ânsia e frustração por o longo trabalho escrito sobre a memória histórica da terra natal não haver então meio de poder ser editado, depois de pronto para publicação em 1991 (quando foi entregue na Câmara, inutilmente) e ter chegado a estar num prelo em 1993, algo que, finalmente, com consequentes acrescentos de atualização, foi conseguido anos mais tarde, com a apresentação pública do “Memorial Histórico de Rande e Alfozes de Felgueiras” a ocorrer a 21 de Novembro de 1997. Tal qual com diversos anseios para a autoestima conterrânea que se demorou a alcançar.

Felizmente surgiram, entretanto, outras compensações íntimas, como o que se viveu, a partir de 1994, no percurso da criação, manutenção e vivência do Rancho da Casa do Povo da Longra. E derivada revitalização também em 1994 da instituição cultural Casa do Povo, transformada em Associação a partir de Dezembro de 1996. Embora com muitas preocupações e a ter de andar a acudir a todos os lados, engolindo muitas vezes determinadas situações para manter a estrutura... Mas, na reabertura da mesma casa, em Março daquele ano 94, como desde a fundação do Rancho, respetivo pioneiro grupo institucional, até se pensar que já funcionava por suas próprias linhas, foi-se conseguindo levar o barco a bom rumo, a dirigir essa nau ao longo de anos inesquecíveis, até Setembro de 2006. Afinal doze anos de presidência do Rancho, mas também de gerência da respetiva Associação-sede, pois que mesmo em curto período de exercício como vice-presidente tive de assumir sempre quase tudo, incluindo representatividades, quando o presidente só aparecia em palco para discursar em eventos públicos... E, depois foram mais os dez anos de presidência da Direção da Associação Casa do Povo, até dizer basta...

Enquanto isso e o mais, menos mal em sonhos, mas não materialmente para fazer face às dificuldades de manutenção das intenções culturais e associativas, à falta de apoios, felizmente não pensava tanto noutros assuntos sempre que o Porto foi sendo campeão e se ouvia, no apogeu, o tema “We are the champions”, dos Queen. Algo que se deseja sempre repetir, ano após ano, como no efeito de encher o peito ao ouvir “Somos Campeões” em plena erupção do estádio do Porto, tal como a expansão pelos ares que transmite instantâneo trautear mental da ode musical dos “Filhos do Dragão”.

Já a nível mais particular, de permeio, quanto a desempenhos comunitários, na missão de dirigente e empreendedor associativo-cultural, ainda que de feição diferente também iam aparecendo escolhos, pelo que muito ia tendo de ficar só nas intenções, embora algo fosse sendo contrabalançado nas vozes de outros, ouvindo alegres melodias por entre repiques de cavaquinhos e foles de concertinas, apreciando isso quanto fosse como largar emoção nos golos do Porto; e não tanto os sentimentos retraídos noutras ocasiões. Enquanto registava o que podia, literariamente. Escrevendo, afinal, ia-se fazendo explodir canções românticas que andam no compasso dos sentidos, como num compor de versos que os casos sérios das letras rimadas conseguem produzir, pois no bater das letras salta-se ao infinito das compensações. A Longra chegou a vila... e o coração estremeceu no preciso momento da votação, seguido de bem estar, um torpor pacífico indescritível. A Casa do Povo festejou grandes momentos, o seu Rancho enternecia, e o mundo até pareceu que parava os olhos apenas no palco onde estavam canseiras e sonhos misturados em paixão. Horas de convívio, bons momentos e ocasiões de contraste, noitadas de Janeiras, reuniões até mais não, dias de ensaios com e sem problemas também no consumo interno, contactos e laboração de expediente, excursões a levar o nome da terra ao perto e ao longe, esforço em prol da causa, tudo intervalado de horas de produção literária historiadora e de feição reivindicativa, a procurar elevar a ligação bairrista. Uma melodia sentida, de mãos nos bolsos e escrita de cabeça, quando não de mãos a abanar mas também a dedilhar sempre que necessário. Uma vida vivida, de forma tal qual a vida possibilita e se consegue realizar.

Isso e mais, na prática, acabou em parte por cair quase em saco roto, mais tarde, quando se deu a chamada reorganização administrativa do território e a partir de 2013 surgiu uma malfadada União das freguesias, que no caso resultou em fusão oficializada da Pedreira com Rande e Sernande, por culpa, primeiro dos políticos nacionais e depois dos locais que não olharam aos direitos históricos e permitiram que fosse riscado a régua e esquadro tal aberração; e depois ainda dos aderentes de partidos políticos que votaram a favor disso – alguns inclusive naturais e habitantes de Rande e Sernande, integrantes de listas e da primeira constituição da Junta e Assembleia da União, ou seja pessoas que foram pelos interesses dos residentes da Pedreira, parte que até já tinha maior poder de mobilização eleitoral pelo seu maior número de votantes; e a partir daí a região central da Longra e zonas circunvizinhas de Rande e Sernande perderam importância e hipóteses de progresso, por ora.

A nível bairrista, interventivo no torrão natal, fui passando a contribuir algo mais na retaguarda, depois de afastamento de lideranças e sobretudo trabalho efetivo em prol da terra, não podendo eternizar a presença física em tudo. Continuando atento aos possíveis interesses locais, dentro das possibilidades. Afastando-me de muita coisa por motivos de saúde, sem esquecer quão gratificante foi o envolvimento nalgumas realizações, através de colaborações com entidades representativas, a bem da terra, da sua cultura e identidade. E, curiosamente também, esclarecido em ficar a conhecer melhor (no pior sentido, obviamente) algumas pessoas e situações.

Como assim... A vida, com anseios, preocupações, devaneios e ocupações, decorre enfim na evolução das rugas de pensar, sorrir, laborar e sentir.

Tive sempre, além dos laços familiares, algumas afeições interiores e predileções íntimas, paixões de sempre, com a Longra e Rande, como obviamente Felgueiras, em lugar muito querido; a par com o Futebol Clube do Porto, algo especial; mais a escrita e leitura de temas de apreço; o estudo da história, particularmente a local mas também a de historial Portista e a da Pátria, que é como dizer memórias de instituições, símbolos e valores de gosto próprio; idem em colecionismo de adereços simbólicos e artefactos identificativos; fotografia de recordação; de ver com olhos de ver o que desperta sentimento e valor; arte clássica e antiguidades; literatura historiadora e de realismo clássico; perfeição em tudo que seja possível; entre outras afetividades, afinidades e características, sobretudo, em sentido genérico, quer de âmbito particular como na identificação natural à região Norte da nação, que tem pólo mais representativo na capital Invicta, e naturalmente ao país Pátrio, Portugal, e à terra Mátria, Felgueiras.

Nos alvos preferenciais de atenção, as paixões nunca desviaram, contudo, acompanhamento de atualidades, além do rincão natal, também do país e do mundo. No alcance daquele ditote afirmativo de que «quem conhece o seu povo, conhece o mundo todo» (do qual há variantes, naturalmente). Tendo gosto em ser de Portugal, até porque nunca seria possível ver-me a viver permanentemente noutro sítio fora da Longra... onde melhor se conhece tudo, até de olhos fechados. Aliás, dos poucos países visitados, dentro do que tem sido possível, o que mais ficou foi marca íntima de ida à Terra Santa; enquanto dos outros poucos pontos do mundo percorridos, em curtas excursões, pouco mais, além de sítios marcantes pontualmente, eles detiveram de especial.

Enquanto isso, ligando sempre a terra e o país natal ao resto do mundo, nota-se que a evolução universal tem sido em sentido inverso, descendente, desinteressante e hipócrita. Tornando numa falsa liberdade as imposições por decretos! Para mais feito por gente que só olha a seus interesses e roubaram o povo em direitos e regalias, como aconteceu a partir do início do século XX, mais precisamente desde a era do desaparecimento do escudo e entrada da moeda Euro. Sobrevindo entretanto uma forte crise monetária e por extensão também social e de valores, de modo vincado no estado de corrupção dos políticos da classe reinol, de entre os que andaram por lugares públicos com responsabilidades.

Tal como com as alterações temporais e profissionais, tudo se foi modificando. Quase ainda com os tempos de criança na cabeça, mas já bem maduro e com a vida contada em bastantes anos… Como pode ser que a vida tenha corrido tão depressa?

Há um poema de Carlos Tê que bem sintetiza isso tudo:

“É triste ser-se crescido e não ter mais rédea solta/ Ir descobrir o sentido Do mundo à nossa volta /É triste dizer adeus Aos nossos velhos cantinhos/ E ouvir a nossa mãe A mandar-nos ir sozinhos/ Ou que triste é ter de trocar os calções pelo colarinho apertado/ ter cartão de Identidade já com outro penteado/

É triste ser responsável, Guardar horas na cabeça /Ter tantas obrigações, Que fazem andar depressa/ Ai como é bom recordar Esse tempo de criança /Às vezes queria parar, Crescer muito também cansa."

Hoje tudo está diferente. Desapareceram muitas pessoas que conhecemos e estimamos, com quem convivemos e vimos envelhecerem. Quantas pessoas fugiram já de nossos olhos, dos que partiram “sem avisar". Até caminhos e estradas, de realidade e recordação, mais situações conterrâneas e bairristas, foram tendo alterações.

Com um percurso social e profissional de vida algo gasto, chegou enfim uma época do chamado descanso, também mental e sobretudo de azáfama.

Diz-se que o mais banal é as pessoas terem de esperar toda a semana pela sexta, todo o ano pelo verão, toda a vida por felicidade, à espera de qualquer melhoria da maneira de passar os dias. Ora, apesar das dúvidas e incertezas, derivado ao corte monetário pelo roubo que os políticos fizeram ao cidadão comum que descontou toda uma vida e afinal a reforma não é o que estava no papel, mesmo assim, resolvi não esperar mais, pois que seria arriscar, com enfartes no corpo e o ânimo abalado. Pensando então em transformar todos os dias em sextas-feiras, podendo assim estar sempre e a toda a hora com o meu neto Tiago nos dias dele estar em nossa casa, e com o Gonçalo todo o tempo que ele esteja na Longra, sempre que a Clara cá venha. Como seja até em aproveitar as quatro estações, sem precisar de estar a olhar para o relógio, mais a contar as horas e os dias, ansiando por feriados, mais as férias e outros períodos que tais.

Atividade Literária Pública

No percurso literário, dados os primeiros passos com um artigo publicado em 1967 na revista Jardim Seráfico, publicação anual que à época servia de crónica da Casa dos Capuchinhos de Gondomar, e depois de em 1974 iniciar andanças jornalísticas como colaborador do jornal O Porto (então órgão oficial do Futebol Clube do Porto), passei a dedicar-me a temas locais com primeira experiência em 1978 no jornal Mensageiro da Longra (do Centro Cultural e Recreativo da Longra, do qual fui autor do “risco” original do distintivo do mesmo grupo), ao que adveio posterior crónica que proporcionou uma Menção Honrosa nos III Jogos Florais de Felgueiras em 1984, seguindo-se colaboração episódica no Boletim Municipal da C. M. de Felgueiras e, então, daí em diante regular colaboração na imprensa periódica concelhia e obra publicada em livros.

Entretanto, além da escrita e pesquisa, em que fui autodidata, sem formação específica mas sim através de amador estudo próprio, tive todavia participação associativa quando em 1994 estive incluído no grupo de sócios fundadores da AEJAVAS-Associação de Escritores, Jornalistas e Artistas do Vale do Sousa; embora depois não tenha mantido muitas ligações sociais a meios literatos, ainda que haja participado episodicamente em sessões culturais na própria região, mais por força de cargos associativos desempenhados e autoria de publicações próprias.


DO AUTOR - Obras publicadas:

- Livro (volume monográfico) «Memorial Histórico de Rande e Alfozes de Felgueiras»; publicado em Novembro de 1997. Edição patrocinada pelo Semanário de Felgueiras.

- Livro (de contos realistas) «Sorrisos de Pensamento» – Colectânea de Lembranças Dispersas; publicado em Outubro de 2001. Edição do autor.

- Livro (alusivo da) «Elevação da Longra a Vila» - Julho de 2003. Edição do autor.

- Livro (cronista do) «Monumento do Nicho Nas Mais-Valias de Rande» – Dezembro de 2003 (oferecido à Comissão Fabriqueira paroquial, destinando receita a reverter para obras na igreja). Edição do autor.

- Livro «Padre Luís Rodrigues: Uma Vida de Prece Melodiosa» – Na passagem de 25 anos de seu falecimento; publicado em Novembro de 2004. Edição do autor.

- Livro «S. Jorge de Várzea-História e Devoção», publicado em Abril de 2006. Edição da Paróquia de Várzea.

- Livro «Futebol de Felgueiras-Nas Fintas do Tempo» (sobre Relance Histórico do F. C. Felgueiras e Panorâmica Memorial do Futebol Concelhio, mais Primeiros Passos e Êxitos do Clube Académico de Felgueiras) – pub. Setembro de 2007. Edição do autor.

- Livro "Destino de Menino" (conto personalizado - dedicado ao 1º neto) - Dezembro de 2012, em edição restrita de autor, numerada e autenticada pessoalmente.

- Livro "Luís Gonçalves: Amanuense-Engenheiro da Casa das Torres", patrocinado pela fábrica IMO da Longra - biografia de homenagem ao arquiteto do palacete das Torres, de Felgueiras - Janeiro de 2014.

- Livro “História de Coração” (dedicado ao 2º neto) – edição de autor, com tiragem limitada em exemplares numerados e autenticados pessoalmente. Novembro de 2015.

Obra escrita e a escrever, em espera para publicar:

- (possível/futuro) Livro de «Remembranças Felgueirenses», sobre notas de Recordações e Curiosidades do concelho de Felgueiras (escrito há muito, mas à espera de viabilidade); pub. ano ?.

- (Próximo livro a dedicar ao meu 3º neto, quando ele tiver alguns anos e que me anda ainda apenas na cabeça, por ora.)

Livros oficiais (alusivos a realizações de eventos), entretanto também publicados:

- «1ª Mostra Filatélica e Exposição Museológico-Postal da Casa do Povo da Longra» (relativa a Semana Cultural de abrangência comemorativa do centenário de Francisco Sarmento Pimentel e octogenário do Correio da Longra - Julho de 1995).

- «1º Festival Nacional de Folclore “Longra/97”» (livro com “Memória Concisa da Casa do Povo da Longra”, englobando partes historiadoras e galeria diretiva da Associação - Maio de 1997).

- «2º Festival de Folclore do Rancho da Casa do Povo da Longra» (contendo Lendas e Narrações das freguesias da área da instituição - Setembro de 1998).

- «Associação Casa do Povo da Longra-60 Anos ao Serviço do Povo» (alusivo ao respetivo sexagenário, contendo a História da instituição - Abril de 1999).

- «3º Festival de Folclore da Longra-Memória etnográfica do sul Felgueirense e afinidades concelhias» (Julho de 1999).

- «4º Festival de Folclore da Longra-Celebração Folclórica do sul Felgueirense» (Julho de 2000).

- «Evocações da Festa Paroquial de S. Tiago de Rande» (Julho de 2000 - de promoção à festa desse ano, por solicitação da respetiva comissão organizadora, traçando panorâmica das festas antigas.)

- «Rancho da Casa do Povo da Longra-Sete anos depois... em idade de razões» (Maio de 2001 – livro comemorativo do 7º aniversário do mesmo agrupamento e também alusivo ao 5º Festival de Folclore da Longra, de Julho seguinte – incluindo texto de fundo narrativo do “Conto de um Rancho Amoroso”, sobre a história do grupo em questão.)

- «6.º Festival do Rancho da Casa do Povo da Longra – Desfile de Oito Anos de Vida» (Junho de 2002).

- «7.º Festival da Associação Casa do Povo da Longra – Danças Mil em Nove Anos de Folclore» (Junho de 2003).

- «Grupo de Teatro da Casa do Povo da Longra – Sete Anos na Arte de Talma Associativa» (Outubro de 2003 – Primeiro livro historiador do respetivo agrupamento, em tempo do seu sétimo aniversário).

- «8.º Festival da Associação Casa do Povo da Longra – Alcance duma Década Etno-partilhada» (Junho de 2004).

- «9.º Festival da Associação Casa do Povo da Longra – Comunhão de Tradição Associativa» (Junho de 2005).

Outros trabalhos publicados de co-autoria, como participação e de inclusão:

- Colaboração, com Resumo Histórico de Rande, no Jornal Escovinhas, da Escola Primária da Longra, em 1991 (que na publicação, depois transcrita também no Jornal Escolar de Felgueiras, teve algumas gralhas na transposição dactilografada, de que resultaram trocas de datas, sobretudo).

- Colaboração pontual num trabalho realizado pela Escola de Sernande, escrito sob título “Minha Terra, Minha Escola, Minha Gente”, no ano letivo de 1992/93.

- Co-autoria em «Freguesia de Rande (S. Tiago) e Povoação da Longra» - Março de 1996 / Edição patrocinada pela Junta de Freguesia de Rande (pequeno livro, em género de mini-coletânea sobre temas diversos da freguesia de Rande, cuja receita reverteu para obras paroquiais. Infelizmente, no produto impresso deste trabalho voltaram a surgir gralhas, com enganos numa importante data e num nome inclusive, por parte de quem transcreveu do original para o tratamento informatizado do texto).

- Inclusão na revista “Poetas de Todos os Tempos” (sediada em Penha Garcia), Junho de 1996, com poema «Amém Felgueiras».

- Participação em «Felgueiras-Tradição com futuro», livro da Editora Anégia - Junho de 1996 (sobre o concelho de Felgueiras).

- Participação (com excerto do poema “Amém Felgueiras”, junto com trabalhos de alguns poetas concelhios) em brochura intitulada “Pão de Ló com Poesia”, distribuída pela Biblioteca Municipal de Felgueiras, de colaboração com o comércio doceiro local, em Maio de 1998.

- Participação com textos nas V, VI, VII, VIII, IX e X Colectânea de Textos de Autores do Vale do Sousa, edição da Câmara Municipal de Paredes, de 1999 a 2004, respetivamente (ou seja, desde que houve convite pessoal para a correspondente colaboração, até à suspensão da mesma iniciativa).

- Participação, com trabalho «Pergaminhos Desportivos Felgueirenses», no livro oficial das Festas da Lixa intitulado “Lixa Cidade de Ontem e Hoje-Nossa Senhora das Vitórias/2000” - Setembro de 2000.

- Participação na revista do 13º aniversário do jornal Semanário de Felgueiras, intitulada “13 Anos”, com artigo “Memória Jornalística de Felgueiras-Alargamento Informativo”; Junho de 2003.

- Elaboração (sobre dados fornecidos pela entidade proponente) do anual Boletim Informativo da Junta de Freguesia de Rande, n.º1-Dezembro de 2003 e nº 2-Dezembro de 2004 (únicos exemplares editados pela mesma autarquia).

- Elaboração (nas mesmas condições) do Boletim Informativo da Comissão Fabriqueira da Paróquia de S. Tiago de Rande (atualmente Conselho Económico Paroquial), n.º 1-Janeiro de 2004; nº 2-Jan. 2005; nº 3-Dezembro de 2006, nº 4 - Dez. 2007, nº 5- Dez. 2008, nº6-Dez. 2009, nº 7-Dez. 2010, nº8-Dez. 2011; nº 9-Dez. 2012, nº 10-Dez. 2014 e nº 11-Dez. 2015 (por ora, até à atualidade).

- Citação em diversos casos, entre os quais (além de alguns anteriores, quando o trabalho ainda estava apenas dactilografado), depois da respetiva edição, se reflete que o livro «Memorial Histórico de Rande e Alfozes de Felgueiras», publicado em Novembro de 1997, consta, entre outros exemplos:

- da bibliografia do livro “Penafiel Há Cem Anos II”, de José F. Coelho Ferreira, ed. em 2000.

- Como algo do mesmo “Memorial...” esteve em 2002 inserido parcialmente no “site” da Internet do “Semanário de Felgueiras On-line”.

- Idem, constando respigos do mesmo Memorial, referentes à história local de Rande, no material do Cd-rom “Festas, Romarias e Tradições 2000 Hoje - Porto”, disco compacto editado em 2001 por Terras de Portugal, Edições, L.da, relativo ao Distrito do Porto, incluindo o concelho de Felgueiras.

- Bem como o mesmo livro está referido no texto oficial da Proposta da Elevação da Longra a Vila (2003);

- Tal como, no decurso do tempo, ao que se apercebe, o referido Memorial serviu já de base para diversos trabalhos de finais de cursos estudantis, até monografias académicas, como teve consultas em monografias historiadoras e livros de investigação histórico-memorialista:

- Conforme, por exemplo, consta honrosamente da bibliografia em “Daciano Costa e o Design Industrial” - a propósito de ligação à Metalúrgica da Longra e referente à história dessa famosa empresa «pioneira em muitos aspetos, sendo o mais importante a aposta que efetuou no Design», por Susana Antunes e Liliana Soares, da Escola Superior de Tecnologia e Gestão/Instituto Politécnico de Viana do Castelo, Curso de Arte, Comunicação e Design-variante de Design Paisagístico, ano letivo de 2004/2005.

- Como também na Monografia de Cepães-Fafe (com dados sobre o Foral de Unhão e Cepães, segundo ajuda solicitada a título pessoal). Ainda, no livro “As Desfolhadas e a animação comunitária”, feito em 2005 por alunos da Escola Superior de Educação de Fafe.

- E em “De Sam Payo a Sampaio” – Um Estudo Genealógico, discorrido pela arte de Lygia Sampaio, livro publicado em Outubro de 2006 em Salvador da Baía, Brasil, em cujo volume constam informações respetivas, nas origens dos ancestrais Felgueirenses da autora.

- Bem como no livro “os Freire Machado”, de Carlos Freire Machado, editado em Novembro de 2008, no Rio de Janeiro, Brasil, com respigo sobre localização do sítio (Assento), da região de Felgueiras, de onde partira um ascendente de um dos ramos da família em Apreço… incluindo também o mapa dos Caminhos de Santiago na diocese do Porto, do livro Memorial Histórico de Rande e alfozes de Felgueiras.

- E também em “METALÚRGICA DA LONGRA como pioneira na integração do design no mobiliário em Portugal”, trabalho de Monografia por Daniel Oliveira Pereira e Pedro Joaquim Teixeira Ribeiro, em Design do Produto, 3º ano, de Estudos de Casos em Design 2011 / 2012, da Escola Superior de Tecnologia e Gestão Viana do Castelo, Janeiro de 2012.

- Participação (com artigos Vislumbre histórico-memorial, Elevação a Vila, Feira da Longra em nova versão, Festa na Casa do Povo e Impacto do Carnaval da Longra) no jornal-suplemento Especial “Vila da Longra”, de 19 de Março de 2006, número único, apoiado pelas Juntas de Freguesia de Rande e Pedreira e publicado por CM Edições, no âmbito do lançamento do jornal Expresso de Felgueiras.

- Participação (com artigo historiador alusivo, ”Feira de Maio remonta a 1901”) no jornal especial dedicado à anual “Feira de Maio” Felgueirense, numa edição do Expresso de Felgueiras, em número extra de 06 de Maio de 2006.

- E ainda citado, pelos trabalhos do livro Memorial Histórico de Rande e Alfozes de Felgueiras, bem como com indicação do blogue Longra Histórico-Literária, no livro “Felgueiras: 500 anos de concelho”, da C M F, coordenado por Pedro Vilas Boas Tavares, de 2015.

- (Assim como o livro “Luís Gonçalves: Amanuense-Engenheiro da Casa das Torres”, vai estar incluído entre referências contidas no livro do arquiteto Carlos Loureiro sobre casas brasileiras antigas do distrito do Porto.)

Colaboração na imprensa e comunicação pública:

- Colaborador do jornal O Porto, órgão oficial do F. C. do Porto, de 1974 a 1980.

- Colaborador do jornal Mensageiro da Longra em 1978 (publicado em 4 números mensais, nesse único ano de existência).

- Colaborador regular do semanal Notícias de Felgueiras desde 1985 até 1995.

- Colaborador episódico do Boletim Municipal da C. M. Felgueiras em 1984-85 (com “Felgueiras na Imprensa em tempos idos”, nos seus números de Abril de 1984 a Agosto de 1985); no suplemento do Jornal de Notícias, JN Domingo, em Outubro de 1986 (com “Um Herói do ar no exílio”); d’ O Jornal de Felgueiras em 1985/86 (onde, além de artigos e notícias, foi apresentado esboço para a Monografia Histórica de que resultou, anos mais tarde, o Memorial Histórico de Rande e Alfozes de Felgueiras) e, no mesmo jornal depois outra colaboração novamente em 1993; como também, colaborador ainda do Jornal da Lixa em 1987 e 1995; d’ O Sovela em 1995; do Jornal Escovinhas da Escola da Longra e do Jornal Escolar de Felgueiras em 1991; do Gazeta de Felgueiras em 1994 e 2002; no suplemento natalício d’ “O Comércio do Porto” (com “Conto de Natal”), no seu número de 10 de Dezembro de 1998; do Voz de Felgueiras, em 2004; do Voz Portucalense em 2004 e 2006; como do Expresso de Felgueiras em 2006 - entre outra produção dispersa em diversas publicações.

- Colaborador desde a respetiva fundação, em 1997, no Jornal de Barrosas durante a sua curta publicação (extinto que foi no mesmo ano).

- Colaborador episódico de um “site” informático, existente desde 2007 no universo da chamada blogosfera da Internet e gerência de um amigo, blogue intitulado “Vila da Longra”. Como ainda do, existente desde 2008, blogue “Irmão Sol”, de Espaço dos Antigos Alunos Capuchinhos. E com alguma participação, conforme as solicitações, nalguns blogues de temática Portista, etc.

- Autor e gerente do blogue "Lôngara - Actividade Literária e Memória Alvi-Anil", criado em Janeiro de 2010 (entretanto desaparecido da Internet).

E, igualmente, dos blogues "Memória Portista" e "Longra Histórico-Literária", criados em Junho de 2012.

[Relacionado com a atividade na chamada Blogosfera, por vezes têm aparecido transcrições de textos e cópias de fotos dos meus blogues noutros espaços da Internet e redes sociais. Facto relevante foi também que é citado um tema do meu blogue Memória Portista num livro italiano, publicado em novembro de 2015 - “Foot-ballers al frente – storie di calciatori (e di un tifoso) nella grande guerra”. (Traduzindo:) “Futebolistas na Frente /  histórias de jogadores (e de um apoiante) na Grande Guerra”, de Giorgio “Acerbis” Ciriachi (autor que pediu a minha permissão através de mensagem), em publicação da editora Urbone Publishing.  Em cuja publicação é feita referência a uma foto minha (do meu blogue) e informação respetiva, reportada a um capítulo dessa obra, com indicação do nome nos agradecimentos.]

- Colaborador da revista Mundo Azul, do Conselho Cultural do F. C. Porto, desde o seu 1º ano, de 2009, até à suspensão acontecida em 2010 (com a ocorrência da mudança do Conselho Cultural do FCP).

- Colaborador efetivo, a partir de 1996, do jornal concelhio Semanário de Felgueiras, em cuja situação ainda se mantém na atualidade - com regular crónica, em página contendo rubrica pessoal, além de alguma colaboração noticiosa.

Currículo da Carreira Profissional:

Administrativo – Inicial e anteriormente no Centro de Saúde da Longra (Felgueiras), entre 1976 até 2013 (desde 1 de Março de 1976 a 3 de Abril de 2013, com licença por baixa médica de permeio no final, devido a problemas cardíacos, entre 2011 a 2013) - e depois, em 2013 / 2014 (a partir de 4 de Abril de 2013 até 31 de Outubro de 2014), no ACES Vale do Sousa Norte - C. S. de Lousada (sede do agrupamentos dos antigos Centros de Saúde de Felgueiras, Lousada e Paços de Ferreira). Aposentado, finalmente, a partir de 1 de Novembro de 2014.

Curiosidades e particularidades:

Em aspeto associativo particular, sou sócio do Futebol Clube do Porto, da Casa do F. C. Porto de Felgueiras, como da Associação Humanitária dos Bombeiros Voluntários de Felgueiras; assim como fui da Associação Casa do Povo da Longra, do Futebol Clube da Longra, tal qual do Centro Cultural e Recreativo da Longra e do F. C. de Felgueiras (até à interrupção das suas atividades, nestes casos).

Passadas tantas fases existenciais, vividas por uma pessoa em contacto com muitas pessoas, além das horas de solidão de estudo e escrita, no fim de contas, olhando-se tudo o que se sentiu, momentos houve especiais, de mexer com a pele só de lembrá-los. E, entre isso, pela inerente sensibilidade, os beijos mais marcantes ficarão para sempre recordados – de despedida e dor, os últimos beijos nas testas frias da avozinha Júlia, da Mãezinha e Paizinho. E, de apaixonado amor, o primeiro dado. Daí resultou tudo o que fica agregado.

Ultrapassada uma autêntica viagem à volta do mundo pessoal, como foi desde a infância até à idade madura, chegou depois o final da carreira profissional, com pedido de reforma antecipada (por entretanto os políticos terem mudado as leis e rasgado socialmente anteriores contratos e assim ter havido alteração das condições e idade de reforma, pois que no que estava estipulado antes já teria direito a tal). Depois de ter sofrido três ataques cardíacos, dos quais um enfarte do miocárdio e duas pericardites, e porque de permeio, segundo as normas derivadas da crise político-social dos inícios do século XXI, não me foi concedida reforma por invalidez, tive de pedir a aposentação antecipada com penalização de vencimento, ou seja com reforma mais pequena, para não abusar da saúde… e ainda poder viver mais uns anos sem a pressão da vida laboral. Depois de descontar muito durante cerca de 39 anos, sendo assim vítima da crise social arranjada pelos políticos e falcatruas dos corruptos do país, políticos que quando chegaram ao poder só pensaram no interesse deles e dos seus.

Havia então eu, de permeio, quando acabou o período de baixa devido à doença, pedido para não continuar no anterior local de trabalho, devido ao nervosismo que a azáfama do centro de saúde da Longra provocava, sendo das maiores unidades de saúde da zona, pessoalmente olhando à sobrecarga com o atendimento ao público e direção da unidade. E fui então para o ACES de Lousada, a sede do agrupamento dos centros de saúde da região, ficando ali, desde Abril de 2013, na parte de apoio à direção, na UAG-Unidade de Apoio e Gestão, em coordenação dos centros da região de saúde chamada de Tâmega 3, oficialmente com o pomposo nome de Região de Saúde Norte-ACES Tâmega III-Vale do Sousa Norte-Unidade de Apoio e Gestão.

Num ótimo ambiente, foi assim de modo mais despreocupado que passei o último período de horário de trabalho. E em Lousada tive uma festinha de despedida, como corolário do bom ambiente que ali respiramos conjuntamente, recebendo provas de simpatia e amizade. Chegado o último dia, a 31 de Outubro de 2014, reunimo-nos em torno de um convívio, com o pessoal amigo a homenagear-me simbolicamente pela oferta de um livro de poesias, mais um objeto de recordação (que sempre tenho diante de mim no meu escritório, em casa) e um diploma, com autógrafos assinados por todos, que está emoldurado na parede do mesmo meu recanto doméstico.

(Imagem) = Diploma do “Povo” da UAG, recebido em 31-10-2014 =

Então, após longo percurso social, entre vivências assinaladas em comprovativos escritos e memorizados de aptidões e constatações, desde diplomas literário-formativos até recordações humanas, o melhor diploma recebido até hoje foi o da amizade e reconhecimento, esse que no último dia de Outubro de 2014 me foi entregue, numa demonstração de companheirismo de colegas da mais recente parte da minha carreira profissional. Cujo rosto está na imagem, a falar por si e por cada qual. O que me tocou bem cá dentro.

Assim, com simplicidade, como quem bebe água pura, que é corredia e límpida, bastando deixar correr o pensamento, em torrente sincera digo que valeu a pena essa última fase profissional vivida, para ter felizmente conhecido gente tão acolhedora, simpática e plena de companheirismo - como boa razão para haver estado na existência da UAG de Lousada, Unidade de Apoio e Gestão do Agrupamento de Centros de Saúde do Vale do Sousa Norte, Tâmega III.

Deixadas correr as águas já passadas sobre as pontes do rio Sousa, haja agora o futuro, sempre atento ao porvir, entre afetos e atenções.

***

Enquanto isso, porque a minha vida de homem tem tido junto sempre a mulher à medida, deu-se paralelamente o percurso de minha esposa, no caso pessoal. Algo que junto, em forma resumida, segundo o que ajudei a formatar em género curricular, segundo o

CURRÍCULUM VITAE (Modelo Europeu):

= INFORMAÇÃO PESSOAL
Nome: Pinto, Maria Deolinda Guimarães Sampaio

(Morada…  Telemóvel…  Carta de condução, etc)                
Nacionalidade:   Portuguesa

Data de nascimento - conf. Registo civil: 06-05-1955. Verdadeira: 27-04-1955.

= SITUAÇÃO e EXPERIÊNCIA PROFISSIONAL

Atualmente: Aposentada (desde Fevereiro de 2013)

Última profissão: Comerciante (a tempo inteiro)
- a partir de Novembro de 1995
Nome e endereço da empresa: Casa Linda / Edifício Nova Longra - Vila da Longra
Função/cargo ocupado: Gerente e única funcionária
Principais atividades: Atendimento de clientes, caixa, pagamentos, aquisição de materiais, gestão e tudo o mais inerente ao funcionamento do próprio estabelecimento.

Anteriores empregos:

- De Janeiro de 1985 a Novembro de 1995
Nome e endereço do empregador: Codizo – Empresa de Calçado da Longra, L.da - Rande
Função/cargo ocupado: Encarregada de costura
Principais atividades: Supervisão do serviço, distribuição de tarefas, vistoria do respetivo fabrico.

- De 1976 a 1985
Fábrica de Calçado Sozé, L.da – (primeiro) Cimalhas-Sernande, (depois) Monte das Ruas-Lagares; e (por fim) Calvário-Várzea; Felgueiras 
Função/cargo ocupado: Encarregada de costura
Principais atividades: Supervisão do serviço, distribuição de tarefas, vistoria do respetivo fabrico.

- De 1973 a 1976: Fábrica de Calçado Carvalho Dias – Padroso – Margaride; Felgueiras 
Função/cargo ocupado: Gaspeadeira
Principais atividades: Costura de calçado

- De 1966 a 1973: Empresa de Calçado Alexandre Sampaio e Filhos – (inicialmente) Cimalhas- Sernande e (depois) Longra-Rande; Felgueiras 
Função/cargo ocupado: Gaspeadeira, acumulando com função de encarregada de sector
Principais atividades: Costura de calçado e tarefas de organização do fabrico.

= FORMAÇÃO

 - Datas – Concluído em Julho de 1966
Nome e tipo de organização de ensino ou formação: Escola Primária de Varziela – Felgueiras
Designação da qualificação atribuída: 4º ano de escolaridade

= APTIDÕES E COMPETÊNCIAS SOCIAIS

- Sentido de programação do trabalho - Preferência de trabalho em equipa - Compatibilidade de convivência - Dedicação.

= APTIDÕES E COMPETÊNCIAS TÉCNICAS

Curso de Formação para a Indústria do Calçado – Costura, promovido pela Codizo, Empresa de Calçado da Longra, L.da, e patrocinado pelo Instituto de Emprego e Formação Profissional, frequentado e concluído com aproveitamento em 1990, durante três meses e concluído em Dezembro do mesmo ano.

- Curso do Centro de Novas Oportunidades, da Escola Profissional de Felgueiras – 2007/2008 (Sistema Nacional de Reconhecimento, Validação e Certificação de Competências-Chave para a Educação e Formação de Adultos de nível Básico) – com diploma de 15 de Maio de 2008.

***

Voltado ao recato dos dias passados sem ter de cumprir horários fixos e na acalmia de andar por casa, houve então oportunidade de escrever este relambório particular. Na ideia de oferta familiar, pois que a família é a pedra angular da nossa vivência. Como temos uma família de que gostamos muito.

Uma Família Bonita

Era assim, conforme sintetizamos nos princípios destas memorietas, que meu pai, Joaquim Pinto, definia como via e gostava de sua família, segundo constatava ser a sua descendência e quão isso o fazia feliz. Ele que cresceu sem pai, criado quase por estranhos de laços familiares, sendo sua mãe criada de servir em casas de fidalgos, em labutas sofridas. Tendo depois, por sua vez, criado um mundo envolvente em que formou a própria família, a pontos de ter chegado a nós, à nossa vez, numa bonita família continuadora.
Em vista disso, como homenagem e perpetuação familiar, registamos alguns traços das características que o notabilizaram a nossos olhos e mais sentidos na alma da recordação.

In Memoriam: Joaquim Pinto

Em ideia que temos, uma das evidências terrestres é que fixar memória respeitante a algo particular ou coletivo será uma forma de celebrar a vida. E, neste sentido, essa atitude terá em conta valorização de tudo o que mereça apreço, com discernimento de avaliação, a enaltecer na amplitude de uma identificação.

Pode a área cronista ter também afetividade e a visão literária ser sensível. Nem sempre a narrativa publicista deve ser demasiado técnica, de texto conciso, frases modelares, segundo normas feitas, mas em lugar próprio igualmente proporcionar oportunidade de manifestos sentimentos e partilha exposta de conhecimentos. Ora, sendo habitual ao autor escrever sobre os outros, em espaços públicos, desta vez calha a preceito dirigir uma pessoal mensagem, na ocasião natalícia, na pertinência do Natal ser a festa da família por excelência. Ajustando-se a oportunidade para dedicação duma homenagem, no sentido de elo familiar, ao patriarca da família e extensivamente a toda a prole sucedânea, todos nós, os que somos da Família Pinto, da Longra.

Está, com efeito, eternamente viva a memória do progenitor e patriarca familiar, o meu Pai. Por sinal também uma figura marcante da memória local, atendendo ao seu currículo prestigiado com o Prémio da Associação Industrial Portuense, em 1959 (como obreiro da sirene e de alguns inventos na Metalúrgica da Longra, fábrica de grande prestígio, que foi autêntica escola de artes laborais, a pontos de então haver consideração de ser uma honra pertencer a seus quadros). Além de bairrista e profundo conhecedor da história local de tempos passados, segundo o que viveu e ouviu, tendo tido primordial comparticipação na monografia sobre as memórias da freguesia natal, por meio das informações que me deu para o livro Memorial Histórico de Rande e Alfozes de Felgueiras. Subsídio comparticipativo que se deveu também à esposa, a saudosa minha Mãe, Matriarca da família, pelo muito que contava na sua ligação estremosa, dando razão suprema ao ditame de que no companheirismo a um homem de relevo sempre houve e está uma grande mulher.

Costuma dizer-se que os avós são pais com açúcar. Definição a preceito, no caso em apreço, para o avô dos filhos e sobrinhos do autor destas linhas, mas também e especialmente Pai, tal o sabor doce que deixou, a criar água em boca sufocada.

Como seiva que produz vida e renova a natureza, a memória de nosso pai permanecerá pelos tempos, em perene saudade e constante recordação. O seu exemplo estará sempre presente, nos valores que ele soube incutir, na união da família que conseguiu criar e fortalecer.

Contava ele que, segundo ouvira, se celebrava a missa dominical de Rande aquando do seu nascimento. E, conforme se tornou público, porque o parto de sua mãe estava difícil, o pároco dessa época, Padre Augusto, pediu do altar a todos uma oração. Então foi feita conjuntamente uma sentida prece, para que nascesse em boa hora. Facto passado a 10 de Dezembro de 1916, na mesma igreja onde depois foi batizado, participou nos atos da comunidade paroquial até ao seu falecimento, ocorrido a 10 de Março de 2006; em cujo templo por fim, no seguinte dia 11, foi encomendado a Deus. Agora, de peito contrito, aqui e onde nos lembramos dele, como nosso herói e figura pública que mais nos marcou, estamos gratos, agradecendo a boa hora em que veio ao mundo para criar as raízes que deixa em nós.

Aos domingos, dizia ele, para ser domingo de verdade tinha sempre de ir à missa de Rande, pela manhã; e de tarde havia de dar um passeio pela freguesia, sempre, para ver os seus sítios queridos, o lugar de Janarde onde nasceu, a casa de Valdomar onde passou sua infância, mais todos os lugares que conhecia como as próprias mãos. Quanto gostava de ver quando aparecia a seus olhos qualquer melhoria na freguesia. Assim como tinha algum desgosto pelo desaparecimento de uma fonte que fizera parte do ambiente de sua juventude, a Fonte da Vinhó, antes existente junto a um campo da Quinta, entre Casal Corne e Janarde. A freguesia de Rande fazia parte dos seus pensamentos e anseios. Como sonhava com o alargamento do Largo da Longra, de modo a que o centro da vila que ainda conheceu pudesse ter uma praça central. Conversava muito com os filhos e até os netos sobre esses e outros motivos de seu interesse, sabendo transmitir aos vindouros autêntico apego pelo torrão natal. A terra em que ele era uma referência, quer como construtor da sirene da antiga Metalúrgica, empresa onde durante muitos anos foi o operário mais antigo; tal como mais tarde artífice bobinador e, depois, por todos se terem habituado a vê-lo constantemente, em presença habitual na sua veneranda fisionomia, tão respeitado na consideração geral, tornando-se personagem grado e admirado.

No silêncio contido do nosso coração, continuamos a conversar e, sempre que haja qualquer obra ou beneficiação na sua e nossa terra, os nossos sentidos serão os seus olhos, presente como estará sempre connosco, bem no íntimo de todos quantos o amamos.

Remexendo no fundo da mensagem, que desejamos voe até ao Infinito, tomando as asas do poeta, permita-se uma adaptação para dizer-lhe, na ligação terrena fortalecida espiritualmente:

Se vires que pode merecer-te
Alguma coisa a dor que nos ficou
Da mágoa sem remédio de perder-te,
Roga a Deus que de nós te afastou 
Que na Sua Glória nos faça ver-te 
Quão ditosa a doutrina nos legou.

*
Em homenagem de reconhecimento, foi Joaquim Pinto, da Longra, merecedor de um Voto de Pesar pela Assembleia Municipal de Felgueiras, na primeira sessão ordinária realizada por aquele órgão autárquico após o seu falecimento. Deliberação essa havida na respetiva sessão ordinária realizada a 20 de Abril de 2006, por voto apresentado pelo Grupo Parlamentar do PSD e aprovado por unanimidade dos 63 membros presentes no hemiciclo municipal, de todos os grupos partidário-parlamentares Felgueirenses.

Igual reconhecimento houve de seguida na autarquia de Rande, através de voto que teve apresentação pela Junta de Freguesia e aprovação de todos os presentes em assembleia magna, tendo assim também a Assembleia de Freguesia de Rande tido esse sinal de apreço em sessão do seguinte dia 27 do mesmo mês.
E fazendo memória, cá estamos nós todos. Filhos, noras, netos e netas e bisnetos. Desde os mais velhos até ao Gonçalo e ao Tiago e seguintes. Com o que nos une bem presente!

*
Posto isto, chega o fim desta narrativa. Ainda na continuação da vida. Encerrando a contagem pessoal, de enumeração e descrição personalizada.

Trilhado que foi (e por enquanto ainda vai sendo) um caminho de cidadão anónimo, despercebido e quanto possível discreto, sem dispensar tomadas de posição e defesa do que acredito e me toca, em cidadania e vivência afetiva, sobretudo através da comunicação escrita, aqui deixo mais as linhas que ficam nestas folhas, qual guarida também silenciosa de valores e afetos.

O sentido de paraíso pode ser também uma espécie de livraria em que exista um simples livro onde se guarde o melhor que sentimos.

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Na arca de nossa memória, chegado este ponto, ressoam cheiros e sabores como o que apetecia nos tempos dos assados do forno feitos por minha mãe, as batatinhas de São João, com carne estufada, que uma vez me soube pela vida em dia da antiga festa da Longra e como falei disso durante dias aquilo ficou nas memórias da família em nossa casa, mais os bolinhos e coelho guisado do farnel que comíamos no monte da santa, em dia de peregrinação felgueirense ao alto de Santa Quitéria… E os doces e especialidades de culinária que a Rosa começou a fazer depois que andou no curso antigo das fadas do lar, na Casa do Povo... Até que, em tempo de Natal, vem ao semblante o presépio familiar.

Ora o presépio, é uma presença tradicional significativa que me habituei a ter em casa e procurei manter com meus filhos e continuo com os netos. Desde o apanhar do musgo até ao fazê-lo na sala, onde nos juntamos. Construído por gosto, levanta-se na figuração da lapa de Belém, como ilustração da natividade daquele Menino nascido no oriente, num humilde estábulo mas aquecido pelo bafo de animais, segundo a tradição antiga e a Cristandade comemora. E adorado desde logo por todos os que tiveram conhecimento de tal facto divino, quando aconteceu, já passa de dois milénios, nos arredores daquela Belém da Judeia que há muito se ouve falar nas igrejas, através da leitura das sagradas escrituras (e eu pude ver quando lá fomos à Terra Santa). Presépio que extravasa o musgo que exemplifica a natureza ambiental, sobreposto por ornamentações, quais arremedos de morros, caminhos e rudes construções, ao sabor da inspiração e engenho pessoal da feição respetiva, sem descurar gostos etnográficos e ar plebeu, na religiosidade tradicional. Pois o presépio encadeia, afinal, um quadro temático de horizonte emblemático, encerrando algo da sensibilidade natural, de quanto o nascimento de Cristo, do Deus que veio à terra, então, tem lirismo peculiar, na necessidade humana de amplitude e transfiguração. Sendo o presépio como que o coração poeta do povo a embalar os mais íntimos desejos.

Armando Pinto

Pelo Natal de 2016 - este livro.


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